A sobriedade lhe feria a alma. Era o que o garoto sentia naquele momento. Perdido entre os casebres feitos de barro, Daisuke ansiava pela escuridão, pois a luz do sol à pino lhe incomodava às pálpebras doloridas. Sua nuca ardia e a coceira no local era quase insuportável. - O que está acontecendo comigo. - Ele sussurrava enquanto cambaleava por mais um beco à procura de água e comida nas latas de lixo quase vazias. "Um farrapo humano." - Era o que as pessoas viam nele ao desviarem o caminho enojado pelo odor de fezes e urina que suas roupas rasgadas exalavam. Suas pernas tremiam tanto que após alguns metros, o nukenin fraquejou e escorou-se na parede do beco, descendo lentamente até atingir o chão quente. Foi quando chorou de desespero. Daisuke tinha cabelos emaranhados e uma barba rala e suja. Mal podia acreditar que em poucos dias sua vida girasse a esse ponto deprimente. Pensou em se matar. Mas a possibilidade em enfrentar o espírito vingativo de seu professor morte o fez desistir rapidamente. "Preciso resistir!" - Ele pensava, enquanto seu corpo mais e mais cobrava por aquele estranho líquido que lhe deu tanto poder. Seus soluços aumentaram quando se lembrou de sua casa, de sua família, de seu amigo fiel e das peripécias que haviam marcado sua infância. Sua mente confusa misturava desejo e arrependimento. Culpa e suplício. Foi quando conseguiu energias para se levantar apoiando-se numa lata de lixo, despejando-a no chão para começar a procurar comida. - Ei! Saia já daí! - Gritou o dono do restaurante que acabara de dobrar a esquina com algumas sacolas que desejava descartar. Mas Daisuke estava desesperado demais para dar-lhe ouvidos.

- Desgraçado! Já mandei sair de minha lata de lixo! - Comandou o homem, chutando o mendigo violentamente.
- Se fizer isso novamente você morrerá aqui mesmo. - Sussurrou o jovem com um olhar de animal selvagem.

O homem recuou alguns passos com receio do que o vagabundo faria, mas logo parou e o inspecionou com grande surpresa.

- Nossa! É você?! Saru?! Eu conheço você! Onde se meteu?! - Comentou enquanto se aproximava.
- Não conheço esse tal de Saru. Vá embora! Não conheço! - Respondeu com desespero nas palavras.

Mas o homem não se deteve e se aproximou ainda mais, chegando a tocá-lo no ombro com grande alegria. - Não! Não vou deixá-lo assim. Graças a sua última vitória, minhas filhas vão à faculdade! Vamos, acompanhe-me. - Disse o senhor, puxando-o para fora a entrada de serviço nos fundos do restaurante. Daisuke estava sem entender o que acontecia. Precisava apenas beber ou comer alguma coisa. Quem sabe até consumir mais daquele líquido púrpura que lhe dera tanto poder. "Não. Resista." - Sussurrava. Sem alternativa, o jovem fraco cambaleou até entrar na cozinha do senhor que logo lhe puxou uma cadeira e destampou uma grande panela fervente donde um cheiro inebriante de sopa invadiu as narinas do nukenin. Servindo uma grande porção, o senhor entregou o prato ao garoto que avançou no objeto como um animal selvagem, bebendo a sopa em grande velocidade e com pouquíssima educação, para os olhos críticos dos cozinheiros que estranharam o convite do patrão em chamar um mendigo para dentro de seu restaurante. Manjar dos deuses. Era o que Daisuke encontrou naquele singelo prato de sopa. Aquilo apaziguou um pouco sua ânsia pelo tóxico, o que o fez começar a recobrar a consciência sobre quem era e sobre seu passado, e quando terminou o prato, chorou mais uma vez. - Obrigado, senhor. - Ele disse agradecido. O homem sorriu e o chamou até a dispensa. Chutando o tapete para a lateral, ele fez surgir uma portinhola discreta a qual puxou o cordão para levantar a pesada porta que os levava até o porão. Não era grande coisa. Muita bagunça e poeira, o lugar estava abarrotado de materiais do restaurante até o fundo onde havia uma cama de palha com uma velha banheira de madeira. - Lave-se. Ali você achará algumas roupas antigas. Descanse. Conversaremos amanhã. - Concluiu o senhor, dando-lhe as costas, sumindo pelos degraus.

Daisuke ainda não conseguia entender tamanha boa-vontade, mas estava cansado demais para pensar no assunto. "Mãos à obra." - Pensou ao pegar algumas toalhas e sabonete no canto do depósito. Acendendo a pequena luminária recostada na cama, ele escolheu a roupa que usaria e abriu a torneira enferrujada que fez jorrar água salobra como se há muito tempo ela não tivesse sido aberta, até que o líquido se tornou límpido. Fazia cerca de uma semana que não se banhava e seu corpo já tinha uma crosta de sujeira difícil de ser retirada. Suspirando fundo, ele entrou na banheira com calma e afundou até estar totalmente submerso. De repente uma tranquilidade passageira começou a tomar seu corpo. Começava a sentir-se bem. Assim, retornou a superfície e começou o penoso trabalho de limpar-se. Mesmo assim não reclamava, pois parecia que enfim a sua maré de azar estava terminando. Então, após alguns minutos de banho, já com outra coloração natural da pele, ele terminou o banho e procurou por uma lâmina para fazer sua barba rala. Não demorou muito até que encontrou um barbeador. Olhando-se num espelho acinzentado, Daisuke pôde se ver após uma semana de privação. Estava magro. Cadavérico. Olhos injetados com vários arranhões pelo corpo. Não se lembrava de muita coisa que acontecera nessa semana desde sua fuga, mas sabia que a partir daquele dia ele fugiria para longe daquele lugar. Pegando a lâmina, ele ensaboou o rosto para fazer o metal deslizar em seu rosto até que sua mão começou a tremer. Novamente sentiu seu corpo fumegar e seu chakra perder o controle. "Não. De novo não." - Desesperou-se.  Mordendo os lábios, ele sentiu seu corpo tremer em convulções descontroladas e um enjoo o jogou de volta à banheira onde vomitou toda sopa que tinha comido.

Seu corpo agora doía e tinha calafrios profundos. Daisuke sentia mais uma vez que iria morrer. "Preciso daquela coisa!" - Ele se traía em pensamentos, com desejo por aquele imenso poder. Cambaleando pelo porão, ele logo caiu sobre algumas roupas de mesa que estavam estocadas e rolou para o chão, onde mais uma vez perdeu a consciência. Momentos de sua vida começavam a eclodir em seus sonhos e mais uma vez ele viu Nero. Com sua farda militar e seu sorriso malicioso, ele estendia a mão e mostrava as gotas endurecidas do gás que o viciou. O desejo profundo tomou conta de seu corpo e novamente ele retornava à consciência. Dessa vez ele cambaleava no lado escuro do porão, tateando pelas paredes à procura de alguma saída. Foi então que percebeu que enquanto "dormia", seu corpo agia sozinho contra sua vontade para retornar a Nero e seu vício. Daisuke se sentiu enojado. "Preciso daquela coisa." - Mais uma vez seu pensamento lhe traía quando olhou em volta e conseguiu ver algumas cordas gastas no canto próximo às mesas quebradas. Desesperado para não perder a consciência novamente, ele agarrou a corda e correu na direção das vigas do restaurante, onde a jogou por cima e a amarrou firmemente num pesado móvel que juntava poeira. A outra ponta estava reservada para os seus pés. Deitando-se na cama de palha, ele procurou pelo sono, quando perdeu a consciência novamente. Tremores e calafrios. Enjoos e vômitos. Gritos de horror. Demônios de sombra começavam a entrar pelas frestas de escuridão para açoitá-lo com culpa. Culpa pela morte de seu professor. Culpa por ter desperdiçado sua vida. Culpa. Culpa. Daisuke agonizava em sua alma enquanto seu corpo agonizava por mais uma dose da droga.  

E enquanto estava entra os dois mundos, o nukenin começou a ouvir passos apressados e gemidos de dor. Seus ouvidos estavam lhe cobrando peças? Mas logo suas dúvidas sumiram ao ouvirem uma voz conhecida: - O bom filho à casa torna. - Disse Nero, sorrindo à beira da escada. Daisuke abriu os olhos com certo desespero e não soube diferenciar se aquilo se tratava de um delírio seu ou se realmente estava acontecendo. Suado e completamente sujo de vômito, ele viu que Nero estava cercado por seus três seguranças, e um deles trazia o dono do restaurante com o braço em volta de seu pescoço. O loiro não tinha muita ideia de quem o trouxera até o restaurante, mas algo lhe dizia que era o mesmo senhor que o ajudara. "Vou matar você." - Sussurrou o jovem, já sem forças para resistir. Nero gargalhou da ousadia do garoto e retirou a mão do bolso esquerdo  para arremessar uma brilhante gota púrpura que caiu no colo de Daisuke. Aquilo o fez tremer. Sabia que era o que ele mais desejava na vida. O fim de seu sofrimento e o aumento de seu poder. Sua mão avançou sobre a substância, mas fraquejou no meio do caminho. Ele tremia. Seu corpo lhe dizia para continuar, mas sua consciência lhe dizia o contrário. - Não faça isso fi... - Balbuciou o senhor do restaurante até ser arremessado contra a parede e cair inconsciente. Mesmo vendo isso, Daisuke baixou a cabeça em vergonha e agarrou a gota. - Aperte-a contra o nariz. - Comemorou Nero. O loiro ainda tentou refrear seu desejo, mas já era tarde demais. A gota rompeu e o gás púrpura penetrou em seus pulmões. Agora ele se sentia completo. O poder estava de volta. Sua força estava de volta. A questão era: Que preço ele pagará para continuar usufruindo deste poder?

De promissor Gennin para um Nukenin. De um mero garoto de rua para um grande campeão de lutas clandestinas. Agora o pobre Daisuke não passa de mais um viciado pelo mundo. Realmente a vida desse garoto muda constantemente e é provável que tenha que pagar tributos ao Nero para continuar a consumir essa droga. Continua interessante essa historia que está a montar, onde se muda constantemente de foco só que um acontecimento leva a outro.

Força na historia irmão.   

Tal como disse no Filler anterior, o Hiroshi realmente virou um drogado ahah.

Ainda quero saber o que mais faz esta substância além de deixar o alvo num total estado de dependência. Fico à espera por mais!