Eu estava sentada no sofá a pensar no que fazer da minha vida. Se iria procurar pelas respostas, se ignorar. Se ia ou se ficava…
Suspirei profundamente levantando-me. Tinha decidido o que fazer: ir. Sei que não tinha nada a perder, e tudo a ganhar até uma desilusão. Mas, era o que eu queria fazer.
Estava de noite e a chover. Decidi ir agora, porque desde que acontecera tudo aquilo, a noite era a minha melhor amiga. Era nela que eu me sentia bem, que me sentia “eu mesma” e que sabia como viver. Na luz do sol, eu era nada mais, nada menos que uma rapariga perdida, sem nada, sem esperança, nem credibilidade.
Levava apenas a roupa que tinha no corpo e kunais.
Abri a porta e sai para a rua. O que observava não era dos melhores cenários, mas quem gostasse de trovões, noites estranhas e céus magicamente impossíveis de ver, iria adorar. Nunca tinha visto um cenário tão lindo como o de hoje.
Afastei-me da minha casa e virei-me para ela. A casa estava inundada na escuridão total. E atrás dela, pairavam algumas nuvens azuis escuras e negras, fininhas. Estavam como se estivessem presas a um tecto. O céu estava negro (de um negro mais escuro que o das nuvens) também com tons roxos e algumas manchas brancas. Há volta da minha casa, residia um nevoeiro denso. Aliás, não era propriamente só à volta da minha propriedade, era também nos arredores. Dei uma volta a mim mesma e confirmei. O nevoeiro denso estava por todo o lado e mal se via os caminhos.
Um trovão fez-se ouvir. Foi de um brilho intenso no céu. A coisa mais bonita que eu tinha alguma vez visto era, sem duvida, este trovão. A luz branca rapidamente desapareceu, mas o seu ruído, ninguém me impedia de o relembrar. A lua estava enorme la no alto do céu. Estava uma noite misteriosa e assustadora para aqueles que a temiam.
Ouvi um cão a uivar, o que me fazia lembrar a minha cadela. A cadela que eu outrora tivera, no passado. Morrera de velhice e uivava sempre que trovejava. Eu adorava pegar nela e sentar-me a janela a ver os trovões, antes de tudo comecar...
A chuva caia em cima de mim enquanto eu caminhava normalmente, sempre atenta a tentar descobrir por onde andar. Eram cenários raros, mas acontecia. Tinha uma kunai na mão. Decidi ir primeiro passear pela floresta nos arredores de Kumo.
À medida que eu andava, sentia frio, e sentia-me arrepiada. Passei as mãos pelos braços e pelas pernas enquanto andava. Havia poças de água no chão, à medida que as pisava, chapinhava molhando os meus pés e as pernas.
Semicerrei os olhos começando a andar cada vez mais depressa, mas cuidadosamente. O som da chuva era relaxante, mas já me estava a molhar de mais. Enquanto me tentava concentrar apenas no caminho, algo passou rasteiro à minha cabeça e fez um barulho enorme. O som de umas asas a baterem, baixei-me logo. Devia ser apenas um pássaro idiota no meio da chuva.
Voltei a erguer-me e aqui, quando recomecei a andar, já se via melhor. O nevoeiro tinha ficado para trás, pelo menos grande parte dele.
- Estás bonita, estás! – Comentei para mim própria enquanto me observava. Estava cheia de lama.
- És. – Uma voz feminina fez-se sobressair e eu assustei-me. Olhei logo para o local de onde a voz veio e arregalei os olhos.
- Mãe? – Perguntei olhando ainda incrédula para ela. Como era possível? Ela não estava viva, pois não? Até já duvidava de mim.
- Minha filha. – Ela vestia um túnica branca e tinha o cabelo mais comprido que eu sei lá o quê. Fez um sorriso super querido e estendeu-me a mão.
- Mãe! – Não conseguia sair dali. Não me conseguia mover para ir ter com ela.
- Anda cá. – Ela abanou o braço. – Deixa-me confortar-te num abraço.
- Mãe! Não me consigo mover. – Tentei mover-me, mas as minhas pernas não deixavam. Depois, a força interior foi maior que outra coisa qualquer e eu corri para ela, mas a imagem dela desvaneceu-se na chuva e gritei mandando-me para a frente. Pensei que ia bater com a cara no chão, mas alguém me agarrou.
- Mãe? – Pronunciou agora uma voz masculina. Afastei-me um bocado, porque essa pessoa me estava a agarrar.
O meu coração estava acelerado. Olhei para o rosto dele. – Tu? – Afastei-me ainda mais pisando uma poça que me molhou ainda mais. A chuva estava mais fraca e os trovões mais calmos.
- Ya. E não sou a tua mãe. – Ele riu-se.
Fiquei corada, de certeza. Que vergonha. Porque raio tinha eu visto a minha mãe e afinal era ele? Como era possível? Eu tinha a certeza que não estava doida. Não estava!
Apenas o continuei a olhar.
- O que fazes aqui? Está a chover e os trovões não vão parar tão cedo. E a tua sorte é que aqui não está muito nevoeiro. Estás completamente encharcada. E só com essas roupinhas? Vais-te ficar doente. – Cruzou os braços.
- Porque é que te preocupas? – Perguntei, sentindo a chuva a descer-me pelo rosto abaixo, pingando friamente no meu peito e continuando a descer até ao pés.
- Não me preocupo contigo de todo. Mas não tenho mais nada para fazer. E, aliás, tu é que me apareceste no caminho a chamar pela tua mãe. – Fez um sorriso mau e depois um sorriso enorme.
Eu pisquei os olhos e abri um pouco da boca. Aquilo tinha doido, mesmo eu não ligando muito.
- Adeus. – Virei-me para ir.
Agora a chuva ficava mais intensa. O que raio se passava com a merda do tempo?
- A sério que vais assim, para não sei eu onde? Estás totalmente encharcada. – Avisou.
- Para de te preocupar e dizeres que não o fazes! – Virei-me, a resmungar.
- O que raio estás a fazer aqui no meio da floresta? – Perguntou.
Meti a mão na anca. Estávamos ambos a apanhar chuva. Estávamos a olhar para os olhos um do outro.
- Vai-te foder, e deixa-me em paz, sim? – Fiz um sorriso falso. – Sim.
- És difícil. – A forma como a água lhe caia perfeitamente pelo rosto, caindo na boca, deixava-me fascinada.
- Oh meu deus, eu tenho mais que fazer do que te aturar, ok?
- Nada ok. Bateste na minha gaja. E agora vais levar com as consequências. – Tirou uma kunai e começou a correr para mim. Nesse momento, um trovão fez-se ouvir.