- Nara Tora, por gentileza? - perguntava uma figura imponente com bandana shinobi à testa, após bater à porta da casa da chuunin e ser recebido por Nobuo.
- O que deseja, senhor? - perguntava ele, estranhando a visita repentina.
- Uma reunião está marcada para daqui a dez minutos, e precisamos da presença dela, Nobuo-san. Por favor, acorde-a. - sua gutural voz tentava ser o mais delicada possível.
- Não precisa, não estou a dormir... - a kunoichi descia vagarosamente as escadas, esfregando uma das mãos nos olhos. - Deixem-me apenas ficar mais apresentável... - ironizava, enquanto preparava-se para escovar os dentes, lavar o rosto e trocar de roupa.
Cinco minutos depois, a chuunin dava um beijo na face de seu pai, dizendo que voltaria logo, saindo acompanhada da figura. Tinha sido avisada no dia anterior, por seu primo Shikamaru, que teria uma reunião com o hokage e um punhado de outras pessoas. Ele fez bastante mistério, adiantando-lhe apenas que iria gostar bastante do conteúdo que estava programado para discutirem, deixando-a tão curiosa a ponto de roubar-lhe o sono. Finalmente o dia amanhecera, e a hora tão esperada chegou. Entrando no escritório da autoridade máxima da Vila da Folha, Naruto, Shikamaru e mais três ou quatro pessoas desconhecidas para a chuunin davam-lhe as boas vindas:
- Sente-se Tora-chan! Como foi sua viagem, dattebayo? - perguntava-lhe o Uzumaki.
- Ahn, aprendi bastante coisas, conheci vários lugares... Basicamente isto, hokage-sama. - respondia, levemente desconfiada.
- Tímida como sempre, hein Tora? Pff - brincava Shikamaru. - Naruto, vá logo direto ao ponto, posso apostar que nem dormir essa criatura conseguiu essa noite. - ele finalizava, arrancando um olhar mortífero de sua prima.
- Bem, Tora, desde que fizeste 15 anos, sabemos que ativaste uma KG fenomenal. Tive acesso aos documentos que o Loki guardou acerca disto, e também sabemos de sua aspiração à ANBU. No momento, talvez ainda seja cedo para o teu grande sonho, mesmo que tenhas sido treinada por um ex-ANBU bastante competente. Mas já que tens em teu sangue algo tão promissor, o que achas de ter um emprego fixo em paralelo com a profissão de shinobi?
- Não entendi... - dizia ela, sinceramente.
- Que achas de inicar carreira de espiã? Poderias ter um aprendizado direcionado, e assim se te identificares com a área, quando chegar a hora de entrar para a ANBU a divisão mocho estará a te esperar de braços abertos. - ele explicava com entusiasmo.
- Deixa ver se entendi... Estão dizendo para eu ser aprendiz da divisão mocho, por causa da minha KG, que supõe-se que tenha este fim?! - sentia um misto de indignação com felicidade.
- Basicamente. Lembre-se que shinobis são armas de uma vila, não és nenhuma garotinha, não sei porque o espanto - Shikamaru bocejava, após notar a surpresa da prima.
- Você passará por alguns testes. Se estiver apta, irás unir o útil ao agradável. Defender Konoha não limita-se à linha de frente, devias saber disso... - o Nara mais velho continuava a provocar.
O jeito de seu primo a irritava profundamente. Encarar seu rosto naquele momento sem poder atacá-lo era absurdamente torturante - e ele sabia disto. Respirando fundo, a kunoichi procurava acalmar-se. A proposta era boa, mas faltava algo nela: segurança. Embora tivesse crescido bastante na carreira shinobi, certos traços de personalidade eram tão marcantes a ponto de serem quase impossíveis de alterá-los. Era mulher feita, mas indecisão e insegurança eram seus outros nomes.
- Preciso pensar a respeito - disse finalmente, tentando não demonstrar seus sentimentos. Girando nos calcanhares, voltou para casa.
***
Tédio. Essa era a palavra que melhor poderia resumir um domingo como aquele. Estava feliz por ter voltado, mas começava a sentir falta de sua rotina andarilha, a experimentar comidas e (por que não?) bebidas variadas, exóticas ou mesmo quase fatais; a dançar com ciganos nômades, ver coisas que jamais pudesse cogitar que existissem, ter aquele eterno choque cultural a cada vila que percorria. E então decidira explorar um pouco mais o bosque que era praticamente seu lar, mas que sempre voltada aos seus treinamentos quando gennin, nunca permitiu-se de fato conhecer.
Havia corrido muito. De casa até onde finalmente parou, decorreram-se cerca de vinte minutos - e ela apenas mantinha os olhos abertos para desviar dos obstáculos, pois a sua visão periférica limitava-se a um borrão. Ainda estava na zona de borda da mata, embora a calmaria já fosse considerável, por conta da tarde que esvaía-se pouco a pouco. Fechando os olhos, permitiu-se sentir o ambiente - ou como diria Raiden em suas reflexões, permitiu-se ser uma só com a mata, buscando compreendê-la para ser incorporada. Sentada, ouvia com atenção o zunido das asas dos insetos, os pássaros a despedir-se do dia, os morcegos a abandonarem seus abrigos e buscarem seus alimentos, os pios das corujas, o coaxar sinfônico dos sapos de alguma lagoa próxima, sentindo a rapidez de lagartos a deixarem o folhiço para descansarem em troncos de árvores e serpentes a cuidadosamente espreitar presas em potencial, com silvos quase inaudíveis.
Poderia parecer loucura gostar dessas coisas, mas a vida encantava Tora. A vida poderia parecer cruel, injusta até, mas perfeita em suas imperfeições. Nos anos fora de Konoha, a kunoichi aprendera que o mundo shinobi, embora o ser humano teimasse em negar, possuía o mesmo funcionamento; portanto, receber mensagens da Natureza e saber interpretá-las era vital para seu diferenciamento enquanto ninja. Quando abriu os olhos, já era noite, e tal como o dia, a vida seguia a todo vapor. Predadores caçando, presas abrigando-se ou defendendo-se de alguma forma, fosse planta ou animal. Todos apenas queriam viver, custasse o que fosse. E o engraçado, é que era possível notar que no meio ambiente, esse pensamento nem sempre era egoísta. Havia um ímpeto de proteção; aves diminutas que bicavam desesperadas animais que tentavam roubar-lhe os ovos; a vocalização diferenciada dos anuros a anunciar que um predador machucou severamente algum indivíduo, e que os demais devem procurar abrigo; lagartos que agarravam-se com cobras constritoras, para que elas soltassem um amigo, entre vários outros exemplos.
E nesse doce devaneio entorpecente que era observar a vida, vinha então o dilema que a pusera vagar àquela hora da madrugada em busca de resposta: será que deveria aceitar o que propunha o Hokage? Sim, seu sonho sempre fora ANBU - e mais especificamente na divisão mocho. Não parecia errado aceitar a proposta - tentadora aliás. Mas estaria ela preparada para enfrentar "predadores" tão ferozes? Teria ela força suficiente para proteger sua amada terra e preciosos entes? Estaria preparada? Dera um sorriso. Aquele lagarto diminuto não precisara de força; as aves minúsculas tampouco. Tudo o que eles usaram foram a sabedoria. Levantando-se decidida, ela abria os olhos verdes, que agora brilhavam a irradiar confiança. A pálida luz do luar iluminava com timidez o caminho daquela kunoichi, que as sombras conheciam tão intimamente a ponto de abraçarem-na e absorverem-na no mistério do seu silêncio.
- Nota da Eve:
Bem, como podem notar, a Tora meio que mudou a profissão de shinobi pra bióloga
Qualquer semelhança com a minha pessoa é mera coincidência
Bem, eram pra ser dois fillers separados, mas como não ando em condições muito boas para a escrita, resolvi juntá-los num só. Pretendo ainda continuar nesses fillers gerais, escrevendo um ou outro OVA acerca da temporada fora, para ir me re-acostumando até começar a nova saga. Obrigada pela paciência