-Mantenham-se atentos...
A voz de Yuu não fora mais do que um sussurro, mas ainda assim perfeitamente audível para os dois gennins presentes naquela sala. Com certeza os outros dois já teriam chegado à conclusão óbvia a que ela própria chegara: aqueles três clones eram apenas uma distracção, e os seus verdadeiros oponentes, quem quer que fossem, estariam algures nas redondezas prontos a atacar a qualquer momento.
-Okai, então... E agora?
-Agora... Provavelmente seria mais sensato separarmo-nos. - Começou Yuu, tentando captar algum ruído que não pertencesse ali. Não obteve qualquer resultado. - Podemos usar a mesma distribuição de há pouco: Yor, ficas a cargo da porta da frente; Okami, tu ficas na cozinha. Eu fico-me pelas traseiras.
Ambos os Gennins anuíram em concordância.
-E tomem cuidado. Não sabemos aquilo de que os nossos oponentes são capazes. - Atalhou Yuu, constatando o óbvio uma vez mais.
Já colocada nas traseiras da casa, Yuu tentava manter-se mais atenta do que alguma vez estivera na sua vida. No entanto, não conseguia lavar da sua mente a imagem da rapariga a desfazer-se numa torrente de corvos, que logo desapareceram num movimento desordenado, esvoaçante e azulado. Sentia as suas mãos tremerem levemente enquanto pensava naquilo que estariam realmente a enfrentar. Afinal de contas, um trio que se dava ao luxo de assaltar a mesma padaria tantas vezes seguidas tinha confiança nas suas capacidades. E aos olhos de Yuu, isso só podia significar uma de duas coisas: ou os seus oponentes eram realmente tão capacitados como queriam fazer parecer (e nesse caso ela, Yor e Okami estariam tramados), ou então não passavam de um grupo de miúdos que estava redondamente enganado quanto ao que conseguia fazer. Yuu apenas rezava para que a hipótese correcta fosse a última...
Imersa nos seus pensamentos, Yuu fez o exacto oposto daquilo que aconselhara os seus dois companheiros a fazer: distraíra-se. Não havia ficado desatenta por mais do que alguns segundos, mas foi o suficiente para ficar sob ataque sem sequer se dar conta do facto. Uma única kunai rasou o topo da sua cabeça, levando alguns fios do longo cabelo da jovem consigo. O instinto de Yuu levou-a a agachar-se imediatamente, mas sabia perfeitamente que aquele golpe por parte do adversário era uma grande ameaça: apesar de não a ter atingido num local crítico, havia falhado por pouco. E se tal havia sido propositado, aquela kunai fora apenas um aviso e uma ameaça. E dava ao seu oponente um total controlo sobre a situação. Bolas...
-Espero que percebas que acabei de te poupar. - O rosto de Yuu procurou a voz do seu interlocutor, e os seus olhos depararam-se com um rapaz de cabelo vermelho espetado, com olhos de um azul profundo e cativante. Yuu sentiu o seu coração falhar algumas batidas, e não conseguia perceber se tal se devia ao aparecimento de um oponente totalmente desconhecido ou se ao jovem em si: que Yuu havia já admitido, não era nada mal parecido... - Se fores esperta recuas e deixas-me fazer o meu trabalho sem percalços. Não queria ter de te magoar, mas se me tentares impedir terei de o fazer.
Yuu engoliu em seco. Já não conseguia pensar, nem sequer fazia um esforço para isso. Aquele rapaz assustava-a mais do que a cativava, o que não era pouco em nenhuma das hipóteses. Sabia que tinha de fazer alguma coisa. Tinha de o impedir de entrar na padaria a todo o custo: era para isso que ali estava. E era isso que tinha de ter em mente.
Cerrando os punhos e cravando os dentes na língua levemente, Yuu ergueu-se. O rapaz à sua frente ergueu uma sobrancelha surpreendida, como se não estivesse à espera que Yuu se conseguisse mover. Yuu fez os possíveis para fixar directamente o olhar dele, sem demonstrar receios ou fraquezas. Não era uma tarefa simples, mas deveria fazê-lo se queria pelo menos dar ao seu oponente a ilusão de que ela não era uma kunoichi fraca. Se o conseguisse enganar, se conseguisse fazê-lo assumir que ela não era tão má quanto realmente era... Talvez tivesse hipóteses. Apenas precisava que ele se capacitasse de que a mentira que ela transmitia era real. Mas Yuu soube que os seus esforços haviam sido em vão quando ouviu um pequeno riso escapar da garganta do jovem rapaz.
-Pelo teu ar posso dizer que não estás acostumada a confrontos directos. Pois deixa que te diga uma coisa, queridinha... - Os olhos de Yuu esbugalharam-se quando o rapaz se desfez numa nuvem de corvos. A jovem nem sequer teve tempo de procurar por ele. Nem precisava: soube imediatamente onde ele se encontrava assim que os seus braços foram firmemente agarrados atrás das suas costas, e uma kunai afiada encostada à pele pálida do seu pescoço. - Não tens qualquer hipótese contra mim.
Yuu sentiu a respiração falhar-lhe momentaneamente. Não se podia exaltar nem precipitar-se. Tinha de manter a cabeça fria e pensar calmamente, de modo a arranjar uma solução que lhe permitisse escapar das mãos do seu inimigo. Mas não lhe ocorria nada naquele preciso momento. Sabia perfeitamente que se demorasse demasiado tempo estaria a facilitar trabalho aos outros dois ladrões, e isso era algo que não podia acontecer. Tinha de avisar Yor e Okami.
Atrás de si o seu oponente continuava a falar, sussurrando-lhe algumas palavras ao ouvido. Mas Yuu já não as escutava, de tão determinada que estava em encontrar uma solução. Mentalmente relembrava as técnicas que sabia realizar, e tentou perceber qual delas seria a melhor para escapar àquela situação: se é que alguma delas poderia fazê-lo. Ou então, em alternativa, esperar que o seu oponente ficasse confiante o suficiente para afrouxar a sua 'prisão'.
-Não tarda nada os teus companheiros também estarão subjugados. - Começou o rapaz, ainda num tom de voz baixo e embalante. - Simplesmente patético, mandarem 3 Gennins para nos deter... Quem pensam vocês que somos? - Interrompeu-se por momentos para se rir um pouco. Yuu mantinha-se impávida. - Primeiro esta padaria, depois... Quem sabe. Havemos de derrubar o sistema económico da Vila, um estabelecimento de cada v...
Ainda antes que conseguisse acabar a sua frase sentiu uma pressão enorme ser exercida contra o seu estômago. Yuu sentira-o relaxar enquanto ele falava, e aproveitou o facto de os braços dele se encontrarem descontraídos para agir. Libertou-se das mãos dele com um único movimento fluído, utilizando o seu cotovelo esquerdo para lhe atingir o estômago e a parte lateral da sua mão direita para danificar o pulso que a ameaçava com uma kunai, fazendo-o largar esta última, que se fincou no solo com um ruído seco. Ao ver-se livre, em vez de atacar Yuu afastou-se do seu oponente com alguns passos rápidos, ficando assim de frente para ele.
-Se és tão bom como clamas, deverias saber que subestimar o teu oponente é um erro.
-Eh... Estás só a fazer bluff. - Cuspiu o rapaz, vendo a jovem erguer-se cheia de confiança. O pulso que a rapariga atingira doía-lhe imenso, quase a ponto de não ser suportável o simples roçar dos dedos da sua outra mão. Aquela cabra...
-Estarei? - Riu-se Yuu, começando a sentir-se mais confiante. Apesar da aparente diferença de poder entre ela e o seu adversário não se podia deixar ir abaixo. Se o fizesse estaria a dar-lhe a vitória de mão beijada: e mesmo que eventualmente perdesse, Yuu queria dar alguma luta.
-Não sabes com quem te meteste. - O rapaz parecia agora muito mais sério e ameaçador, enquanto enfiava a mão esquerda no interior da sua bolsa de armamento básico. Yuu esperava que ele retirasse de lá uma qualquer arma de pequeno porte, mas em vez disso a mão dele abandonou a bolsa com um corte no topo dos dedos indicador e anelar, e uma já considerável quantidade de sangue escorria dessa mesma fenda.
-Nem tu... - Yuu limitou-se a deixar o seu rosto ser inundado por um sorriso trocista, enquanto se colocava numa posição ligeiramente mais dinâmica. As palavras que acabavam de abandonar os seus lábios transportavam uma ameaça bem clara.
A expressão do rapaz não se modificou enquanto erguia a mão esquerda, fazendo um movimento que, segundo Yuu relembrava, era extremamente parecido com aquele de quem se preparava para arremessar um shuriken. Mas a mão do seu oponente estava vazia... Estaria?
A voz do seu oponente soou clara e baixa, não mais que um leve sussurro:
-Awadateru no chi...

Yuu parou por momentos, respirando pesadamente. Os ruídos que até então escutara vindos do interior da casa haviam cessado. Os outros dois combates haviam terminado, e Yuu não fazia ideia de quem teria levado a melhor. Tentou concentrar-se unicamente no jovem à sua frente, mas sabia que se os companheiros dele tivessem derrotado Yor e Okami todos os seus esforços seriam em vão. Aquele oponente em particular tinha uma técnica muito peculiar, que Yuu nunca antes vira. A princípio, quando vira o jovem cortar as pontas dos seus dedos, ficou confusa. Mas ficou tudo muito claro assim que o combate evoluiu e o rapaz fez o seu primeiro movimento.
Aquela técnica permitia ao seu oponente utilizar o seu próprio sangue como uma arma: mais em específico, criar uma espécie de chicote de sangue que ele conseguia manipular com um simples movimento da sua mão. E pelo que Yuu vira até ao momento, ele era bastante experiente no que tocava a controlar aquela técnica. Awadateru no Chi, se bem se lembrava...
Até ao momento, Yuu conseguira desviar-se de todas as investidas do seu oponente com aquela técnica macabra. Mas já começava a sentir o cansaço pesar nas suas costas, e sabia que se continuassem àquele ritmo não iria conseguir aguentar-se por muito mais tempo. E pelos vistos o seu oponente também notara isso.
-Vá querida... Ambos sabemos que não te encontras em condições de continuar com este combate. - Começou ele, com um tom de voz suave como a seda e uma expressão doce no rosto. - Rende-te agora e pode ser que perdoe a tua insolência.
-Ah sim? - Yuu riu-se, quase sem forças para continuar a respirar. Até agora limitara-se a esquivar-se das investidas do seu oponente, e não utilizara nenhum dos seus jutsus. Estivera até aqui à espera de uma boa oportunidade para lhes dar uso. - Admito que a tua proposta é tentadora, mas não pretendo render-me.
Mal ouvira isto, o rapaz de cabelos cor de fogo nem deu tempo a Yuu de inspirar. Fez um movimento vertical e descendente apontado a Yuu. A rapariga desviou-se por pouco, tendo ainda tempo de ouvir o solo onde antes estivera a colidir sob o tramo vermelho. Yuu não conseguia deixar de se espantar com o poder destrutivo daquela técnica. Supunha que o seu oponente embutia chakra extra no seu próprio sangue, tornando-o mais rígido que o habitual para que o dano causado fosse maior.
Até então os ataques do oponente de Yuu haviam sido muito previsíveis: o rapaz desferia um ataque e parava por momentos, como que a deixá-la descansar por um pouco. Mas agora encadeara dois ataques seguidos e Yuu, que não estava à espera de tal, não teve tempo de se desviar do ataque com eficácia. Conseguiu evitar danos de maior: mas não conseguiu evitar que o seu oponente lhe oferecesse um profundo golpe na bochecha direita.
Yuu tocou o rosto com cautela, e de imediato sentiu os seus dedos tornarem-se escorregadios. Ao olhar para a sua mão viu-a coberta de sangue, e o mais desconcertante era não saber se todo aquele sangue lhe pertencia só a ela ou se era sangue do seu oponente. Ambas as hipóteses faziam-na ficar com o estômago às voltas. Aos poucos começava a sentir um leve ardor no local onde o corte havia sido feito.
-E isso é só o início. - Avisou o rapaz de cabelo escarlate, com um breve sorriso no rosto.
Yuu cerrou os dentes, esforçando-se por se manter calma. Há muito que ele a subestimava, e parecia que até ali ele encarara o confronto como uma simples brincadeira. A jovem duvidava que ele tivesse sequer mostrado metade daquilo que realmente valia: e não sabia se isso a deveria deixar aliviada ou irada. De qualquer das formas tinha de agir. E rápido…
Soerguendo-se levemente retirou duas kunais da sua bolsa de armamento básico. Não se encontrava muito distanciada do seu oponente, portanto o movimento que planeava executar a seguir deveria resultar. Pelo menos minimamente…
Começou a correr em direcção ao seu opositor. Antes que ele pudesse pensar no que fazer para a impedir Yuu arremessou contra ele uma das kunais em que havia pegado há pouco, não interrompendo a sua corrida. Viu o seu oponente utilizar o Awadateru no Chi de forma fluida para desviar a kunai do seu curso, distraindo-se dela por momentos. Perfeito. Aproveitando o facto de o seu opositor ter os olhos desviados dela, Yuu realizou alguns selos. Quando ele finalmente focou novamente a sua atenção nela, preparando-se para a atacar novamente, não fazia ideia do que iria acontecer.
Para surpresa dele, a rapariga não se tentou desviar do seu ataque assim que o percepcionou. Era estranho, assumiu ele, mas era também mais simples para ele. Bastava-lhe acertar na rapariga uma única vez em cheio para a deixar fora de combate. Quando o seu ataque estava prestes a atingi-la a jovem realizou um selo: para ele era um simples selo isolado, sem qualquer significado. Mas para ela era o último selo de uma sequência que poderia salvá-la daquele ataque e ainda dar-lhe uma vantagem sobre o seu oponente. Assim que o chicote de sangue a atingiu, o rapaz pôde vê-la a desfazer-se numa nuvem de fumo branco, que rapidamente revelou um tronco. Kawarimi. Se ele tivesse conseguido evitar que o confronto fosse trazido para o exterior da padaria, muito provavelmente teria conseguido evitar que ela conseguisse utilizar tal técnica. Mas agora era tarde demais para arrependimentos.
Não precisou de procurar pela jovem durante muito tempo: ela estava mesmo atrás dele. Mas ele apenas se deu conta desse facto quando era tarde demais. A jovem tinha ainda na mão a segunda kunai de há pouco, a que mantivera na sua mão enquanto atirara a outra contra ele. E pelos vistos planeava atacá-lo com essa arma. Ele não teve tempo de retaliar de modo a proteger-se do ataque. Enquanto se virava para a jovem a única coisa que conseguiu fazer foi colocar ambos os braços à frente do seu corpo. Yuu não hesitou nem um momento, completando o movimento com o seu braço de modo rápido e abrupto. O golpe atingiu ambos os braços do oponente, que ele utilizava como ‘escudo’: num único movimento, Yuu ofereceu-lhe um golpe profundo e direito em cada um dos braços. Pretendia continuar a atacar, pelo menos tentar atingir uma área mais vital do seu oponente. Mas tal não lhe foi permitido.
Assim que finalizou o golpe nos braços do seu oponente e se preparava para deferir novo ataque, Yuu apercebeu-se de que cometera um erro fulcral: com o seu corte havia oferecido ao seu oponente, Yuu havia feito com que ele ficasse com os braços cobertos de sangue. E no caso daquele oponente em particular, mais sangue significava mais oportunidades para atacar. Afastando os seus braços num movimento abrupto, abrindo-os completamente para os lados, o rapaz afastou Yuu para longe, empurrando-a com o seu próprio sangue (que havia formado uma espécie de ‘barreira’ tosca).
-O teu plano poderia ter funcionado na perfeição com outro oponente. - Começou ele, baixando os braços. O sangue que lhe escorria das feridas que Yuu acabara de lhe abrir nos braços escorregava-lhe até às mãos num movimento serpenteante. - Mas comigo não. E desde já agradeço por me dares mais ‘material’ com que trabalhar.
O rapaz parou por momentos, observando Yuu enquanto esta se levantava. Ela não era tão má quanto ele assumira: tinha um raciocínio bastante rápido, tendo em conta o seu nível; e conseguia executar os seus planos com relativa eficácia. Mas infelizmente tivera azar com o seu oponente. Se tivesse enfrentado um dos seus outros dois camaradas, poderia já os ter subjugado há muito. Mas com ele a história era outra.
-A minha habilidade existe há gerações, e felizmente para mim foi sempre mantida em segredo pelo clã, já que era demasiado ‘macabra’ para os delicados ouvidos da maioria dos shinobis. - Começou ele a explicar, vendo Yuu respirar pesadamente enquanto se apoiava num amontoado de caixotes de madeira. - Temos a habilidade de controlar e manipular o nosso próprio sangue da forma que acharmos mais apropriadas. Podemos torná-lo tão suave quanto a mais delicada seda, ou tão ameaçador quanto a mais afiada lâmina. - Enquanto o jovem desembrulhava a sua explicação, Yuu olhava para as suas mãos. Curiosamente, viu o sangue do seu oponente pingar lentamente para o chão. - Com o tempo ficamos capazes de alterar as propriedades do nosso sangue, podendo mesmo torná-lo venenoso. Para tua sorte ainda não consegui desenvolver essa capacidade na perfeição, portanto não deves sentir mais do que um leve ardor.
Yuu respirava pesadamente, e constatou que aquilo que o seu oponente acabara de revelar era verdade. O ligeiro ardor que sentira quando o seu rosto foi atingido pelo sangue do seu inimigo evoluíra agora para um abrasamento ligeiramente mais intenso, que começava a espalhar-se em direcção ao seu pescoço. Não precisava de ouvi-lo da boca do seu inimigo para saber que, se continuasse com aquele fraco veneno no corpo, acabaria por sucumbir. Enquanto o rapaz falava, Yuu tentava engendrar um plano que lhe permitisse detê-lo. E, aos poucos, uma solução começou a formar-se na sua mente.

O seu oponente preparou-se para a atacar mais uma vez, desta vez erguendo ambos os braços. Pelos vistos a dor que sentira até então no seu pulso devido a um dos anteriores golpes de Yuu já se tornara suportável. Yuu preparou-se mais uma vez, começando a realizar alguns selos de mãos enquanto o seu oponente lhe apontava novo ataque. Quando identificou aquilo que ela estava prestes a fazer o jovem apressou-se, tentando atingi-la com a sua técnica antes que ela pudesse completar aquilo que tinha em mente. Mas assim que a atingiu, viu o seu chicote enrolar-se em volta de um caixote. Outro Kawarimi. Que pirralha irritante…
Tendo já a experiência da altura anterior, o rapaz virou-se imediatamente para trás. Esperava vê-la a tentar atacá-lo novamente, mas não havia ninguém atrás de si. Deu uma volta sobre si mesmo, e nem sinal de Yuu. Onde se teria ela escondido?
-Ah, queres brincar às escondidinhas? Muito bem, brinquemos então…
De modo claramente frustrado, o rapaz atingiu o primeiro tufo de arbustos localizado à sua direita. Nada, para além do espaço vazio. Mas não importava: se continuasse assim, mais cedo ou mais tarde acabaria por atingi-la ou amedronta-la o suficiente para a fazer revelar a sua localização. Atingiu mais dois arbustos, ambos vazios. Aos poucos começava a eliminar possibilidades, sentia que cada vez estava mais perto de a encontrar. Mais quatro arbustos. Cada vez restavam menos locais para revistar, não tardaria muito mais…
Um barulho silvante fez-se ouvir, proveniente de um local algures nas suas costas. Virou-se tão rápido quanto lhe era permitido e bloqueou três kunais que lhe eram arremessadas, utilizando mais uma vez o seu chicote de sangue. Quando já estava com o corpo completamente virado para o local de onde as kunais haviam sido arremessadas ouviu um novo ruído atrás de si. Voltou-se e lá estava a pirralha. Deves estar mas é parva…
Tentou atacá-la, mas ela desviou-se com uma espécie de cambalhota mal feita para a lateral. Nova investida, e ela evitou-a dando um salto para trás. Um outro ataque ainda, e ela evitou-o saltando por cima do ‘chicote’. O mesmo ataque na direcção oposta, pretendendo atingi-la por trás: mas mais uma vez falhou, quando ela se baixou evitando o ataque com uma facilidade estonteante. Novo ataque, dirigido novamente para a frente da jovem. E mais uma vez ela conseguiu evita-lo com um salto, ficando assim ainda mais perto do rapaz. Quando estava próxima o suficiente, Yuu desenhou um murro com o seu punho fechado. E quando o seu oponente a viu demasiado próxima, já assumindo que iria ser atingido, ela desfez-se em fumo. Um bunshin…A kunai que havia atingido o clone apenas interrompeu o seu trajecto quando se fincou profundamente no tronco grosso de uma árvore próxima. O rapaz olhou para o local de onde suponha que a kunai viera e avistou a sua companheira de equipa, os seus cabelos loiros a esvoaçarem num brilho prateado perante a luz da lua cheia.
-Estava a ver que nunca mais. - Disse-lhe ele com um claro sorriso no rosto. - Demoraste bastante tempo a derrotar o outro pirralho.
-Era mais capacitado do que eu julgava. - Confessou ela, afastando os seus luxuriantes cabelos do rosto com um movimento vibrante. - Não que te possas queixar demasiado, não é verdade? Nem acredito que ainda não tenhas derrotado essa miudinha.
O rapaz riu-se um pouco antes de responder e encolheu os ombros despreocupadamente.
-Não é que ela seja particularmente poderosa ou algo do género. Mas arranja uns esquemas bem matreiros... - Suspirou afectadamente, como se estivesse com pena dele próprio. - De qualquer das maneiras, ajuda-me a encontrá-la. Sozinho nunca mais avanço.
-Não precisas de pedir ajuda. - Yuu revelou-se finalmente, deixando-se cair do topo de uma árvore e aterrando em frente dos seus (agora) dois oponentes. - Não estava a esconder-me, estava simplesmente à espera do momento em que te colocasses num local que me permitisse atacar-te propiciamente. Mas visto que pensas que me estou simplesmente a esconder, talvez mais valha enfrentar-te assim.
-Desiludes-me. Pensei que fosses mais inteligente. - Confessou ele entre risos, preparando as suas mãos. Poderia atacar a qualquer momento. Yuu semicerrara os olhos e encontrava-se preparada para evitar o ataque dele. Mas havia algo de que ela não estava à espera. O mais discretamente que lhe era permitido, começou a sussurrar instruções à sua companheira de equipa. - Prepara-te. Assim que ela se desviar do meu ataque aproveita para a atingires.
A jovem mulher anuiu, enviesando o seu olhar entre Yuu e o seu colega. Ele, de tão concentrado que estava em não falar, não teria reparado nas acções da rapariga ao seu lado nem que ela erguesse um bastão com o dobro do seu tamanho para o atingir e desatasse aos berros. Sem perder tempo ele realizou novo ataque, procurando atingir Yuu com toda a força que possuía.
No entanto o seu ataque nunca chegou a alcançar a rapariga. Assim que os seus braços se impulsionaram para a frente, sentiu uma dor aguda no estômago. O brilho loiro dos cabelos da sua companheira inundou-lhe os olhos, enquanto ela o atingia no mesmo local uma segunda vez, derrubando-o. Tossindo com a dor crocitante dos dois golpes e lutando por respirar, não podia fazer nada a não ser ficar completamente imóvel, enquanto a sua companheira lhe retirava algumas cordas da bolsa de armamento e o amarrava com força.
-Mas… porquê?
-Porque não? - Começou ela, os seus belos lábios a desenharem um sorriso vitorioso. - Somos oponentes de qualquer forma. Seria parvo não aproveitar uma oportunidade destas.
-De que é que estás a falar? - Inquiriu ele, ainda com uma expressão confusa no rosto.
-Permite-me que explique. - Dizendo isto, a jovem esbelta uniu ambas as mãos em frente do rosto. Uma deflagração de fumo esbranquiçado envolveu-a, e assim que se dissipou revelou não a jovem que se encontrara lá há momentos, mas Yuu.
-TU?!? Mas… COMO?
-Bastante simples. Assim que te cortei ambos os braços sabia que não te podia causar qualquer lesão que permitisse a escapatória do teu sangue para o exterior, caso contrário estaria só a dar-te uma maior vantagem sobre mim. - Á medida que ela ia falando, as imagens do combate que acabavam de ter passeavam pela cabeça dele. - Mas reparei em algo: enquanto estavas parado o teu sangue escorria como o de qualquer comum mortal. - O rapaz de cabelo encarnado lembrou-se de como o seu próprio sangue lhe escapara das feridas enquanto explicava à rapariga a origem do seu poder, e de como ele lhe pingara dos dedos até ao solo. - Concluí que, a não ser que os teus braços se movimentassem em conformidade, a tua técnica não te serviria de nada. Então tudo o que tinha de fazer era impedir-te de moveres os teus braços. Era óbvio que não te poderia subjugar facilmente, porque para além de a tua técnica me manter longe de ti sou bastante mais baixa que tu. E foi então que me ocorreu…
Yuu parou por momentos, deixando o seu oponente na expectativa. O rapaz olhava para ela num misto de assombro, espanto e horror. Enquanto uma leve brisa se levantava, embatendo contra as suas feridas abertas e fazendo-as arder ligeiramente, ele esperava pelo resto da explicação da jovem. Ainda não conseguia acreditar que acabara de ser subjugado.
-E então lembrei-me: na maioria dos casos, as únicas pessoas que se conseguem aproximar dos nossos oponentes são os seus aliados. E lembrei-me da rapariga que me atacou no interior da padaria. - Aos poucos o rosto do rapaz iluminava-se. Começava a compreender o que ela acabara de fazer. - Tudo o que tinha de fazer era assumir o aspecto dela e aproximar-me de ti, esperar por uma altura conveniente e apanhar-te completamente desprevenido. Não demorei muito até arranjar uma solução: esperei que me atacasses novamente, para poder usar a técnica de substituição e esconder-me dos teus olhos, para que assim pudesse ficar mais à-vontade para pôr o meu plano em prática. Já escondida criei dois clones: o primeiro que te atacou e eu destruí sob a forma da tua colega, e o segundo que neste momento se encontra aqui connosco. - Yuu apontou para uma réplica de si própria que ainda se encontrava no mesmo local que antes. - Depois disso apliquei um Henge em mim própria, assumindo o aspecto da tua colega de equipa. O resto já tu sabes.
O rapaz baixou a cabeça, assumindo finalmente a derrota. Ainda não se conseguira conformar com o facto de ter sido derrotado por alguém muito mais fraco que ele.
-Afinal de contas, o que conta não é o número ou a força das técnicas que possuímos, mas o modo como as utilizamos. - Yuu parecia responder aos pensamentos do seu oponente, mas estava simplesmente a relembrar as palavras do seu pai e do seu avô. Quando se lembrou deste último, apertou o seu cachecol castanho entre as mãos. - Condenaste-te no momento em que paraste para te gabar da força da tua técnica. Mas não deste conta disso até ao final.
Yuu poderia ter continuado com o seu sermão, mas nesse momento Yor e Okami surgiam pela porta das traseiras. Sorriu-lhes brevemente, mal conseguindo ver os rostos deles. O ardor que antes lhe atingira o rosto, causado pelo veneno no sangue do seu oponente, espalhara-se agora pelo pescoço e ombros, e consumia já a parte inicial do tronco da jovem. Sentia-se demasiado exausta. Em vez de lutar por ficar de pé e consciente, Yuu deixou-se envolver pelo cansaço e pela toxina que lhe percorria o corpo: e numa questão de segundos desmaiou.

Fim