O som da chuva torrencial provocava uma melodia inquietante e, ao mesmo tempo, tranquilizante. Kai abriu os seus olhos e mirou a escuridão instalada pela noite fria e silenciosa. Era ainda de madrugada e o sol estava prestes a levantar, mas Kai já não conseguia adormecer.
Decidiu, então, contemplar as gotas de chuva que jorravam sem cessar.
" Está sempre a chover. Já passaram 10 anos desde que cheguei aqui e foram raras as vezes em que houve céu limpo e um sol radiante.” - começou, então, a relembrar o tempo maravilhoso de Konohagakure.
- “Sempre que podia, ia procurar o Yuu-kun para irmos brincar nos relvados. Tempos felizes, esses...” - e, subitamente, o seu coração quase parou.
- “Yuuta... Nunca mais te irei ver... Como estarás? Cresceste? Mudaste? Ainda te lembrarás de mim ou serei apenas parte do teu passado...?”- NÃO! - gritou ela, e abanou fortememente a cabeça para não pensar mais no assunto.
- Prometi-me a mim mesma que iria começar do zero. Aqui, sou Kai Hara. Não tenho passado em Konohagakure, apenas presente e futuro em Kirigakure. Tudo o que aconteceu na minha aldeia natal foram apenas ilusões criadas por mim e somente isso. Quando se apercebeu, já tinha parado de chover. As nuvens cinzentas continuavam a pairar no céu, mas era improvável a hipótese de voltar a chover tanto e o dia já tinha claridade suficiente para ela sair. Decidiu, então, dar um passeio pelo bosque que rodeava a sua casa humilde de madeira.
Enquanto que caminhava, Kai sentia-se deslumbrada pela paisagem à sua volta. Gotas de orvalho escorriam, claras e cristalinas e a terra estremecia aos passos dela.
De repente, parou. Olhou para trás de si e exclamou:
- Não precisas de te esconder, até um porco escondia melhor a sua presença do que tu. Se não saíres de trás desses arbustos quando eu contar até 3, dou-te de comer aos porcos! Os arbustos permaneceram imóveis, e Kai começou a ficar impaciente:
- 1...! - fez uma pausa de 5 segundos e continuou a contar
– 2...!- Desculpa, desculpa!- gritou uma voz masculina que vinha dos arbustos. O rapaz levantou-se e afastou-se dos arbustos, caminhando em direcção a Kai.
- Fica aí! - ordenou ela num tom ameaçador, enquanto que tentava identificar o rapaz.
Ele tinha cabelo negro como carvão, e os seus dois olhos grandes lembravam duas grandes pedras ónix. A sua pele era clara como a neve, o que proporcionava um grande contraste com o seu cabelo curto e os seus olhos enormes. Vestia uma camisa branca de mangas compridas, quase tão clara como a sua pele, e calças pretas até ao joelho. As suas vestes estavam impecavelmente limpas, e eram feitas de um tecido bastante caro e raro naquela zona pobre do País da Água. Sem dúvida que ele pertencia a uma família com posses, mas então o que fazia ele num sítio destes?
- Porque me seguiste? - interrogou Kai, com a voz gélida.
- Estava a colher bagas quando te vi aproximar, e como não quis arranjar confusões, decidi esconder-me! Olha! Tenho provas! - e, em seguida, meteu as duas mãos nos bolsos das calças e retirou de lá duas mãos cheias de bagas.
Kai olhou para os arbustos de onde o misterioso rapaz se tinha escondido, e pensou:
“Hmm... não é mentira, todos os arbustos desta zona não têm bagas e apenas as que se encontram a um raio de 20 metros é que têm dessas. Ele deve ter estado a colher as bagas lá e veio aqui procurar por mais. De certeza que não é daqui.” - deduziu ela.
- Desta vez finjo que acredito numa desculpa tão mal feita, podes te ir embora. Mas se te apanhar a seguir-me mais alguma vez... Entregarei pessoalmente a tua cabeça numa bandeja à tua família como presente. E olha que eu cumpro a minha palavra. - e, em seguida, virou as costas e continuou o seu percurso.
- Espera! Ajuda-me, por favor! - suplicou o rapaz. Porém, Kai afastava-se, ignorando-o totalmente.
- Eu fugi de casa e não sei como sobreviver aqui! Por favor, ajuda-me! Suplico-te! - ela continuava a afastar-se gradualmente, sem sequer abrandar o ritmo dos seus passos
– EU PAGO-TE! - gritou, por fim, num acto de desespero.
Kai finalmente parou, sussurrando:
“Shunshin no Jutsu!” e, desaparecendo numa nuvem de fumo, reapareceu junto ao rapaz.
- Pagas quanto? - perguntou ela com brilho nos olhos.
- N-Não trouxe imenso dinheiro comigo, mas posso-te pagar 50 ryos por dia... - gaguejou o rapaz, assustado.
- Óptimo! Segue-me, então... errm... como te chamas...?- Akio... Akio Kogane. E tu...? Qual é o teu nome...? - Chama-me Kai. - Mas Kai não é um nome para rapazes...?! Kai encheu-se de fúria e deu um grande soco na cabeça de Akio, sem qualquer tipo de misericórdia.
- AI! Para que foi isto!?- Kai é um nome que também se aplica a raparigas violentas, com péssimo humor e com imensa força. Aprende. - Mas para que foi o soco!?!- Palavras não bastam. Com o tempo, elas apagam-se. Mas se te bater antes de te ensinar uma lição, nunca a irás esquecer. - e sorriu com malícia.
- Agora fica calado e segue-me, se quiseres sobreviver aqui, Princesinha. O mato não favorece meninas delicadas como sua excelência. Calado, Akio seguiu Kai durante todo o percurso, enquanto que temia pela sua própria vida: como reagiria ela quando descobrisse que afinal ele tinha sido assaltado durante o caminho e não tinha dinheiro para lhe pagar...?