O controlo do incontrolável

O cubo central da organização era realmente enorme. Dividia-se em três andares: o rés-do-chão, que servia maioritariamente como meio de transporte para os outros cubos e ostentava alguns ornamentos, todos eles destruídos ou severamente danificados; o primeiro andar, que estava num estado semelhante devido à invasão de Katsu há uma semana atrás, mas este teve prioridade de reconstrução e faltava pouco para voltar à forma original; e finalmente o segundo e último andar, impossível de se saber alguma coisa devido ao Akatsuki nunca lá ter ido e nem poder observar desde o rés-do-chão. Quando o Imagawa entrou no cubo central, assombrou-se com a quantidade de ninjas que estavam de guarda, muito reduzida se comparada com a sua primeira invasão em que parecia um exército interminável.
- Mataste mais de metade da guarda que aqui estava... – Explicou Tsutao dentro da mente de Katsu, não se materializando como era seu hábito – Podes ser um idiota do caraças, mas até tens poder...
O Imagawa limitou-se a rir pelo elogio do seu alter-ego, sentindo-o a desaparecer novamente à medida que analisava o cenário à sua volta. Não ia ser nada difícil devido à fraca guarda que sobrou, pelo que apenas precisaria de abater alguns dos ninjas para atrair a atenção de Hideyoshi. Uma vez frente-a-frente com ele pediria explicações, nem que tivesse de corroer metade do corpo dele. Katsu preferia evitar planos complexos, queria sair daquela situação o mais depressa possível, decidindo arrebentar com tudo à sua frente, mais uma vez. Mas desta vez fá-lo-ia com cabeça. Dando um passo em frente, surgiu por detrás de um dos guardas do complexo e trespassou-lhe o pescoço com uma lâmina de água antes que ele tivesse tempo de pedir ajuda, tendo apenas a oportunidade de gritar em agonia antes de se afogar no seu próprio sangue, caindo sobre o danificado solo. O agudo grito atraiu a atenção de variadas pessoas ao longo do cubo, todas elas que cravaram as suas atenções no homem isolado lá em baixo que as fitava com satisfação. Embora houvessem muitas emoções ante o aparecimento de Katsu, a mais comum era o pavor da repetição do que aconteceu na semana passada...
- Vocês sabem o que eu sou capaz de fazer! – Vociferou o Imagawa, erguendo ambos os braços e deixando uma fina camada de chakra transbordar por eles como aviso – Na semana passada matei uma centena, não foi? – Devido ao silêncio que se abatera desde o seu grito, Katsu pôde ouvir alguns ruídos nervosos entre a multidão que o escutara – Então preparem-se, pois eu estou disposto a matar o dobro agora! – O terror alastrou-se e intensificou-se por entre os guardas da Shin no San, aumentando o ruído nervoso e as posturas deles – Podem evitar isso, se aquele cobarde do Hideyoshi aparecer aqui, à minha frente! Quero falar com ele!
As reações não mudaram, os guardas continuaram a cochichar entre si nervosamente, nenhum deles capaz de tomar alguma postura ante uma ameaça tão séria. Mesmo que fosse uma pessoa contra aquele pequeno batalhão, eles estavam conscientes que não seriam capazes de derrotá-lo com o seu escasso número. Todavia, para felicidade deles, um homem de armadura dourada aproximou-se da beira do segundo andar, olhando com curiosidade para o rés-do-chão.
- Tsutao?! – Vociferou o homem com um ligeiro tom de surpresa, coçando pensativamente a sua barbicha – Decidiste vir por própria vontade ao treino de hoje do Mangekyo?
- Anda cá para baixo, Hideyoshi! – Ignorou Katsu, afastando ambas as mangas do seu manto azul, ansiando por começar a descarregar pancada naquele homem – Vamos ter uma conversa de homens!
O líder do complexo deu uma ténue risada irónica, saltando por cima do corrimão e descendo a pique na direção do rés-do-chão. Quando todos começaram a pensar que Hideyoshi se ia esborrifar contra o solo, este afastou ambos os braços de si e manipulou habilmente uma grande quantidade de fogo que expulsou contra o chão, criando uma força de impulsão capaz de desacelerar a sua descida e fazê-lo pousar suavemente.
- Então, do que vamos falar? – Voltou a perguntar, cruzando ambos os braços e fitando o seu prisioneiro com expetativa. Ele tinha sempre atitudes tão interessantes!
Quando o Imagawa se ia a preparar para responder com um sorriso irónico, foi surpreendido pela imagem de Tsutao a surgir à sua frente. Nesse instante, sentiu um pesado baque no coração, que começou a bater freneticamente, enquanto que o semblante do Uchiha apenas trespassava raiva e mais raiva.
- Quero ser eu a falar e a lutar com ele! – Avisou quase em grito, apertando ambos os punhos com força de forma a tentar controlar a sua raiva – EU é que tenho assuntos a tratar com aquele tipo!
- Calma aí, Tsutao! – Pediu Katsu, mantendo a sua postura descontraída e a voz pausada – Eu sinto e tenho as mesmas memórias que tu, acho que consigo resolver o assunto! Além disso, não consegues controlar o meu corpo...
- Estás errado! – Rosnou Tsutao, aproximando-se com um passo – De certeza que te lembras das alturas em que ficavas temporariamente inconsciente e fazias coisas que depois não te conseguias recordar. Nesses momentos era eu que tomava conta do teu corpo e mexia com ele. Na minha mente eu pensava que estava a ter pesadelos, que acordava sobre um corpo que eu não conhecia e tentava de qualquer das formas livrar-me desse pesadelo. O último que teve envolvia um cão que não se calava, nem por nada! Eu não sabia como tinha ido aí parar, mas o seu ladrar estava a irritar-me tanto que acabei por usar ácido e matá-lo. Agora que tenho a minha vida partilhada contigo, percebi que esse ácido era o Santon e que estava a controlar o nosso corpo...
O Imagawa arregalou os olhos com a sucinta explicação. Então, fora isso que acontecera? Agora que se lembrava da situação, aquilo parecia realmente ser uma ótima explicação! “Cada grunhido animal soava como se houvesse um sino na sua cabeça, badalando bruscamente, vibrando cada um dos seus nervos, tomando cada ação incontrolável. Sem justa causa, Katsu começou a sentir-se culpado de algo que não fizera, trazendo à tona todos os pesadelos que todas as noites tinha, Tsutao Uchiha, a maldita Shin no San, o seu irmão... Quando abriu os olhos, suava compulsivamente e estava ofegante, mas o sino na sua cabeça extinguira-se para sua felicidade. Claramente satisfeito pela sensação ter desaparecido, depressa se transtornou ao observar ácido a pingar do seu braço direito, que estava muito próximo a um cão com uma poça esverdeada a borbulhar no lugar da sua cabeça.”
- E-então...
- Sim, e vou tomar controlo do corpo agora mesmo! – Avisou Tsutao sem qualquer hesitação, dando um último passo e fundindo-se ao corpo de Katsu. Lentamente, o Imagawa sentiu uma sensação que nunca antes sentira, como se o seu espírito estivesse a perder controlo do seu físico. Apesar de estar consciente que não era isso que acontecia, sentiu-se estranhamente livre, como se pudesse viajar para qualquer sítio sem interferir com nada. No entanto, ainda estava inexplicavelmente preso ao seu corpo, olhando para ele como se estivesse a olhar para um espelho enquanto sabia que agora era Tsutao a controlá-lo...
- Então? – Falou Hideyoshi, intensificando ainda mais o seu olhar expectante, não se preocupando com a situação. Vira até ao momento Tsutao a falar sozinho, algo que não o ralava por saber que o Uchiha estava a ficar maluco aos poucos, mas de um momento para o outro ele calara-se, abaixando a cabeça e deixando que os cabelos lhe cobrissem o olhar – Já te sentes melhor, Tsutao?
- Não digas... O meu nome... – Rosnou o louco, começando a respirar compulsivamente, crispando os dedos no seu manto azul com raiva – Vou matar-te... Maldito!
Ficando mais preocupado, Hideyoshi descruzou os braços, observando a estranha atitude do Uchiha à sua frente com um misto de curiosidade e receio. A loucura dele estava realmente a piorar a cada dia, falando sozinho e com bruscas mudanças de atitude e personalidade. Talvez se o tentasse acalmar... Soube que isso não funcionaria quando a cabeça de Tsutao se ergueu e, entre os longos cabelos a desejarem corte, viu dois olhos vermelhos, intensos, a fitarem-no. Era o Sharingan, mas aquele era diferente de todos os outros. Aquele demonstrava padrões negros invulgares que substituíam as comuns vírgulas cujo número definia o poder do Doujutsu. Ele estava com o Mangekyo ativo!
Enquanto o líder ainda raciocinava sobre a situação, foi surpreendido com a veloz aproximação dele, que ergueu um punho e o atingiu no queixo com grande força, arremessando-o para colidir de costas na parede atrás de si. Recompondo-se, Hideyoshi olhou para Tsutao, que respirava ofegantemente e não conseguia parar de tremer, transbordando loucura em cada ação sua.
- Vais dizer-me toda a verdade sobre mim! E depois vou matar-te tanto... Mas tanto...! – Voltou a rosnar, inspirando uma grande quantidade de ar e misturando-o com altas quantidades de chakra – Katon: Goukakyuu Chakra no Jutsu!
A bola de fogo gigante projetou-se a uma velocidade incrível, demonstrando uma habilidade em Ninjutsu que Hideyoshi não vira até então. Erguendo ambos os braços, desfez todo o fogo da técnica com apenas um gesto de mão. Tal demonstração de poder teria espantado qualquer ninja, menos Tsutao que estava tão submerso na sua própria loucura que nem tinha tempo de analisar o seu adversário. Em mais um grito insano, invocou e arremessou duas Fuuma Shuriken com grande precisão, seguindo-as imediatamente com uma rápida corrida, consciente que os projéteis não seriam o suficiente para matar Hideyoshi. Tal como previsto, o líder esquivou-se com facilidade, surpreendendo-se de seguida com a súbita aparição do adolescente que trazia o seu braço erguido embebido numa lâmina de água extremamente afiada e desejosa de sangue.
- Katon: Dai Endan! – Gritou em desespero, cuspindo uma rajada de fogo à sua frente que apanhou Tsutao desprevenido e o atingiu em cheio, queimando o seu corpo até virar cinzas... Assim imaginou, se o corpo do seu inimigo não parecesse atravessar as chamas como se não fossem nada, materializando-se após estas se extinguirem para estocar com a lâmina de água – Mas o que... – Grunhiu Hideyoshi, usando o braço direito como proteção, sentindo a espada a cravar-se dolorosamente no mesmo, a sua ponta aquosa a cravar-se tão profundamente que fora capaz de tocar tenuemente no osso. Tsutao deliciou-se com aquele urro de dor e com o sangue a espirrar para a sua face – Como... Consegues usar... O Kamui?
O adolescente não respondeu, rindo loucamente e afastando o seu némesis de si com uma forte patada no seu abdómen. Não se comoveu com as dores dele, espalhando chakra pelos dedos de ambas as mãos e criando dez agulhas de ácido que arremessou contra o corpo do líder da Shin no San com claro intento de matar. Este observou a peculiar técnica a dirigir-se na sua situação, assustando-se por nunca ter visto aquela habilidade na sua vida e obrigando-se a criar uma defesa improvisada, varrendo o ar à sua frente com ambos os braços para criar um poderoso fluxo de chamas que foi capaz de destruir as agulhas antes que elas o atingissem, trazendo para o cenário uma densa nuvem de vapor.
- Aquela água verde... O que era aquilo? – Questionou Hideyoshi, ainda não percebendo que naquele estado o adolescente não iria responder a nada, olhando à sua volta à espera de um ataque de qualquer lado – Explica-te, Tsutao!
Quando o seu inimigo voltou a pronunciar o seu nome, pareceu conseguir deixar Tsutao com ainda mais raiva. Rangendo os dentes com tanto ódio do homem que matou o seu pai e a sua mãe, deixou uma grotesca quantidade de chakra pairar à sua volta.
- ESTÁ CALADO! – Gritou, atraindo imediatamente a atenção para si com a sua voz estridente – Eu vou desfazer o teu corpo em poeira! EU VOU DESFAZER ISTO TUDO A NADA! – A concentração de chakra transformou-se em múltiplas fontes de água que começaram a transbordar por debaixo dos seus pés – Santon: Dai Bakusui Shoha!