- Spoiler:
Fui orientado pelo Ghost de que uma missão rank D podia ser concluída em dois posts, então aqui está:
Para além do próprio saturante calor de Suna, as labaredas de fogo se alastrando no que parecia ser um aglomerado vertical de pequenas moradias tornava a sensação térmica do lugar quase insuportável. O edifício devia ter dez andares, e o fogo, provavelmente originado num andar baixo, se adensava a olhos nus, alcançando os superiores com grande velocidade.
- Opa! - disse Senshou ao se deparar com um dos chuunins responsáveis pelo incidente. - Viemos para ajudar - e traçou com os dedos um gesto que foi de si para Kamus.
- Vocês possuem alguma habilidade suiton? - inquiriu o chuunin prontamente.
Os dois gennins trocaram entre si um olhar de imponência, depois voltaram-se para o chuunin com um sorrisinho e um dar de ombros, negando. Ele suspirou, mas logo recuperou a compostura:
- Bom, tão urgente quanto isso é a necessidade de tirarmos as pessoas lá de dentro. Há várias encurraladas pelas chamas. Não percam tempo, separem-se e tirem-nas de lá da forma que puderem. - Ele próprio armou-se para saltar rumo ao edifício, travando apenas por um segundo para um último recado: - Tomem cuidado.
Controlando o chakra na região de seus pés, Senshou e Kamus saltaram logo em seguida, fixando-se com o Kinobiri nas partes das paredes nas quais o fogo não consumira. Sem perder tempo, cada qual rumou numa corrida veloz na direção de uma abertura, fosse janela ou fosse fissura.
...
A cerca de cinco metros do solo, Senshou entrou por um enorme buraco causado por uma explosão. A destruição alastrava-se por todos os cantos internos onde seu olhar alcançava. Com cautela, começou a adentrar no edifício a procura de pessoas. Não demorou até que se deparasse com uma garota desacordada. Seu corpo desmanchava-se enlanguencido pelo chão. Senshou não conseguiu definir se ela desmaiara pelo calor ou pela fumaça.
De repente, uma labareda de fogo ergue-se num jato de uma cratera localizada no chão do cômodo, a alguns metros da menina. Vendo que o fogo não atingira diretamente a garota, Senshou aliviou-se, mas por um segundo apenas. A construção, naquele instante já bastante desfigurada, teve o resto de suas ligaduras consumidas pela explosão de fogo.
Em sintonia com o próprio som do ruir do teto, o gennin anteviu uma lasca enorme a despencar em cima do corpo da menina. Sem ter tempo para raciocinar, ele agiu num átimo: impulsionou-se com o Nijuutobu, disparando em seguida com toda sua velocidade, as mãos embolando-se numa confusão de selos durante a corrida. Quando, num rompante, rolou no chão catando a garota nos braços, teve tempo apenas para virar-se na direção da lasca de tijolos e expelir, do seu peitoral já completamente estufado, a rajada de vento mais poderosa que foi capaz de produzir no afoito da situação.
A lasca pairou no ar por milésimos. Com a queda sendo amortecida pela rajada de vento do Daitoppa, Senshou teve tempo suficiente para, arrastando-se rapidamente pelo chão, acoplar seu corpo e o da menina em baixo d'uma pequena escrivaninha escorada à parede.
Quando por fim o jutsu de vento perdeu sua potência, a lasca de teto caiu com força, fazendo os pés da cômoda rangerem ruidosamente. Senshou levantou seus braços e impôs a maior força que pôde para que a escrivaninha não se desfizesse sobre seus corpos.
O som de várias lascas de teto desabando ao longo do andar reboou nos ouvidos de Senshou. O peso mantido pelos seus braços aumentaram consideravelmente. As frestas laterais tamparam-se, soterrada por pedras, areia e pedaços de móveis destruídos.
Senshou sentiu os músculos gritarem por oxigenização. Inspirou profundamente, sorvendo um ar abafado e empoeirado que o obrigou a tossir ruidosamente, quase fazendo seus braços cederem.
O garoto rangeu os dentes, frustrado. Não sabia como agir.
...
Kamus já havia retirado três pessoas do edifício em chamas. Ao entrar por uma janela no oitavo andar, deparou-se de cara com um casal de idosos e sua netinha. Eles tinham se alojado naquele cômodo próximo a janela, pois o resto da casa já estava tomada pelas chamas.
Por insistencia dos velhos, Kamus carregou primeiro a garotinha. Agarrando-a no seu colo, o gennin concentrou chakra nos pés para equilibrar-se e desceu numa corrida vertical até se sentir seguro para saltar. No chão, pediu à menina que aguardasse à distância e disparou para buscar os idosos. O homem foi quase tão fácil quanto a neta. Era pequeno, encurvado e quase esquelético. Depositou-o às suas costas e, com um pequeno controle de chakra ali, um pouco de equilíbrio entre força e velocidade dacolá, e pronto, ele estava são e salvo junto à sua neta.
A esposa se tornou o maior problema pro jovem Hyuuga. Era uma mulher grande, corpulenta e bastante gorda. Ali, fitando-a mais uma vez, inferiu que tivesse pelo menos noventa quilos. Antes de carregá-la, voltou-se receoso para a janela. Olhou para baixo e para os lados, o cenho franzido. Não avistava Senshou há tempos...
O estralo do fogo destruindo alguma coisa no interior da casa chamou a atenção dispersa do garoto. Tinha que se virar sozinho para tirar a senhora dali. Ainda próximo à janela, pediu para que ela agarrasse em suas costas. Arregalou os olhos ao sentir o peso completo da mulher sobre si. Eram com certeza mais de cem quilos.
Amorteceu seus músculos. Testou dar alguns pulos. Tinha algum controle sobre si, mas aquilo era absurdo. Não conseguiria equilibrar-se com o Kinobiri apenas nos pés numa inclinação como a que ia descer.
- Segure-se em mim com toda sua força - disse à senhora, já subindo no parapeito da janela.
Espalhou chakra Kinobiri por toda a região dos braços, pernas e nas costas, esperando que aquilo ajudasse a mulher a fixar-se melhor em si. Não economizou chakra em torno das extremidades com as quais desceria o edifício: os pés e as mãos. Assim concentrado, flexionou os joelhos e lançou-se à frente num rápido salto para fora do prédio, girando seu corpo no ar em cento e oitenta graus para dar-se com as mãos no parapeito da janela.
O baque foi tremendo. Suas mãos e pés fixaram-se com eficiência, mas por alguns instantes pensou que os músculos do seu braço cederiam. Teve a impressão momentânea de que os tendões ao longo dos ombros e bíceps se romperam.
Fremindo e um tanto desesperado, receoso de que acabasse caindo e matando a mulher, Kamus mal parou para respirar. Fazendo toda a sua força pulsar com máxima potência, começou a descer o edifício, cauteloso mas veloz. Grudando-se nas paredes com mãos e pés, desceu nesse movimento arrastado e em pouco mais de um minuto conseguiu chegar ao chão em segurança.
Seus músculos gritaram de alívio ao se verem livres daquele peso enorme. O konohanin sentia-se rígido, como se a sobrecarga de peso sobre seus músculos tivesse retirado sua flexibilidade. Mas, embora se sentisse dolorido, Kamus percebeu que nada de realmente preocupante aconteceu ao seu corpo.
A mulher agradeceu-lhe cordialmente, um tanto envergonhada pela situação. Kamus sorriu com empatia. Não tinha intenção de criar esses tipos de constrangimentos. Avisou para os avós se afastarem e continuou a missão.
Senshou ainda não havia reaparecido. Kamus segurou o selo da cobra na frente da sua face e fez chakra fluir ao longo do seu sistema ocular, o suficiente para que ativasse o Byakugan. Ao pé do prédio, sua visão elástica era capaz de encobrir quase toda a construção diante de si. No topo, o chuunin que falara com eles parecia retirar as últimas pessoas ainda encurraladas pelas chamas.
Nada de Senshou. Fungou. Aumentou exponencialmente o fluxo de chakra no seu doujutsu. Com isso sua visão ganhou uma sensibilidade muito mais apurada para ver através de objetos, detalhar pequenas coisas à distância e identificar quase naturalmente movimentos e organismos vivos. Foi dessa forma que, exaltando-se, avistou Senshou junto de uma garota desconhecida, no quarto andar, os dois presos debaixo de pedras e móveis. Estavam à beira de ser esmagado por um amontoado de escombros. Com os braços erguidos, o garoto segurava o suporte de madeira sob o qual se refugiara. Os músculos tensionados e os movimentos descompassados de sua respiração denotavam cansaço e falta de ar.
Todas essas imagens e conjecturas intercambiaram entre a visão e a mente do Hyuuga em questão de segundos. No momento seguinte, cheio de preocupação, ele já se punha em veloz disparada. Entrou pela fissura na parede e parou ante à nova perspectiva do cenário. A lasca de teto que cobria o lugar onde estava Senshou era enorme, mas unindo suas forças talvez pudessem resolver a situação.
Tratou de, primeiro, limpar a região ao redor. Haviam portas, mesas, privadas e outros tantos estilhaços menores do que outrora compunha o teto do andar superior. Kamus encobriu sua mão de chakra com o Shukuken, de modo a evitar que terminasse cheio de feridas por remover aquele monte de destroços. Com agilidade, retirou tudo que estava em cima da lasca de pedra que prendia Senshou. Em seguida, fez o mesmo processo nas laterais, abrindo de um lado a fissura formada pelo encontro da lasca de teto com a parede.
Senshou respirou aliviado ao avistar os olhos alvos do companheiro.
- Demoraste, criatura - murmurou num gutural. Parecia estar um tanto exausto de permanecer na mesma posição, empregando continuamente uma grande força para manter seu corpo e o da menina seguro.
- Desculpe - respondeu Kamus num sorrisinho. - Tive meus próprios contratempos.
- Tire-a daqui - disse Senshou quase cortando-o. Com a cabeça apontou para a menina desmaiada.
Kamus embrenhou-se agachado debaixo da escrivaninha, agarrou as pernas da garota e deslizou rapidamente seu corpo para fora de perigo. Pegou-a no colo e a depositou próxima ao buraco na parede por onde havia entrado no edifício. Retornou para seu companheiro de missão.
- Vou ajudar-te com o peso disto aqui, de modo a te permitir deslocar-se do centro para o outro canto da lasca do teto. Estando lá, nós dois saímos ao mesmo tempo.
Kamus entrou debaixo da lasca de pedra e, a poucos centímetros de alcançar a escrivaninha sob a qual estava Senshou, ergueu seus braços, impondo grande dose de força. Foi a deixa para Senshou. Ele relaxou seus músculos e respirou aliviado por um segundo apenas. As pernas de madeira da escrivaninha rangeram. Num rápido reflexo, ele levantou os braços novamente.
- Continue atento e apoiando acima de si, mas saia de uma vez - disse Kamus entredentes.
Deslizou-se com destreza na direção da outra brecha lateral, formada pelo encontro da lasca caída e da parede. Sentado no chão, as mãos erguidas e as pernas esticadas, começou a chutar furiosamente o amontoado de pedras que ainda fechava seu caminho daquele lado. Como Kamus já havia retirado os destroços mais pesados ao redor, foi questão de segundos. Liberada a passagem, ele ergueu-se e segurou com as mãos a beirada da lasca de teto.
- Pronto? - inquiriu Senshou.
- Às ordens.
- No três - disse, já começando a contagem: - um... dois... três!
Os dois gennins, cada um num extremo, soltou a lasca e retirou-se num impulso veloz para tomar distância. Esperaram que a cômoda cedesse no mesmo instante sob o peso da lasca, mas viram que suas noções de equilíbrio estavam um tanto defasadas.
- Mas o quê - começou a exclamar Senshou, a voz num tom de frustração.
Foi interrompido pelo barulho simultâneo de madeira dilacerando-se em frangalhos e pelo baque surdo da grande lasca de pedra pousando, enfim, no chão. Kamus riu levemente, Senshou suspirou pelo êxito.
Temendo a possibilidade de que mais coisas desabassem, não perderam tempo naquele lugar. Senshou pegou a garota no colo e, equilibrando seu chakra com o Kinobiri, desceu do prédio em passos ágeis e cheios de destreza. Kamus acompanhou-o logo atrás.
No chão, ao pé do edifício, havia uma movimentação de shinobis que deixou os garotos curiosos. Aproximando-se, o chuunin com quem haviam conversado no início da missão avistou-os e os interceptou.
- Vejo que conseguiram ajudar salvando vidas. Fico contente com a efiência de gennins iniciates como vocês.
- A missão acabou? - quis saber Kamus, estranhanso a postura do chuunin.
- Sim. Descobrimos onde o fogo se originava e resolvemos o problema. Como podem ver, as labaredas foram contidas.
- Mas o que causou toda essa confusão? - foi a vez de Senshou.
O chuunin hesitou. Olhava de Kamus para Senshou à menina desmaia, tentando decidir alguma coisa que o perturbava. Por fim suspirou.
- Uma criança - respondeu, resignado.
- Hã?
- Também não entendemos ao certo a situação. Mas quando fomos atrás da origem desse fogaréu sem fim, nos deparamos com essa criança. Expelidas sucessivamente pelas suas extremidades, as labaredas rondavam o corpo dela numa dança infernal. Num tipo de transe, ela não reagia a nenhuma tentativa de comunicação. Mas, antes mesmo de colocarmos em prática um jutsu suiton que a detivesse, seu corpo caiu desfalecido ao chão.
- Vocês deixaram uma criança morrer e inventaram essa ladainha para justificar-se? - Senshou estava estarrecido, o corpo quase retesado para atacar.
Pela primeira vez o chuunin lançou a eles um olhar feroz.
- Não nos confunda com moleques desastrados - ralhou ele. - Queria evitar que vocês soubessem dos detalhes, mas às favas com a manutenção dessa inocência medíocre! Mais cedo ou mais tarde vocês aprenderiam que não há rank de missão capaz de estabelecer ordem e padrão com o imprevisível. Hoje, no que seria uma simples missão de resgate, assisti à uma criança sucumbindo ao poder como uma besta incontrolável, e não pude fazer nada. Neste instante, sequer sou capaz de compreender.
Senshou e Kamus olhavam seriamente para o chuunin. Qualquer questionamento de Senshou quanto a honestida do outro se calou. Depositou a menina aos seus pés, curvou-se rapidamente diante dele e começou a se afastar.
Um pouco atrasado, Kamus agradeceu ao chuunin e correu para alcançar seu companheiro.
- Confia no que ele falou? - perguntou Kamus depois de um longo silencio preenchido pelas passadas dos garotos.
- Antes de ser preso sob aquela lasca de teto, um jato de fogo ergueu-se como que expelido de uma cratera do chão. - Ele olhou para Kamus. - Vê? Aquilo ali não foi causado por uma única explosão ou por uma vela que caiu sobre um cortinado.
Alguma coisa gerava o fogo.
- Mas uma criança? - Kamus ponderou. - Continuo achando estranho.
Senshou deu de ombros.
- Sejamos sinceros. Já nos contaram coisas mais absurdas. Crianças que controlam Bijuus, crianças portadoras de Rinnegan...
- É um tanto triste...
- E fantástico. Saber que, no fim,
é mesmo possíveil. Isso e tantas outras coisas.
Senshou fitava o horizonte com um brilho ardente consumindo seu olhar. Era sintomático que, em correspodência, o pôr do sol desmanchasse lá no confim um laranja lustroso, refletindo as ambições do jovem shinobi.
- Sim - Kamus sorriu observando o outro. Havia chegado ali em Suna, afinal, por estar a procura dessas possibilidades de fascinação. - Tem razão.
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FIM
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