XII
Jogo de sombras
“um peão pode ser rainha”
O silêncio preencheu aquele lugar escuro. As rochas negras guardavam para si o que se passava na escuridão, gritos escondidos que ecoariam eternamente naquele lugar, no centro um corpo, nu ao ar gelado que entrava pela entrada que se abria para o deserto branco que se encontrava no exterior.
Zef fora o primeiro a sair desenrolando as ligaduras dos seus braços que se encontravam manchadas com sangue. Um movimento lento e ritmado dos braços enquanto o seu olhar se prendia no horizonte, a sua mente, ausente processava toda a informação, cada pedaço de informação que retirou do homem. As ligaduras foram deixadas ao vento sendo levadas por este para serem esquecidas pelo tempo. Atrás do ninja duas sombras apareceram, Naro e Azura, serenos como a neve que começara a cair naquele sítio. Com um movimento suave a capa negra rodeou o corpo de Ichinose que com um movimento da cabeça deu o sinal para os ninjas se porem em movimento.
A marcha era uma mistura de corrida, a neve enterrava as pernas e dificultava os paços de cada membro, o sol, esse já se punha no horizonte transformando aquele sítio num ermo esquecido por deus ou por qualquer outra entidade superior. O silêncio era mortal e nenhum dos três tinha dito qualquer palavra, o seu destino era um porto onde estaria um barco a sua espera para os levar a Kirigakure e nenhum tinha muito tempo a perder, por isso correram pela noite dentro sem parar e sem falar.
Uma pequena vela iluminava o quarto improvisado, um pequeno colchão adornava o chão pobre e usado, do lado oposto encostada a uma parede uma pequena mesa e um banco rudimentar albergavam o corpo de Zef que se debruçava sobre o seu caderno enquanto com uma pequena caneta de aparo escrevia o seu relatório.
“Tudo correu como esperado e como tenho aprendido ao longo do tempo. Exerce um pouco de pressão e todos se dobram perante a dor, faz as perguntas certas e todos respondem, arranca um dente certo e a verdade flui como uma cascata, mas no fim não deixes sobreviventes, ou então quebra o seu espirito ate as pessoas se esquecerem de quão humanas são. A missão correu como esperado, entramos, saímos e o alvo foi neutralizado, sem bem que algumas perguntas nunca magoaram ninguém. O gordo do samurai foi uma fruta fácil de espremer, uns cortes aqui, uns murros ali, na verdade fiquei com os punhos um pouco doridos, mas acho que faz parte das maleitas da profissão. Mas quanto as perguntas. Este devia ser um peixe importante na hierarquia, e parecia saber muito em relação ao meu pai, sabia nomes, planos direções, datas, ou simplesmente sabia coisas que não devia, mas não interessa, sei pelo menos que a Ika encomendou um exército de samurais com o propósito de atacar alguém, ou algo, só falta saber o que e quando. Por enquanto preciso de me manter o cãozinho do meu pai, preciso de subir nos ranks e encontrar a informação necessária para o golpe final.”
Zef pousou a sua caneta e fechou o caderno colocando-o na sua pequena bolsa ninja, momentos depois toques suaves na madeira despertaram a sua atenção, a porta abriu-se um um ANBU entrou no seu quarto erguendo a mão para ele, nesse mesmo instante Zef colocou um pergaminho negro na palma do mesmo, fazendo com que este desaparecesse na escuridão do corredor.
-Já chegamos a Kirigakure. -Soou uma voz familiar do outro lado da porta. –E o teu pai pediu para te apresentares no Buraco, acho que tem outra missão para nós.
Naro estava diferente de antes, o seu temperamento estava mais manso e voz mais calma, desde que tinha visto Zef a matar o samurai que o seu tom perante ele tinha mudado, talvez continuasse o mesmo psicopata, mas todas as piadas e insultos direcionados a Zef tinham acabado. Os dois ninjas acabaram por aparecer no convés do barco que se encontrava agora ancorado ao porto de Kiri, Azura já se encontrava ali, sempre com a mesma postura e com a sua típica máscara, sempre silencioso e morto, ate aquele momento.
O seu corpo aproximou-se vagarosamente de Ichinose colocando uma mão fria sobre o seu ombro coberto de ligaduras.
-O meu caminho ao teu lado acaba aqui, por agora, outros assuntos vão preencher o meu tempo por agora, mas talvez um dia nos voltemos a encontrar. –A voz foi fria e decidida dilacerando cada parte do corpo de Zef enquanto o ninja desaparecia num rápido shunshin.
O ninja ficou paralisado olhando o vazio e ainda processando aquilo tudo, os porquês invadiram a sua mente, perguntas sem resposta e um vazio. Azura tinha sido o que podia de chamar um verdadeiro amigo e companheiro ate ali, mas parecia que tinha acabado tudo assim como tinha começado naquele dia ainda mais estranho no Buraco. Naro permanecia a seu lado, calado, talvez também em choque com aquilo, ele sabia que Azura era frio mas não esperava algo assim.
-Bem acho que não nos devemos demorar. –Disse o ninja de cabelo vermelho e branco quebrando o silêncio e olhando Zef com o seu sorriso típico.
-Sim. –Respondeu secamente companheiro das ligaduras. –Vamos.
A viagem dos dois ninjas não demorou muito e depois de uma hora a correr chegaram ao Buraco, aquele sítio maldito, mas aparentemente silencioso. As ruas subterrâneas estavam vazias, parecia, parecia que a anarquia tinha acabado que os ninjas soltos ali tinham achado ordem no meio do caos. Os dois ninjas avançaram pelos corredores, cortando as esquinas necessárias para chegar a sala onde o pai de Zef se encontrava.
A porta era simples e talhada na rocha, de cada lado encontravam-se ninjas usando a mascara negra com a lula dourada, um deles abriu a porta sem demora abrindo o caminho para a sala escura. Duas velas ardiam em cima da mesa simples, e quatro em cada canto da sala simples. Quatro paredes escavadas na rocha mas lisas como se tivessem sido polidas, a mesa era uma confusão de papéis, cartas, pergaminhos e uma máscara de ANBU solitária. Do lado sombrio estava Ichinose Hatori, sóbrio como sempre, os seus olhos percorriam as linhas escura sobre o pedaço de papel amarelado, sem levantar os olhos para ver os ninjas fez um aceno como a mão dando a ordem para estes se sentarem nas cadeiras.
-O teu relatório. –Começou por dizer. –Esta muito bom, a missão foi um sucesso, uma erva daninha eliminada significa um passo em frente para o nosso objectivo. O Buraco esta como eu planeei e os ninjas estão prontos para integrar as fileiras. Assim como vocês, o vosso regresso ao esquadrão ninja de Kiri esta tratado, Zef e Naro, vocês a partir de hoje regressarão a equipa de Izuda, serão agentes infiltrados, o vosso objectivo será subir nos ranks ninja. Serão chamados aqui para novas missões e por agora estão dispensados. E parabéns pela missão mais uma vez.
Os dois ninjas saíram da sala em silêncio.
“Agentes infiltrados? Será que ele pretende um ataque interno a hierarquia da vila? Vai arriscar uma guerra civil apenas para conquistar a vila, isso faria sentido tendo em conta o exército de samurais que ele encomendou.”
Os olhos frios de Zef olharam uma vez mais a escuridão atrás de si.
“O velho pensa que nos tem na mão, mas este jogo de sombras pode ser jogado a dois.”