[Filler 12]: Momentos- Spoiler:
A pouca compostura que restava a Yuu desapareceu numa questão de segundos. Perante as palavras de Kentai, e a incapacidade de explicar o porquê de ele saber o que lhe ia na cabeça naquele momento, a jovem mal sentiu o seu corpo a ceder. Atrapalhada e com o rosto envolto numa míriade de vermelhos, não se chegou a aperceber da quantidade de passos que o seu corpo recuou; a sua boca esboçou uma série de balbucios que nunca chegaram a ser realmente pronunciados. Toda a confusão e todo o medo que se instalavam na sua cabeça foram momentaneamente quebrados quando o seu corpo tocou algo que o fez desequilibrar-se. As suas mãos agarraram-se à primeira coisa que conseguiram alcançar e a kunoichi tentou equilibrar-se da melhor forma possível, procurando ignorar a algazarra que acabara de causar. Os seus olhos procuraram o corvo negro em vão. Foi distraída por um gemido baixo atrás de si. Quando procurou a sua origem, lá estava Itari: ainda imóvel e de aparência fraca, com um rasgo azul a notar-se tenuemente por entre as suas pálpebras, agora entreabertas. Yuu ficou sem reacção, a sua respiração suspensa e o seu coração a bater cada vez mais rápido, presenciando a voz dele arrastar-se dolorosamente para fora da sua garganta.
-Yuu...
Houve um momento de quietude discreta e silenciosa na inércia dos corpos dos dois jovens. Nos meros segundos que se desenrolaram até que um deles tomasse a iniciativa, os dois entreolharam-se como que em expectativa, e era claro que nenhum dos dois sabia bem o que deveria fazer, ou mesmo o que dizer numa situação como aquela. Yuu tentava a todo o custo manter-se calma, apesar de o seu músculo cardíaco bater cada vez mais depressa à medida que ela se recusava a desprender os seus olhos dos do rapaz. Itari, por sua vez, não só se encontrava ainda demasiado fraco para fazer fosse o que fosse, como também se sentia inexplicavelmente ansioso e incrédulo: depois de todos os meses que se haviam passado, chegara a pensar que nunca mais veria a rapariga novamente. E no entanto ali estava ela, como num dos seus sonhos mais dissimulados.
Yuu acabou por baixar o rosto e suspirar em embaraço e alívio, quebrando um pouco a tensão de expectativa que se assentara sobre as cabeças de ambos. Tentou levantar-se desajeitadamente, constatando que se havia agarrado inadvertidamente aos lençóis que cobriam Itari aquando da sua queda. Em pensamento, havia ensaiado imensas alternativas ao que poderia dizer assim que se encontrasse com Itari novamente. Mas inexplicavelmente, o seu cérebro havia ficado completamente em branco. Acabou por se decidir por um “olá” acanhado e bastante breve, quase não se atrevendo a olhá-lo nos olhos.
-Peço desculpa… Tendo a ser um bocado desastrada, não foi propositado. – Declarou Yuu por fim, aproximando-se da cama de Itari enquanto se tentava desenvencilhar do lençol.
Itari apenas anuiu ligeiramente dentro daquilo que lhe era permitido, tentando dizer-lhe que não havia qualquer problema. A ansiedade crescia cada vez mais no seu peito.
Não consigo acreditar que estás realmente aqui… Estarei só a sonhar?Quando finalmente se entendeu com o longo pedaço de tecido, Yuu fixou-o sem saber bem o que deveria fazer em seguida. A sua cabeça era, de momento, uma enorme nuvem de poeira confusa e densa demais para a deixar ver fosse o que fosse. Esforçava-se a todo o custo por desviar o seu olhar do de Itari, fingindo ainda estar entretida com o lençol e tentando esconder o leve rubor rosado que lhe começara a surgir nas maçãs do rosto.
-Tenho-me perguntado onde andavas… - Acabou Itari por dizer finalmente, mal sabendo como arranjava coragem ou força em suficiência para lhe dirigir a palavra. – Ainda tenho o teu cachecol.
-O meu… Ah, sim, o meu cachecol. – Yuu tentou parecer o menos afectada possível, enquanto atirava com delicadeza o lençol de volta para a cama de Itari. Não sabia que mais poderia fazer para se manter “ocupada”. Havia-se esquecido por completo do cachecol. O adereço e todas as memórias a ele associadas sempre lhe haviam sido necessários a toda a hora, como uma qualquer estranha forma de dependência. De alguma forma, nada disso parecia ter a mínima importância agora. – Sem problema. Pode devolver-mo mais tarde.
Itari recostou a sua cabeça nas almofadas e fechou ligeiramente os olhos enquanto Yuu se inclinava para o aconchegar novamente com o lençol que lhe havia arrancado há momentos. Apesar de ainda fraco, de visão turva e com os pensamentos algo confusos, Itari tinha perfeita noção do quão próximos estavam, e de como nunca antes uma rapariga se atrevera a aproximar tanto dele.
-Confortável? – Inquiriu Yuu amistosamente, com um leve sorriso, ainda tão próxima dele como antes.
Itari sentiu um solavanco estranho no seu estômago que agora parecia borbulhar com ansiedade, e anuiu atrapalhadamente. Sabia no seu íntimo que, se estivesse em condições para tal, teria fugido dali o mais rapidamente possível. Estar assim tão próximo de Yuu, ainda para mais quando se encontravam os dois sozinhos, criava nele um misto de ansiedade e pânico. Não sabia o que poderia esperar nem o que iria aconteceu, e receava que Yuu estivesse apenas a alimentar-lhe esperanças completamente falsas, mesmo que inconscientemente. E o mero pensamento de que
algo pudesse acontecer…
-Estou… A sonhar? – Perguntou Itari, olhando Yuu fixamente de modo intenso. De algum modo, ela parecia-lhe imensamente diferente da Yuu que ele recordara durante aqueles longos meses de percalços e solidão em Kumo…
-Sonhar? – Yuu sentiu uma onda de calafrios percorrerem-lhe a espinha. A intensidade do olhar de Itari causava-lhe arrepios estranhos, não propriamente desagradáveis. De cada vez que tentava desviar o olhar, via-se ser novamente arrastada para o profundo azul dos olhos dele.– Não propriamente… Julgo eu…
A mesma vontade que a invadira há alguns meses atrás voltou a assaltá-la. Sentia-se impelida a aproximar-se mais, talvez atrever-se a tocá-lo… Pela primeira vez em toda a sua pacata existência, desejava desesperadamente ultrapassar por completo todos os preceitos que a impediam de tais contactos com outro ser humano. Deixou-se ficar a contemplar por completo o rosto de Itari durante alguns momentos, enquanto este continuava a olhá-la nos olhos fixamente, o seu rosto sério e imperturbável, como se nada mais no mundo importasse. A jovem sentiu as suas pálpebras cederem ligeiramente, enquanto se deixava invadir pelo êxtase da suave respiração dele, agora a uma distância incrivelmente curta do seu rosto. O calor do rosto dele, tão próximo do dela…
Subitamente, o tempo parecia ter parado por completo. Yuu deixara de conseguir pensar, e entregara-se sem receios aos lábios de Itari. Nenhum deles se atreveu a mover-se. E apesar de à distância mais parecer que deixavam os seus rostos descansar na boca do outro, os lábios de ambos, ainda que imóveis, não poderiam ter encerrado uma maior diversidade de sentimentos intensos.
Após aquilo que haviam parecido horas, Yuu acabou por tomar a iniciativa e quebrar o beijo, não conseguindo afastar-se demasiado do rosto de Itari. Tão depressa quanto havia parado, a jovem beijou-o novamente. Não se conseguia controlar, nem tão pouco queria conter o que quer que fosse. Não o podia explicar, e certamente Itari também não o poderia fazer: mas, de uma forma inexplicavelmente ridícula, Itari havia-lhe deixado uma marca demasiado profunda na alma após a breve conversa em Konoha. Mal se conheciam. Tudo o que partilhavam eram uns breves segundos de conversa separados deste novo encontro por uma exorbitante quantidade de meses, um cachecol velho... E agora aquele beijo.
Foi quando a mão direita de Itari se pousou no fundo das suas costas que Yuu sentiu as borboletas que até então lhe vagueavam pelo estômago perderem todo o controlo que ainda possuíam sobre si. A jovem pressionou ainda mais o seu corpo contra o de Itari, aprofundando ainda mais o beijo sem se aperceber disso, e agarrando-se aos cabelos negros do rapaz. Sentia-lhe agora com toda a clareza o corpo frágil, a respiração que ficava cada vez mais ofegante, e um leve odor salgado, mas viciante, que se soltava da pele dele.
Yuu apenas se deteu quando sentiu as mãos de Itari deslizarem impotentes e sem força de volta para o colchão, acompanhadas pela perda de reacção dos seus lábios. De início não deu grande importância ao assunto: assumira que ele apenas estava demasiado cansado para continuar a retribuir o gesto que ela tão efusivamente lhe oferecia. Mas alarmou-se quando sentiu a respiração dele ficar cada vez mais fraca.
-Itari… - Yuu afastou o seu rosto do do rapaz, entreabrindo os olhos para verificar como é que ele estava. Alarmou-se quando constatou que o rosto dele se encontrava praticamente descaído em impotência e que ele já quase não respirava.
O que se seguiu ficou gravado na memória de Yuu como uma mancha confusa. Apenas se lembrava de ter berrado o nome de Itari, numa tentativa desesperada de o tentar acordar. Supôs que os seus berros haviam atraído o pessoal do hospital, porque segundos depois estava a ser posta fora do quarto por uma enfermeira, enquanto uma azáfama de indivíduos cobertos com batas brancas entrava pelo quarto adentro. Minutos depois um médico acabou por sair do quarto e pediu-lhe que se acalmasse, e que esperasse por mais notícias no corredor.
Obediente, Yuu sentara-se algures pelo corredor e aguardava agora que alguém se dignasse a dizer-lhe o que se passava. Tentava a todo o custo acalmar-se, mas não o conseguia fazer. Não quando se sentia culpada pelo que acabara de acontecer.
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Primeiro filler em muito tempo ;__;