Aquela manhã especificamente estava mais quente como de costume na Vila da Areia. Era o intervalo da academia e dezenas de crianças brincavam na rua da frente sem comprometimento como a idade lhes permitia, quando Daisuke se separou do grupo de meninas que o paparicava com conversas picantes. A companhia estava agradável, mas o garoto precisava parar para pensar um pouco. A possibilidade de se tornar um ninja agora era real, pois em breve estaria completando o curso. Entretanto, a proposta recente de seu pai para que ele começasse a aprender o ofício de gerência nos restaurantes da família também lhe parecia bastante atraente.
Se aprofundando nesses pensamentos enquanto caminhava sob a brisa quente da metade da manhã, Daisuke fingia prestar atenção em seus passos que deformavam a fina camada de areia sob o chão escuro de pedras do pátio frontal da escola-ninja. "Não me imagino sentado atrás de uma mesa." - Ele sussurrava após mais um passo quando sua atenção se voltou para algum movimento vindo de sua visão periférica. Estava acostumado com essa reação, afinal, um garoto com sua atitude possui muitos inimigos, e graças a isso aprendeu a confiar na sua visão lateral. Acontecia alguma coisa no beco quando passou distraído. Com as mãos nos bolsos, ele recuou dois passos para dar uma olhada no que se sucedia quando ouviu o eco de um gemido e logo o som do choque de algumas latas de lixo no final do estreito corredor.
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Dê-me o dinheiro do lanche! - Gritou o garoto, de forma ameaçadora. Com um sorriso sarcástico no rosto, Daisuke reconheceu quatro garotos veteranos que não iriam se formar por terem fracassado nos testes iniciais. Eles cercavam um garoto franzino e catarrento que de tão pressionado parecia fazer parte da parede amarelada do fundo do beco. As latas de lixo ainda balançavam pelo empurrão que o maior dos quatro dera no menino que agora agonizava para tatear os bolsos com o rosto desesperado. "Mas que idiotas!" - Ofendeu-se o loiro. Convencido de que precisava fazer alguma coisa, ele entrou no beco em silêncio, mantendo as mãos ainda nos bolsos até chegar há alguns metros do grupo.
Nesse momento a vítima da extorsão já o olhava com súplica enquanto os quatro perceberam sua aproximação. Com os olhos fumegantes, o robusto líder dos quatro fitou Daisuke e sorriu. Para o delinquente, o estratagema da "guerra fria" que travavam pelo comando da academia seria aquela ocasião. -
Infelizmente você está em menor número! - Comemorou o sujeito. Sem responder a provocação, Daisuke os viu se aproximar e a luta foi inevitável. Socos, chutes, esquivas e pontapés derrubavam as latas de lixo e sangravam as paredes do beco com gritos e gemidos tão altos que alguns estudantes já começavam a se amontoar na outra extremidade da viela para assistir ao espetáculo aterrador quando tudo ficou em silêncio.
O garoto franzino havia se urinado ao testemunhar a luta feroz. Ainda recostado na parede, ele conseguia ver apenas Daisuke de pé, apesar de muitos hematomas e sangue que escorriam pelo seu nariz. Dos outros estendidos no chão, apenas um parecia estar em condição de rastejar para fora do local. Enquanto isso, professores tentavam atravessar a turba de alunos que terminava de assistir a luta, desesperados para saber o que acontecia ali. Já no beco, Daisuke estava de joelhos e se levantou com dificuldade olhando fixamente para o menino catarrento que enxugava as lágrimas com a manga do uniforme e se lambuzava todo no processo. "Nojento." - Pensava o loiro à medida que mancava na direção do pobre garoto que já se sentia seguro e agradecido por ter sido salvo por um novo colega de turma que conheceu num momento difícil. Ele queria agradecê-lo do fundo de seu coração, mas sua alegria terminou quando viu o loiro se aproximar e estender a mão com grande seriedade, dizendo: -
Dê-me o dinheiro do lanche. -
A... A... Aqui está. Eu me chamo Makoto. - Falou o garoto, estendendo algumas notas para o defensor.
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Ei Daisuke! Acorda! Como vamos entrar lá?! - Exclamava o garoto magro para seu amigo que acabara de ficar parado enquanto se escondiam. Daisuke acabara de se lembrar de como ele e seu fiel escudeiro se conheceram. Eram momentos mais simples, e agora os dois estavam nos preparativos da maior vingança de suas breves vidas. "Aquele professor vai se ver comigo!" - Sussurrou numa forma de se concentrar no que fazia. Olhando em volta, o loiro vislumbrou alguns baús vazios que estavam empilhados do lado do abrigo das ervas, onde encontrariam aranhas suficientes para assustar o professor. Apontando silenciosamente para o local, Makoto sorriu com sua ideia simples, mas eficaz que lhes dariam uma desculpa perfeita para entrarem no depósito. Os dois logo se esgueiraram por entre as centenas de caixotes e escolheram um grande baú, começando a cambalear com caras sérias como se estivessem ali por força de suas obrigações.
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Onde vocês vão? - Perguntou um dos ninjas de guarda na entrada da caverna.
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É nossa última tarefa para a formatura. - Mentiu Daisuke de forma convincente.
O chuunin não estranhou a situação, já que as vezes alguns candidatos à gennins os ajudavam na manutenção dos estoques para ganharem créditos e passar de ano. -
Muito bem, passem. - Comandou o homem, com certo grau de impaciência e cansaço. Logo os dois garotos deixaram a luz do sol da tarde e sumiram na escuridão da caverna principal, onde o cheiro das ervas era bem acentuado e a escuridão era apaziguada apenas por algumas tochas que circundava a grande câmara central. Lá dentro, centenas de ervas eram desidratadas sob algumas mesas enquanto centenas de baús iguais àquele que eles carregavam estavam abertos e vazios. -
Muito bem. Vamos procurar. - Sussurrou para Makoto se perdendo entra as mesas de desidratação. Daisuke fez o mesmo. Seu coração batia forte e ele sorria de forma maquiavélica enquanto puxava algumas plantas e remexia nos baús ainda com conteúdo a procura dos insetos. Na verdade, era uma tarefa bem fácil, pois assim que o loiro remexeu o primeiro baú, dezenas de filhotes aracnídeos saltaram para a superfície.
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A vingança está quase pronta. Muahahahahaha! - Animou-se com grande expectativa.
CONTINUA...