Sentia medo. Cada vez estava mais apavorada por estar ali. As vozes cada vez se aproximavam mais. Tentei não começar a chorar, mas acho que era impossível naquela situação. Senti os meus olhos a ficarem quentes, a medida que o tempo ia passando as lágrimas começavam a descer. Não era algo que pudesse controlar naquele momento. Era tudo tão estranho. Tentei também controlar a minha forte e ofegante respiração, mas não dava. Não conseguia.
As tais pessoas aproximaram-se da cabana e começaram a falar.
- Deixaste a porta aberta ontem? – Perguntou a voz feminina, devia ser uma mulher.
- Não! Juro que não! – Disse em tom de defesa. Desta vez era uma voz masculina.
- Eu também não. Algo me está a escapar. – Disse, fechando a porta. – Vamos embora. Amanhã transferimos os corpos de sitio e abandonamos esta cabana.
- Mas e se alguem descobrir? - O seu tom mudou para um tom de medo.
- Ninguem vai descobrir. – Riu-se.

As vozes foram ficando menos audíveis a cada passo que as pessoas davam. Eu conhecia uma das vozes, juro que conhecia. Mas de onde é que era impossível lembrar-me.
Tentei ficar mais calma, mas a escuridão assustava-me imenso. Depois de ter a certeza que os donos daquela cabana se foram embora, sai debaixo da mesa.
As minhas pernas tremiam, tinha constantes arrepios e sentia-me mal disposta. O cheiro a sangue era intenso. Só queria sair dali e talvez despertar o meu lado curioso pela manhã, antes que aqueles dois voltassem aparecer. Com uma mão no nariz abri a porta e sai. Desta vez não me esqueci de fechar a porta.
Cada vez estava mais escuro então comecei a correr floresta a fora. Até conseguir chegar a casa. Talvez estivessem preocupados comigo, talvez não.

Cheguei totalmente cansada a casa. Apoiei as minhas mãos nos joelhos flectidos. A minha respiração estava tão rápida, que acho que se podia ouvir de dentro de casa.
Quando me consegui acalmar, entrei em casa. Abri a porta e dirigi-me para o quarto, mas alguém me interrompeu.
- Então miúda, onde andaste? – Perguntou o marido da Sr. Amaya.
- Hm, estive com amigos e assim. – Menti.
- Ambos sabemos que não tens amigos. – Riu-se.
Comecei a ficar irritada, mas o que mais me irritava é que era totalmente verdade. Eu não tinha amigos. Sobretudo dos verdadeiros.
- Conheci hoje, há problema? – Olhei em direcção do chão.
- Claro que não. Porque estás cheia de sangue? Tens jantar na cozinha. Vai comer. – Só me mandava fazer coisas! Até mesmo comer.
- Ah, nada. Aleijei-me apenas. Ok, vou já. – Dirigi-me à cozinha.
Quando entrei vi a Sr.Amaya sentada na mesa. Olhou para mim com um olhar daqueles que se tivesses balas me poderia matar, sem duvida.
- Ah… Hm… Vinha só comer. – Sorri.
- Claro. Está ai. – Sorrio e eu sentei-me e comecei a comer. – Precisamos de falar sobre o que viste hoje.
- Eu? Eu não vi nada. – Comecei a comer mais rápido. Só que ir para o meu quarto.
- Minha menina, não mintas. Só preciso que prometas que não contas a ninguém. – Agarrou-me o braço fortemente.
Olhei para o meu braço e tentei larga-lo a modos que consegui.
- Ok! – Gritei. Levantei-me e corri para o quarto.
Quando cheguei ao quarto, mandei-me para cima da cama. Como sempre, comecei a chorar. Mas, depois de me aperceber de que as minhas roupas estavam cobertas de sangue, levantei-me e limpei os olhos. Dirigi-me a casa de banho, despi-me e tomei banho.

***
Basicamente, não consegui pregar olho a noite toda; A memória dos corpos que vi, juntara-se a memoria do corpo morto da minha irmã. Estava assustada com tudo o que estava acontecer. Não é normal ir passear e encontrar corpos mortos numa cabana. Quer dizer acho que estava mortos. Por isso mesmo, levantei-me, vesti-me e sai pela janela.
O dia estava a nascer. Sentia a brisa fresca a passar-me pela cara. Suspirei. Era agora ou nunca.
Corri para a floresta. Enquanto corria, cada vez mais me lembrava dos corpos, cada vez mais me lembrava da minha irmã. Com toda a certeza, que ainda não tinha ultrapassado a morte dela. Também não era fácil.
Finalmente tinha chegado a pequena e velha cabana. Suspirei outra vez. Olhei para os lados para ver se alguem tivera chegado primeiro que eu, mas não. Nenhum sinal de alguém.
Abri a porta. Esta chiou. Empurrei-a lentamente. O cheiro a sangue penetrou o meu nariz. Quase que vomitei. Tentei-me aguentar e eu sei que conseguia.
Caminhei para junto da mesa. Passei o dedo na bancada. O sangue não era fresco como se fosse de ontem, mas de alguns dias.
Cada vez o dia ficava mais claro e isto era bom, dava-me mais visão. Fui ver dos corpos que eu tinha visto. Fiquei estupefacta. Eram eles. Estavam ali. Estavam mesmo ali! Senti felicidade. Mas ao mesmo tempo tristeza. Estavam demasiados torturados. Pareciam cansados.
Cheguei-me ao pé dos corpos sem saber o que fazer. Tentei reagir mas não conseguia. Estava em choque.
Não podia acreditar que eram mesmo eles. Os meus pais. Há tanto que queria saber por onde andavam e porque me tinham abandonado.
Estavam ambos deitados em tapetes pretos. Será que tinham sido torturados durante anos? Mas isso não tinha lógica nenhuma.
Levei a minha mão à face do meu pai. A barba estava enorme. Toquei-lhe. Que felicidade de os poder ver e ter comigo.
Estava vivo! O corpo dele estremeceu. Notava-se que estava fraco. Nunca pensei que alguem pudesse fazer algo assim.
Ouvi barulhos.
A mulher ria-se e ouvia a dizer:
- Vamos levar os corpos daqui para fora. E Já te disse que não os quero matar, quero apenas tortura-los lentamente. Isto mal começou.
- Está bem. – Abriu a porta da cabana.
Rapidamente fugi para debaixo da mesa. Estava lixada. Não tinha por onde sair. Ia ser descoberta.