~ Saga Ninja de Mitsukubane Kou ~
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L i n c e
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Capítulo I - Biblioteca Vazia (Primeira Parte)
“Era a Lince. Ela me encarava com tanto fogo no olhar que eu me senti até intimidado. Parecia que eu estava a invadir seu território, roubando sua comida e matando suas crias. Por que aquela garota era assim? Não saberia dizer nem no meu melhor palpite. Mas não gostava da situação. Não costumo provocar tanto ódio em uma pessoa quanto parecia provocar nela. Foi quando a kunoichi tirou da bolsa que carregava na cintura uma kunai – a mesma com a qual me atacara. Coloquei meu braço em frente à Yumi, protegendo-a, e saquei a minha em reflexo. Observei-a, atento, mas a única coisa que mudou foi sua expressão, transformando-se em uma carranca de completo escárnio.”
– Não precisa temer, menino idiota. Não farei mal algum a você. Não aqui neste ambiente. – e riu, passando sua arma em uma caixa que estava lacrada atrás do balcão, violando-a.
– Você ainda não me disse seu nome. E está é a segunda vez que nos encontramos. Poderia me dizer? – disse Kou, sorrindo levemente. Era ingênuo demais para se portar como gente grande numa situação dessas. Mas aquilo, de certa forma, era bom.
– Isso não é necessário. Não vejo benefício nenhum.
– A mim teria, não? Conheceria-te melhor.
– Não faço questão disso. Agora me diga, o que veio ver aqui? – indagou, ríspida.
– Vim ver se é possível encontrar aqui a coleção deste livro. – respondeu o menino, deixando passar toda a ignorância com a qual a Lince o tratava. Depositou o exemplar na mesa.
– Hum... Vejamos. “Flores Aquáticas com Propriedades Curativas e Efeitos Analgésicos, vol. II”. Que chato. É um ninja médico? – perguntou, folheando o objeto.
– Sou. Ou melhor, pretendo ser.
– Argh, que nervoso. Ninjas médicos são pesos mortos. Não tem nada de especial e existem aos montes. Ficaria surpreso da quantidade existente deste tipo de onde eu venho. Só desses que brincam com florzinha tem uns dezessete.
– Não é verdade! Minha mãe é uma ninja muito incrível! – retrucou Yumi, entrando na conversa.
– Se você acha isso, garotinha, não a culpo. Deve ser coisa que esse seu irmão afeminado pôs na sua cabeça – respondeu a maior, começando a sorrir – Se queres saber, eu te falo: deveria se tornar uma eximia espadachim. Mulheres podem cravar uma espada num coração tão bem quanto um homem. São superiores a eles em tudo.
– Mas eu não perguntei. – retorquiu a pequena, cruzando os bracinhos, surpreendendo Kou e fazendo Lince erguer as sobrancelhas.
– Gostei de você, menina.
– Ahn... – interrompeu o genin – Os livros, por favor?
– Argh, como você me estressa. Vem, siga-me. – e ela pôs-se a andar. Caminhou por dois corredores, virou à esquerda e subiu dois lances de escada. Chegando lá em cima, moveu-se por mais alguns metros até chegar numa estante empoeirada repleta de livros sobre Botânica Medicinal. – Pode se afogar na sua monotonia e viver sua vidinha chata. E quanto a você, pequena – fez uma pausa, curvou-se e beijou a testa de Yumi – apareça qualquer dia desses num treino meu. Ensino-te a usar facas. – e saiu, deslizando seus pés para longe dos dois. Kou reparou que ela não fazia som algum enquanto andava. Achou aquilo admirável.
– Ela é durona – comentou a garotinha.
– Ela tem problemas... Mas me intriga de certa forma – confessa Kou.
– Me leva em um treino dela? Por favor, por favor, por favorzinho!
– Melhor não, Yumi. Ela pode ser perigosa.
– Mas aí eu tenho você para me proteger, como sempre! – falou sorrindo, inclinando a cabeça para o lado esquerdo. Ela sabia como tocar o coração do genin.
– Está bem, mas você vai ter que mostrar que está merecendo, okay?
– Hai! – confirmou a pequena – Agora vem, vamos olhar as flores!
A tarde passou numa velocidade considerável. Os irmãos ficaram sentados a uma mesinha de madeira roída, perto de uma grande janela pela qual se podiam ver alguns moradores passar, a observar os tais livros. Kou mostrava a mais nova algumas noções medicinais básica, enquanto parafraseava os comentários do autor da obra, indagando certos argumentos e maquinando algumas teorias. Mas Yumi só prestava atenção nas figuras.
Uma vez ou outra, o genin parava seu pensamento para observar Lince, que por vezes ia até o andar mexer em alguma estante ou recatalogar outros livros. Ela o observava por cima dos ombros, mas isso se passava imperceptivelmente.
Quando a lua começara a aparecer no céu banhado de laranja e rosa, Kou achou que era melhor voltar para casa. Colocou os livros novamente na estante e desceu os lances de escada, levando Yumi pelas mãos. Ao passar pelo saguão, deparou-se com a ausência de Lince. Em um dia qualquer seguiria normalmente seu curso para casa, mas aquela garota o instigava demais, fora que tinha que registrar os livros que levaria. Deixou sua irmã ali e caminhou para dentro novamente. Procurou por entre as estantes, fazendo o menor barulho possível. Resolveu seguir por um corredor mal iluminado, ainda com os livros em mãos, até se deparar com uma mesinha escondida. Lá estava a garota. Estava mexendo em algo... Algo que parecia um... Tabuleiro? Havia alguns bonecos também. Acabou denunciando sua presença ao esbarrar em uma pilha de caixotes ocultos pela falta de luz. A garota escondeu rapidamente o conteúdo numa caixa qualquer e veio pisando fortemente em direção a Kou.
– Não há nada que precise ver aqui. Deveria ter esperado no saguão, moleque. – lançou, séria. Pegou o garoto pelas ataduras amarradas no braço direito e o arrastou até a porta. – Devolva-os daqui a quatro dias, sem falta. – E fechou a porta da Biblioteca na cara dele. Yumi o aguardava no lado de fora.
– O que houve, irmãozão?
– Nada. Vamos para casa, mamãe deve ter feito algo gostoso para nós. – falou, sorrindo.
***
Quando a noite entrara de vez, mergulhando na madrugada, Kou estava ainda acordado em sua cama. Fitava o teto perdido em seus pensamentos. Por mais que quisesse, não conseguia dormir, então havia desistido. Conseguia pensas apenas na garota da Biblioteca. No jeito que ela o encarava. Aquilo não poderia ter causado tanto efeito, afinal, só tinha visto Lince por duas vezes. Mas era incontestável que a mesma havia roubado-lhe o sono. O genin então foi dominado por uma vontade de vê-la mais uma vez. Não faria mal.
Decidiu observá-la enquanto treinava no dia seguinte.
***
Acabara por cochilar e despertou com alguns feixes de luz solar tocando sua face. Levantou-se um pouco mais rápido que o habitual, tomou uma ducha gelada, vestiu-se e desceu. Como costume, sua pequena estava lá, sentada no chão da sala, a se distrair com alguns brinquedos.
– Hey, Yumi, quer ir treinar hoje?Levo-te para ver aquela garota durona – propôs Kou, empolgado.
– Sim, sim, vamos! Deixe-me pegar minhas armas – comentou a pequena, levantando-se, deixando o garoto um pouco curioso. Subiu as escadas. Demorou um ou dois minutos e desceu de lá com uma caixinha em mãos – a qual carregava uma cruz vermelha na parte de cima – e um saquinho com algumas bolinhas dentro.
– O que é isso? – indagou o mais velho.
– Meus itens de cura e minhas bombas de fumaça super potentes! – gritou a menina, sacudindo os itens no ar. Kou apenas riu. Ela havia falado com tanta confiança, como se fosse para um treino de verdade.
– Então venha, vamos correr muito! – falou, oferecendo as costas para a pequena, que subiu. Despediu-se de sua mãe e seguiu dando imensos passos, com o corpo inclinado para maior velocidade, para os campos gramados, onde veria Lince novamente.
Depois de algum tempo correndo conseguiu avistar a silhueta imponente da garota. Ela lutava novamente com um de seus clones, kunai contra kunai, numa dança bela de se ver. Kou foi se aproximando mais devagar, colocou Yumi no chão e segurou sua mãozinha. A pequena, por sua vez, gritou pela kunoichi.
– Ei, moça! Eu vim como você havia pedido! – falou, sacudindo os bracinhos no ar. Lince então finalizou seu clone com um chute bem nas costelas e olhou para direção dos irmãos. Acenou de volta, com um fraco sorriso no rosto, e sugeriu que a pequena se aproximasse.
– E então, quer aprender a jogar facas? – indagou a mais velha, ignorando Kou.
– Sim, vamos! Vem, irmãozão! – a pequena foi caminhando na frente. Quando Kou ia segui-la, Lince o segurou pela gola da camisa e o puxou para perto de si.
– Se tentar bisbilhotar minhas coisas mais uma vez, eu te parto em dois. – e largou.
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