Angústia
~ Saudades, confusão e desânimo ~
Ao chegar ao seu quarto, ruborizada pela corrida e pelo beijo de Yuu, Ayame não teve coragem de abrir a porta e deixou-se escorregar por ela. Estava demasiado nervosa com tudo aquilo. Fora apanhada de surpresa por ele, descobrira que ele estivera, possivelmente, a espiá-la todo aquele tempo, e ele ainda a beijara, admitindo os sentimentos dele por ela. Não sabia o que haveria de sentir. Por um lado, sentia a raiva por ter confiado numa pessoa que não tinha tido a coragem de lhe revelar a identidade. Por outro, sentia embaraço por não ter reparado, tanto na espionagem, como nos sentimentos dele. Fugira da situação como uma covarde. Mas ninguém a julgaria pelas suas acções. Ela estava muito confusa.
Acabou por colocar a cabeça entre as pernas para se acalmar e respirar pausadamente antes que perdesse o controlo. Odiava quando ficava tão nervosa e ficava sem saber o que fazer.
Apesar de ser um pouco contra a sua personalidade e contra aquilo que acreditava, Hikaru, o primeiro dos seus guardiões a aparecer junto dela, ofereceu-lhe o seu ombro para desabafar. Preferia manter alguma distância, até porque eram professor e aluna, e porque Kazuma, o seu melhor amigo, o tentaria matar se ele algum dia tocasse na jovem de cabelos cor de mel.
Quando Kazuma se aproximou, a jovem desabou, agarrando-se aos braços fortes do irmão que sempre a protegera. Era demasiada pressão nela. Sentia saudades da família e, ao mesmo tempo, necessidade de a proteger. Era por eles que fizera o sacrifício de assumir o seu papel enquanto neta dos Sakuragi. Odiavam-na sem razão nenhuma, usando o argumento de kekkei genkai ser impura e uma mutação indesejável. A pessoa em quem ela acreditara revelara-se um impostor, traindo assim a confiança dela, para logo a seguir a beijar. Ela não desejara aquilo; ela não pedira aquilo. Ela apenas queria voltar a ser Ayame Midori, filha de Nadeshiko e Seishirou Midori de Konohagakure. Se não fosse Kazuma e Hikaru, provavelmente não teria aguentado até aquele momento.
Para a ajudar a reconstruir a sua confiança, resolveram voltar a Konoha temporariamente, nem que fosse para ver a família e voltar no dia seguinte. O amor dar-lhe-ia novamente a confiança que ela sempre teve.
Durante a viagem, a jovem parecia até irrequieta com o momento do reencontro. Era tudo o que ela precisava. Por isso, a bela paisagem entre a floresta nada significou para ela. O perfume das flores, o calor da aragem, a alegria dos animais naquele tempo solarengo. Nem isso a fizera distrair-se e ela adorava aqueles momentos. Só queria abraçar Yuriko, a mãe, o pai. Toda a família. Sentira até saudades dos padrinhos, de todos aqueles que pertenciam à família e tinham estado presentes no momento da despedida.
Não surpreendeu ninguém quando chegaram a Konoha e Ayame se lançou nos braços dos pais, emocionada, abraçando Yuriko logo de seguida. Se havia algo que a fazia lutar até ao fim, até ao último suspiro, era aquela pequena de olhos verdes que amava com todo o seu coração. Foi até ao hospital visitar o padrinho, Ren, que estava de serviço; foi a casa da avó, ao escritório da tia e da madrinha, ambas nos esquadrões da ANBU. E partiram pela manhã, na qual Ayame acordou com outro ânimo. Estava finalmente de volta a ela mesma.
Quando chegaram a Cha no Kuni, foram informados que tinham sido convocados à mansão do Daimyou novamente para uma reunião de esclarecimentos e sorteio de batalhas, que se realizaria no dia seguinte. O torneio estava prestes a começar.
A mansão do Daimyou estava mais vazia naquela tarde. As famílias tinham-se abstido de convidar pessoas externas seguindo também as instruções dadas e assim reduzindo o número ao mínimo necessário. Aquela sessão era unicamente para quem iria participar no torneio e os seus familiares mais próximos, apesar do torneio ser à porta aberta.
As famílias tinham-se juntado em grupos, preferindo manter a intimidade familiar. A tensão era grande, o nervosismo também. Apenas alguns presentes cumprimentaram Ayame quando esta entrou com o seu irmão e o seu sensei. As irmãs Akemi e Naomi pareciam um pouco empolgadas por a ver, algo que aqueceu o coração da konohanin. Yuu olhara para ela de relance e voltara-se para a frente, evitando confronto directo com os olhos dela. Aquele momento era ainda muito fresco.
Ouviu-se um resfolegar para chamar a atenção e os olhares foram dirigidos para essa pessoa. Era o Daimyou de Cha no Kuni, vestido em roupas ornamentadas, algo que seria de esperar daquele que assumiria um papel fundamental naquele dia.
- Boa tarde – iniciou ele. Apenas se ouviram algumas respostas ao seu cumprimento, pelo que ele continuou. – Como sabem, vai iniciar-se mais um torneio das famílias da Kugeka. Julgo que é escusado estar aqui a referir os propósitos dele, visto que todos vós sabeis para o que aqui estão e a implicação disso para as vossas famílias – ele pigarreou antes de continuar. - O torneio é de eliminação única. Cada família será representada pelo número de descendentes elegíveis para os combates. O sorteio vai ser feito hoje para que todos possam assistir.
Um burburinho começou a surgir na sala, trazendo consigo ainda mais nervosismo. Os corações de alguns saltavam até algumas batidas de vez em quando. Todos sabiam quem queriam evitar. Mas tinham que dar o seu melhor. Poder decidido por jogos era melhor que decidido por guerras.
Um empregado surgiu com uma tômbola e uma maleta com oito bolinhas transparentes, cujo conteúdo parecia ser um papel que representava cada uma das famílias. Retirou-as do seu suporte e colocou-as na tômbola, retirando-se logo de seguida.
O Daimyou mexeu as bolinhas com as mãos e retirou uma delas do interior da grande taça.
- Fujishima.
A tensão intensificou imediatamente. Yuu era um dos adversários mais poderosos no torneio.
Foi retirada uma nova bolinha e revelada a sua identidade:
- Ibara.
Todos olharam para Satomi e Riku, surpreendidos. Os dois irmãos, ambos chuunin, estavam amedrontados, apesar de não quererem demonstrar. Tinham a derrota praticamente garantida.
O Daimyou voltou a pigarrear, com uma nova bolinha na mão, e, quando todos olharam para ele, continuou com o anúncio do segundo combate:
- Renge.
Noboru era um dos principais candidatos à vitória. Qualquer um que calhasse com ele não iria ter a vida facilitada, mesmo que fosse um dos outros candidatos reconhecidos com maior potencial.
- Kikuchi.
Ayame apertou a mão do irmão quando ouviu o apelido de Rina. Tinha vontade de se levantar e terminar logo com aquilo. Mandar dois berros, gritar, acabar com toda aquela farsa. Rina iria ter que lutar contra quem amava. Apesar de ser também muito forte, era injusto ter que se lutar contra alguém por quem se nutre sentimentos do género. Era um dos combates mais complicados por duas razões: poder e sentimentos.
- Acalma-te, Ayame. Isto é mesmo assim… - murmurou Kazuma, acariciando-lhe a mão para lhe transmitir alguma da sua calma quase inabalável.
Ela simplesmente abanou a cabeça e resignou-se, pensativa. Não estava sequer atenta quando o nome seguinte foi chamado.
- Sakuragi.
Aquela voz soou como um badalo na cabeça da jovem chuunin, que imediatamente se endireitou. Olhou para Kazuma e logo de seguida para Hikaru, nervosa. Não queria ouvir o que se seguia. Engoliu em seco.
- Umehara.
Shirou. Ayame e Kazuma iam ter que enfrentar Shirou, o mesmo que a ameaçara durante a reunião anterior e se atrevera a deixar a sua marca no pescoço dela. O kirinin olhava para eles, com um sorriso cínico nos lábios. Ele sabia que conseguia fazer jogo psicológico para o combate ser dele. Ela, principalmente, era bastante vulnerável a isso e o irmão dela parecia ser do tipo que faria tudo por ela, pela irmãzinha mais nova. Seria um combate oferecido de bandeja.
O combate que restava estava assim decidido. Os Himawari contra os Yurioka, outro combate que, na teoria, estava igualmente decidido. Yuji, por si só, conseguiria lidar com os Yurioka sozinho e em questão de minutos.
Apesar da tensão ainda na sala e do desconforto de alguns, as famílias seguiram com a tradição de cumprimentarem os seus adversários. Ainda que os Midori não quisessem, não o fazer era quase como declararem guerra de imediato. O jogo tinha que ser jogado. Por isso, quando Shirou se aproximou, não se afastaram. Apertaram as mãos relutantemente, um gesto que irritou os três. O sorriso de Shirou era, no mínimo, perturbador. Foi então que ele tomou a iniciativa de se afastar, mas não sem antes se despedir, esboçando novamente o seu sorriso logo de seguida:
- Vou acabar com a vossa raça.
Ali o mundo gelou.
- Spoiler:
Desculpem, desculpem. Ainda tenho um filler muito fresco. Mas estava tão empolgada com este final que não resisti a postar já hoje