AMBIÇÃO SEM LIMITES
As pesadas gotas de chuva atiravam-se com grande ruído contra a vidraça do seu quarto naquela noite. Apesar da tempestade que caía do lado de fora, parecia que um furacão tinha ocorrido dentro de seu cômodo. Móveis virados e revirados. Roupas espalhadas e brinquedos quebrados. Já no teto, o pequeno lustre pendia de uma lado a outro com algumas rachaduras pela pancada que levara, o que ocasionava pequenos flashes da lâmpada que funcionava de maneira intermitente. Ainda pensativo, Noburo estava sentado à beira da sua cama desarrumada em silêncio. Olhos profundos e tensos, acompanhados por extensas olheiras, o jovem não conseguia dormir bem desde que fora derrotado no exame chuunin.
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Preciso de mais poder! - Desesperava-se a pequena lata de lixo que se espatifou na parede. O gennin agora acabara de se decidir: Ele iria correr o risco de ser pego. Noburo já tinha solicitado sua entrada na câmara-secreta da família algumas vezes, mas por algum motivo que ele desconhecia, o patriarca nunca lhe tinha dado permissão.
Fodam-se! - Pensou, levantando-se rapidamente. Já era hora do clã Uchiha lhe fornecer as ferramentas para ascender. A janela então se abriu, deixando o forte vento gélido invadir o quarto numa enxurrada de gotas que Noburu recebeu em seu rosto. Olhos fechados se abriram com ferocidade enquanto as pupilas giravam para formar os três tomoes. -
Hora de partir. - Disse ao se perder na escuridão.
***
Totalmente molhado, Sazaki Uchiha se ressentia por ter trocado seu horário com o irmão.
Tenho um encontro. Blá, blá, blá. - Lembrava-se da conversa que o convenceu a ser o "Guardião do Segredo" naquela noite chuvosa. Ajeitando-se no único banquinho daquele santuário, o jovem tinha lá seus dezesseis anos e tinha cabelos e olhos negros, apoiando-se na bainha de sua katana, ele ainda estranhava o volume em seu corpo graças ao colete verde-oliva que usava. Sazaki tinha se formado como chuunin no último exame. Muito diferentemente de seu primo. -
Ninguém gosta daquele cara. - Sussurrou na penumbra, sorrindo com um canto da boca ao refletir sobre a grande derrota do outro Uchiha.
Suspirando entediado, aquele era o único pensamento engraçado que o distraía naquele ambiente frio e úmido: O Santuário Uchiha. Aquele nada mais era do que um casebre de madeira antiga e enegrecida, contendo uma grande rocha ovalada que, como um tampão, escondia a entrada da catacumba principal. Era lá onde o segredo do tradicional clã de Konoha guardava seus segredos, apesar de Sasaki não ter a mínima ideia de quais segredos eram esses. Ele tinha curiosidade sim, como todo jovem ambicioso. Mas o olhar poderoso e sério de Sasuke estava marcado em seu inconsciente e no inconsciente de todos os jovens da família.
Esse limite não deve ser ultrapassado. - Foi o que ele dissera na época.
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Que saco! - Sasaki reclamava da vida quando percebeu que morfeu começava a lhe visitar. Juntando as mãos na empunhadura de sua lâmina, ele encostou sua testa para apoiar sua cabeça, sem se importar com o que acontecia aos arredores além do som das goteiras, trovões distantes e seus brilhos repentinos no horizonte. Aquela seria mais uma noite tranquila. Afinal que louco sairia de casa para invadir o santuário Uchiha numa noite tempestuosa dessas? Mas quando estava prestes a cochilar, uma pedra atravessou o tapume lateral, quase atingindo o vigia que, num salto, sacou sua espada aguardando pelos invasores. -
Quem está aí?! - Esbravejou, quando sua audição conseguiu identificar algumas gargalhadas infantis.
Crianças. - Concluiu, decidido a persegui-las para dar-lhes uma lição por desrespeitar o santuário. Seus pés rapidamente ganharam a lama da parte externa na direção dos ruídos. Uma brincadeira de pique-esconde se seguiu. Entre barris que captavam água, parques e jardins que cercavam o local, Sasaki sorria por baixo de sua capa de chuva, ansioso para aplicar os cascudos que ansiava nos moleques e assim "esquentar" a noite. -
Achei você. - Sussurrou ao afastar um dos tonéis de madeira num dos estreitos corredores que desembocavam no pátio principal. De costas para ele, sem qualquer proteção da chuva, a criança choramingava de costas. Agachada no canto, o menino escondia o rosto como se estivesse esperando a pesada bronca.
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Por favor, não me bata. - Choramingava.
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Calma, só vou te fazer consertar o... - Dizia quando a criança se virou.
O rosto fantasmagórico era horrendo. Olhos vermelhos pareciam derreter em sangue, manchando o rosto pálido e cheio de rachaduras putrefatas de onde vermes circulavam em gosmas bolorentas. Seus dentes protuberantes pareciam pequenos objetos pontiagudos e serrilhados por onde uma língua alongada serpenteava na boca ensanguentada. Sasaki não conseguiu gritar. Dando dois lentos passos para trás, seus olhos pareciam grudados na figura que se levantava lentamente ganhando uma altura muito maior que a sua estatura. Braços estendidos, as garras da abominação buscavam do corpo da vítima enquato este já não conseguia mover suas pernas. Seu coração batia forte. suas mãos suadas e o pânico instalados foram o estopim para a visão turva.
Agora perdia as forças.
Será que morrer é assim? - Perguntava-se o inexperiente chuunin que finalmente se abateu no chão lamacento. -
O idiota é muito fraco. - Comemorou Noburo, partindo em direção ao santuário, deixando para trás o corpo inconsciente de seu primo. O ninja estava nervoso, mas tinha certeza de que não haveria mais ninguém no local. Sua entrada seria fácil. Assim, com um simples henge para não deixar rastros, o Uchiha se transformou numa serpente que rastejou para dentro do casebre e desapareceu na escuridão. Agora a sorte estava lançada. Ele agora estava disposto a tomar o poder para si. Ele tinha certeza que este conhecimento lhe daria o Mangekyo.
***
O beco ainda estava escuro quando Sasaki acordou. Sua cabeça latejava como se ele estivesse retornando de uma boa farra. -
Onde estou? - Gemeu tentando apoiar os braços na grama pegajosa pela lama. A tempestade havia passado, deixando apenas as pesadas núvens que eram levadas pelo vento que revelava os primeiros raios de sol daquela manhã no horizonte. De súbito sentiu o cheiro de urina que impregnava seu uniforme, arrancando náuseas de seu âmago. Sentando-se contra a parede, com receio de cair novamente, o ninja tateou com preocupação pelo chão até que se aliviou quando encontrou sua katana em perfeito estado.
O santuário! - Inquietou-se.
Apoiando-se na lâmina, Sasaki cambaleou de volta até o casebre na esperança de encontrar
alguém lá em seu lugar, mas não havia ninguém. Parecia que seu clã ainda dormia. Apertando os olhos sujos, ele procurava pelo buraco feito pela pedra, como se quisesse se convencer que aquilo que ele vira era verdadeiro, mas para sua surpresa, não havia nenhum buraco ou pedra dentro do santuário. Tudo da mesma forma que ele se lembrava.
Estava sonhando? - Perguntava-se, lembrando-se das inúmeras histórias que os mais velhos contavam sobre espíritos malígnos dos mortos que procuravam vingança. Talvez ele fora uma das vítimas. Ou talvez dormira e tivera um pesadelo misturado com um sonambulismo. Não sabia. -
É melhor ninguém saber o que se passou aqui. - Concluía, desconfiado com o baita susto que levara.
CONTINUA...