O telefone tocou. Tsubo esticou o braço e atendeu. Rapidamente percebeu quem era. Era a sua avó, a chorar. Algo de muito grave se passava:
-Podes passar à tua mãe?-Disse a avó, a chorar e a assoar-se repetidamente.
-Sim.- Respondeu Tsubo, ainda sem saber o que se passava.
Passou à sua mãe e foi para o quarto. Deitou-se na cama com uma mão atrás da cabeça e outra a fazer festas a Tomodachi.
-Tomo, passa-se alguma coisa. Alguma coisa muito má.
Ouviu o telefone a ser pousado e seguidamente a sua mãe a chorar. O seu pai aproximou-se da mãe, e passado breves momentos foi ter com Tsubo. Tsubo põe os pés no chão, ficando sentado:
-Tsubo, tenho que te contar uma coisa. O teu avô, faleceu. O funeral é amanhã. Não podes levar o Tomodachi, o único cão que pode estar lá é o do avô, e é uma exceção. A avó vem cá dormir. Não fales do avô, amanhã vai haver suficiente disso. Eu vou buscar a tua avó.
O pai de Tsubo saiu do quarto e este voltou a deitar-se:
-Eu sabia que era algo mau, mas isto é… horrível. Podes subir Tomo, hoje preciso mesmo de ti.
O cão subiu para a cama e passado algumas lambidelas na cara do dono, deitou-se, olhando o dono nos olhos, vendo cada lágrima a formar-se. “Ele era quem me ensinava as técnicas, não sei com quem vou jogar xadrez, não sei com quem vou passar as tardes livres de treino, não sei com quem vou ver o pôr-do-sol. Não sei o que hei-de fazer.” Fechou os olhos e deixou-se cair num sono. Num sono de tristeza, de solidão, de melancolia. Acordou algumas horas mais tarde, com o cão a sair da cama para ir receber a avó, também em lágrimas. Comeram em silêncio, com os olhos a olhar para um horizonte inexistente no prato.
[No dia seguinte.]
Tsubo acordou com os passos na sala. Abriu a porta e viu a avó, quieta, chorando, limpando a camisa de lágrimas. Os anjos choravam também, era a explicação que o seu pai lhe tinha dado para a chuva, quando Tsubo tinha 6 anos. Agora a família chorava também. Reconfortava a avó saber que os anjos ficam tristes com a morte de uma pessoa tão bondosa, como o avô Inuzuka. Tsubo vestiu roupa negra. Assim como o resto da sua família. Saiu de casa, a olhar para o céu, cinzento. A cor companheira do negro, e essa sim, a cor da morte. Foram a pé até ao cemitério, cada um usando um guarda-chuva para não se molhar. A terra transformava-se em lama nas covas recentemente tapadas. A primeira parte do funeral foi dentro de um edifício. Estava um caixão aberto, com o familiar falecido de Tsubo. Tsubo foi prestar a sua homenagem. Falar uma última vez com o seu querido avô. Ao dar um beijo na face ao avô, reparou num corte que este tinha um corte na mão. Devia ter sido em casa, a cortar qualquer coisa. Não ligou muito. O caixão foi fechado, e depois transportado para a rua, com imensas flores depositadas em cima do caixão. Tsubo era um dos homens que transportava o caixão. Ao transportá-lo, reparou que no fundo do caixão, mais ou menos onde estão as pernas acumulava-se um líquido. Não ligou, até cair uma gota deste misterioso líquido no chão. Era vermelho. Era sangue. Tsubo fechou os olhos durante um momento, pensando que estava a alucinar. O que o ia fazendo cair, devido ao cão do seu avô, que seguia junto às pernas dos transportadores do caixão. Depois de pousarem o caixão sobre umas cordas, afastaram-se. Agora diferentes pessoas iam dando corda, deixando cair lentamente o caixão na terra, mais parecida com lama devido à chuva. O resto do funeral foi rápido, deixar flores na terra e olhar para o céu, imaginando o avô Inuzuka subir as escadas para o Paraíso. O funeral acabou e todos se dispersaram. Tsubo seguiu com a família, até ver dois homens, ao longe. Parecia que tinham prestado homenagem, de longe. Ambos vestidos com uma longa capa negra:
-Mãe, eu vou dar uma volta, espairecer um bocado.
-Ok… mas não apanhes frio. Não tires o casaco!
Tsubo assentiu com a cabeça e seguiu, agora sozinho, atrás das misteriosas personagens. Já na rua, os indivíduos apressaram-se. Começaram a dar passadas mais rápidas e maiores. Tsubo apressou-se também, mas quando virou a esquina, atrás dos perseguidos, apenas um estava lá. “Fizeram uma armadilha, e tu caíste que nem um patinho!” Tsubo já só teve tempo de ver o primeiro homem a virar-se. Depois a outra personagem desconhecida pôs-lhe um braço no pescoço encaixando na dobra do cotovelo do outro, que fazia força para trás. Rapidamente desmaiou e foi levado para um edifício abandonado. Acordou com dois homens na sombra da sala:
-És corajoso, dou-te isso- Disse o primeiro. Era alto, não muito musculado, com o cabelo negro.
-Não sabes o que enfrentas, não abras portas que não consegues fechar!- Este sim, era musculado. Cabelo loiro, mas baixo. Era uma mini caixa cheia de músculos, pronta a abrir descontroladamente:
- E se eu vos seguir?- Respondeu Tsubo.
-Não conseguirias, e mesmo assim, putos como tu só têm garganta. -Disse o mais pequeno.
Tsubo levantou-se para atacar o homem que tinha dito a frase mas este num murro bastante forte na barriga do Inuzuka empurrou-o para longe e destruiu a hipótese de vingança no momento:
-Acabaste de começar o jogo. E acredita, não vai ser fácil de o acabar!- Depois de dizer isto, o mais alto riu-se maliciosamente e seguiu caminho. O mais pequeno cuspiu para o lado e riu-se também.
Mal os dois saíram, Tsubo correu para fora do edifício, para os tentar localizar. Vendo que eles não estavam por perto, Tsubo gritou:
-Isto ainda não acabou. Principalmente contigo baixote!
Os homens observavam de longe, e o mais alto teve que por o braço à frente do mais baixo, pois se o mais baixo não se controlasse, o assunto ia ficar feio. Tsubo seguiu para casa, sussurrando palavras para si mesmo. Palavras que irritavam qualquer homem que fosse alvo delas. Então aí, num clique, tudo começou a juntar-se. A ferida, o sangue, e aqueles dois “pacóvios”, como lhes chamava Tsubo. Só faltava o porquê, e essa era a pergunta mais difícil, pois ninguém quer sujar a honra de um falecido. Tinha que ser Tsubo sozinho, a resolver o assunto…