Mal sabia o jovem que teria o dia inteiro de trabalho, nas muitas atividades que lhe foram delegadas pelo navio à dentro. Mesmo assim, exausto de tantos afazeres, Daisuke ressurgiu do porão e percebeu que a noite já caíra, mostrando a real beleza da Depressão. Completamente iluminada, todos os estabelecimentos agora estavam abertos e uma multidão de marinheiros se amontoava nas portas à procura de bebida, diversão e mulheres. Admirado com a mudança repentina do local, Daisuke mal percebeu a aproximação do timoneiro, que lhe trouxe mais um pouco de carne seca e um vinho de péssima qualidade - coisa que seus pais nunca o deixaram beber. A brisa e o ruído do mar, a grande lua cheia no horizonte se contrastando com a intensa iluminação e toda vida da cidade foram capazes de encher o coração do garoto de esperança. "Talvez pudesse viver ali." - Pensou consigo, enquanto bebia a taça de vinho com alguns goles.
Sua felicidade se completou quando o magro lhe estendeu um pequeno saco com algumas poucas moedas pelo serviço. -
Volte aqui amanhã, se quiseres. - Sorriu o marinheiro, mostrando-se satisfeito com o trabalho do rapaz. Agora com a esperança revigorada, Daisuke guardou seu soldo e desceu até a madeira do porto, onde se misturou com a multidão que tomara as ruas com alegria e descontração. Convencido de que deveria primeiro pagar a feiosa para deixá-la sem esperanças em tê-lo como escravo, o loiro atravessou as ruas rapidamente até chegar a ver a pensão que ele estava hospedado. O local estava completamente diferente da apatia que vira ao entrar. Apesar de seu corpo ainda doer bastante, a alegria de se pagar os débitos era embriagante.
Por isso, com grande orgulho em ter conseguido parte de seu sustento, ele atravessou a última quadra até o imóvel quando algo o acertou de cima do primeiro andar da pensão. -
Argh! Mas que porcaria! - Reclamou, tentando se desvencilhar de um emaranhado de tecidos, cabelos, braços e pernas. Uma mulher havia caído da sacado do prédio, justamente em cima dele. Que sorte. A mulher gemia e choramingava até que olhou nos olhos do loiro e com uma súplica sussurrou algo em seus ouvidos que ele não entendeu, pois no alto da sacada, um homem gigantesco falava mal a mulher dizendo que ela havia roubado o dinheiro dele. Preocupado em não se intrometer nos problemas dos outros, o loiro empurrou a mulher com o restante da força que tinha, mas esta não lhe largava, passando para suas costas numa grande agilidade como se o utilizasse de escudo.
-
Sai de mim, mulher! - Reclamou o garoto distraído, quando recebeu um forte tapa no rosto que o fez cambalear até o lado oposto da calçada, onde caiu sentado com a boca sangrando. Ainda com a visão turva, Daisuke viu o homem musculoso já agarrando o braço da mulher enquanto olhava para ele com um sorriso sarcástico no rosto. -
Sai da frente franguinho! - O homem provocou, para a chacota de todos que já se aglomeravam em volta. Aquilo feriu o orgulho do nukenin que acabou por esquecer seu cansaço para se levantar e se dirigir ao homem que já começava a espancar a outra à procura de seu dinheiro. Por mais que o homem fosse maior, aquela atitude em bater numa mulher indefesa já dizia muito de seu caráter. "Isso não vai ficar assim." - Revoltou-se em seu pensamento, pegando uma caixa de madeira que servia de lixeira, girando-a com toda força para atingir as costelas do gigante que estava distraído com a mulher.
A luta estava armada. E para o delírio de todos, os dois pareciam decididos a estraçalhar um ao outro. Utilizando toda frente do estabelecimento, os dois se digladiavam como bárbaros em dia de sangue. Socos, chutes e cabeçadas estalavam e ecoavam pela viela completamente tomada pelos marinheiros que pareciam torcer apenas a quem conseguisse o golpe mais certeiro. Enquanto isso, a vítima buscava a proteção de suas companheiras que se escondiam no primeiro andar, onde a feiosa dona do cabaré assistia com suspiros a valentia do loiro. "Esse loiro ainda vai ser meu." - Desejava, enquanto o via tomar mais uma pancada no rosto. A briga continuava bastante equilibrada por alguns momentos, porém, o gigante parecia estar bêbado e aquilo ajudava Daisuke a se sobressair e enfim desferir o último soco, fazendo o homem cair por cima da calçada, onde as pessoas fugiram para não serem esmagadas pelo peso do caído. Gargalhadas e palmas para o loiro que acabara por se sentar todo coberto de hematomas e sangue.
-
Lindo! - Gritou uma das garotas, sumindo na sacada para ressurgir no meio da viela acompanhada por uma dezenas de garotas que trabalhavam na pensão, que a ajudaram a arrastar o rapaz para dentro da pensão antes que a autoridade do local chegasse e tentasse investigar o ocorrido. O mesmo aconteceu com o gigante. Seus amigos apareceram tardiamente, deixando-os apenas a alternativa de levar seu amigo embriagado de volta ao navio. Enquanto isso, o nukenin só conseguia enxergar o teto passando sob seus olhos através de sua visão turva, quando reconheceu seu quarto assim que foi deitado em na cama dura que já se acostumara a relaxar. A feiosa também já estava lá, junto com um estranho que Daisuke nunca vira. E enquanto os seus olhos gulosos da gorda fitavam os músculos do garoto enquanto era despido pelas subordinadas, o estranho testemunhava a resistência incomum do menino, pois apesar dos hematomas, ainda conseguia se mover e brincar para receber mais paparicos.
-
Rapaz, você é mesmo valente. - Elogiou o estranho, com sua voz rouca.
-
Quem é você? O que está fazendo no meu quarto? - Perguntou o jovem enquanto era lavado pelas mulheres.
-
Só vim lhe fazer uma proposta. Sou empresário de lutas. Queres participar de algumas? - Respondeu o empresário , esperando ansioso pela resposta do garoto.
-
De quanto estamos falando? – Retrucou com uma careta.
-
Pelo menos poderás pagar por uma espelunca melhor. – Ofertou o moço, com olhar bastante malicioso, apesar da careta de alguma das mulheres que paparicavam o nukenin.
CONTINUA...