[Ost] - https://www.youtube.com/watch?v=HOkS-6cX7Iw
- Citação :
- - Quando estiveres completamente recuperado falamos sobre isso! – Disse o velho, quando tentei aproxima-me do assunto que nos a criara aquele grande mau estar no coração durante dois longos anos. – Agora peço-te que descanses e não penses mais nisso! – Pediu, com uma voz neutra e vazia de qualquer tom de emotividade. Virou as costas e, depois de compor brevemente a capa branca que se estendia até aos pés, saiu do quarto.
Os últimos dias foram passados a descansar no meu quarto, naquela cama onde eu já não dormia fazia dois anos. Desde que reconheci o meu avô, todas as minhas memórias principais voltaram, embora sejam apenas um borram descolorido e pouco nítido. Mas, apesar de eu já me sentir em casa, continuava tudo tão desconexo e distante, era tudo tão indefinido e estranhamente frio. Os nossos olhos continuavam vazios e o silêncio pesava-nos cada vez mais no coração.
Levantei-me a pés nus e caminhei até à janela, penetrei a mão nas cortinas branca e afastei-as. Estava um dia cinzento na vila, as ruas estavam praticamente vazias e era possível ler-se a temperatura a partir dos olhos. Já fazia dois anos que eu tinha sido ostracizado de Ame, no entanto, parecia que nada tinha mudado ali. O vento varria sempre as ruas em dias cinzentos, e as luzes das candeias dançavam com a sua luz por dentro.
No fundo, eu sabia que nós sentíamos o mesmo: uma corda de palavras posta ao pescoço, um nó na garganta com o qual fingimos ter aprendido a viver durante anos. Nós eramos um para o outro aquela caixa esquecida ao fundo do sótão. Mas agora, agora tudo mudou! Agora somos o passado que ressurgiu um para o outro, somos aquela chaga negra que não teve tempo de cicatrizar, e a carne rosada onde tudo podia renascer.
Lembro-me de como ele costumava dizer que em determinados momentos da nossa vida, podemos sentir-nos as folhas que caem das árvores nos dias cinzentos de Outono, olhava-o atonitamente enquanto ele continuava a escrever poesia com as pernas cruzadas sobre aquela larga pedra. Os seus olhos guardavam uma espécie de transe quase frenético quando escrevia.
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Rain’s WolfO lobo uiva nas montanhas
pois Deus lhe ordenou que
protegesse a chuva
com os olhos e com a boca
Da celestial bruma nocturna
desencantam-se os olhos da mítica besta
E o seu espírito caminha
sob as ordens do divino em fúria,
para que a vila não desabe em desgraça ou lamuria.
Saru
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Sempre achei engraçado o facto de ele escrever com um pseudónimo, embora com aquela idade não soubesse o que isso significava.
Enquanto olhava a vila, fui arrancado das profundezas dos meus pensamentos com o som de uma grande explosão vindo do portão principal da vila. A minha casa estremeceu, imitando outras tantas. Saltei para trás com um reflexo, e ainda bem que o fiz, senão teria levado com os estilhaços da minha janela que se partiu em mil pedaços.
Primeiro veio o silêncio… depois os gritos.
O pior estava para acontecer.
- Spoiler:
https://www.youtube.com/watch?v=AoGh2cMKOSw