Os gritos variados entre Fukeru`s e Imagawa`s eram constantes. Armas a chocalharem, nomes de técnicas ninjas a serem trocadas e agonizantes mortes a espalharem-se pela vegetação de Kusagakure. A guerra não era algo que mereça orgulho ou satisfação. Devia de ser evitada, prevenida, pois os seus efeitos colaterais eram o pior de tudo…
Kimera mordiscava tenuemente o seu lábio ao passar pela sua cabeça esses pensamentos. Sim, estava nervosa. Não por causa do seu pai que se encontrava à distância de um par de escadas, não pelo seu clã estar a morrer aos poucos ou pela sua aldeia estar a ser literalmente destruída. O nervosismo devia-se ao que é que ela ia fazer a seguir, após derrotar o seu pai e assumir o cargo de Kusa. De um momento para o outro, responsabilizar-se-ia por centenas de vidas, muitas delas provavelmente já inexistentes nessa altura, e não sabia que ações deveria de tomar…
- Para de pensar! - Murmurou a loira para si mesmo, cessando a sua subida e encostando-se à janela da escadaria, onde podia ver as raízes de Kusa a digladiarem-se entre si, num constante derrame de sangue e sofrimento. Suspirou - É nesta merda de mundo em que vivemos… - Apalpou o seu bolso direito, retirando de lá um cigarro e isqueiro. Acendeu-o de imediato, despachando-se a fumar um pouco para descontrair.
Percebeu que não devia de ficar ali por muito tempo. Quanto mais demorasse a derrotar o seu progenitor, por mais tempo esta fútil batalha se desenrolaria. Prosseguiu pela subida da escadas, com ocasionais pequenas nuvens de fumo, até abrir a porta que a conduzia para o gabinete do Kage.
A primeira coisa que ouviu ao entrar era uma gargalhada. A mercenária nem fechou a porta, entrando calmamente com uma mão à cintura e a outra a agarrada ao cigarro. Soltou mais uma nuvem de fumo e olhou para o seu pai, sentado atrás da sua secretária de joelhos cruzados e a olhar para ela, muito divertido.
- Levanta-te, pareces uma prostituta desesperada por dinheiro! - Vociferou a adolescente sem se preocupar com a má linguagem, fumando mais um pouco, sem perceber que o seu nervosismo a estava a fazer fumar com mais frequência.
O seu pai levanta-se, não porque a filha lhe pediu, arrastando a sua cadeira o máximo que conseguia, fitando depois a sua familiar. Ajeitou os óculos e caminhou, contornando a secretária, na direção da Fukeru. Esticou os braços à frente, revelando uma estúpida descontração que só irritava mais Kimera.
- Nunca pensei que a minha filha fosse uma rebelde… - Comentou seguido por uma breve e sarcástica gargalhada, quase como se tivesse a falar para ele mesmo, mas com as claras intenções de irritá-la - E a Ishida seguiu o teu caminho. A tua mãe foi igual, não tenho mesmo sorte com as mulheres…
Kimera apertou fortemente o seu cigarro, esmagando-o a meio antes de acabar com ele, atirando-o depois para o meio do chão. Louca de raiva, avançou com um punho em riste à direção da cara de Tadao. O homem ri-se, agarrando-lhe no punho sem grandes dificuldades. Preparava-se para falar algo, mas depressa sentia a sola da bota da Fukeru a embater-lhe violentamente na cara, projetando-lhe o corpo contra uma estante cheia de livros. A estante ampara-o, porém acaba por desabar-lhe em cima, deixando cair todos os seus livros para o chão ou para cima do seu corpo aturdido.
A adolescente desce a sua perna, apertando os seus punhos um contra o outro até estalar cada um dos dedos, aproximando-se cautelosamente da estante desabada - Na minha presença tens cuidado com a língua. Nós as três é que tivemos azar por nos sair um ranhoso de pai! - Gritou em resposta, olhando para as costas da estante derrubada.
Kimera cessa o avanço, esperando pela resposta do seu pai que nunca mais chegava. Os seus olhos, ativos com o indistinguível Kashikogan, analisavam cada ponto do local desarrumado, procurando por algum sinal de vida. Sentia-se uma atmosfera pesada a alastrar-se e alguns sons abaixo da estante a começarem a ficar audíveis. Bastou um pequeno fluxo de chakra para a Fukeru dar um felino salto para trás, calculando a distância.
- Namanurui Sasori… - A voz fraca de Tadao fez-se ouvir, por fim, e uma grande porção de chakra esverdeado começa a aglomerar-se em forma de nuvem à volta dele.
Uma cauda verde rapidamente desfaz a estante em pequenos pedaços de madeira, desenhando um arco no ar e descendo contra Kimera. Esta salta para o lado, esquivando do poderoso ferrão que agora impactava contra o solo, sem provocar grandes estragos. Kimera reconhecia aquela longa cauda verde, que agora se recolhia para perto do corpo de Tadao, como a segunda habilidade dos Fukeru: Namanurui Sasori, o poder oculto do Kashikogan.
O Kage levanta-se, afastando, com o seu chakra verde, os livros e pedaços de madeira de si. Com o tronco esticado, era notável a essência verde que pairava à sua volta. Esse chakra mantinha-se como um manto nas costas dele, criando quatro pequenas garras ao lado do corpo e uma gigante cauda com um ferrão na ponta a nascer do rabo.
- Agora estás a levar a sério, idiota?! - Gritou Kimera ainda irritada pelos insultos anteriores e sem mostrar intimidação pela habilidade oculta do seu clã.
A cara do homem erguia-se por fim, fitando a sua filha com raiva e notando-se a marca da bota dela, estampada na sua cara. O seu nariz também deixava escapar um pequeno fio de sangue e um pequeno hematoma na bochecha começava a desenvolver-se. Kimera teve vontade de rir da cara do seu progenitor e de comentar com uma piada suja que acabara de lhe vir à mente, mas percebeu que a situação não era propícia, preferindo guardá-la para contar ao Katsu mais tarde.
A cauda do seu pai esticou-se, atirando-se velozmente na direção da loira com o ferrão apontado para o seu dorso. A adolescente sorriu, colocando, descontraidamente, a mão sobre a cintura e fitando o adversário. O ferrão para a centímetros do peito dela, levando a que Tadao olhasse, confuso, para a situação. O chakra verde de Kimera começava agora a revelar-se, mostrando que uma das garras dela havia bloqueado o ataque, desfazendo-o posteriormente em chakra, que se espalhava pela atmosfera até se perder.
- Namanurui? - Questionou-se o Kage mediante outra cauda de escorpião surgia por detrás de si, levando a que a sua filha também criasse uma, totalmente igual à sua.
-Estive muito tempo fora, papi… - Gargalhou a adolescente usando, ironicamente, a alcunha de “papi” para relembrar como outrora estes dois se davam tão bem - Aprendi uns truques novos…

- Vocês vão lutar contra a Kimera? - Perguntou-se Katsu aos dois Imagawa que planeavam a súbita rebelião. Ambos tentavam colocar Yuu o mais confortável possível, mesmo que este se encontrasse preso por um grande amontoado de cordas - Pensei que íamos lutar juntos, em equipa…
- Não vamos explicar de novo Katsu-sama… - Retorquia um dos líderes da rebelião, afastando-se de Yuu e aproximando-se do mercenário, colocando-lhe um mão por cima do ombro de forma fraternal - Nós adotámos-te, ensinámos-te e fizemos tudo por ti. Está na hora de nos mostrar o quanto és fiel aos Imagawa. Lembras-te dos nossos objetivos, do porquê de criarmos aquele acampamento de terra, de nos tornarmos mercenários e passar por assassinos, sempre à procura de dinheiro… Lembras-te?
Katsu permanece calado. Lembrava-se, obviamente, dos sacrifícios que o clã passara para chegar até onde chegara. Ao mesmo tempo, lembrara-se de quando Takumi lhe havia contado a história dos Imagawa, que, mesmo sendo adotado tal como Katsu, a sabia de cor. Os Fukeru haviam traído a confiança dos Imagawa, expulsando-os de Kusagakure. Esse acontecimento ficara-lhes marcado no peito, quer nas velhas como nas novas gerações.
Abriu a boca, preparando-se para concordar com a rebelião, mas depois lembrou-se de Kimera. Ela própria havia feito os seus sacrifícios, investigando a fundo a história entre Imagawa e Fukeru, absorvendo cada pormenor deste confronto tão antigo. Fora nessa investigação que ela se aliara aos Imagawa, prometendo-lhes o retorno a Kusa em troca da sua ascensão ao trono. Mas o clã de mercenários também têm as suas ambições e não quer que nenhuma Fukeru assuma o poder da sua vila…
Katsu olhou para o lado, não se atrevendo a encarar o seu irmão enquanto se encontrava neste gradual redemoinho de conspirações, traições e alianças. Lembrava-se das palavras de um certo velho, Oráculo, que conhecera dias atrás:
“ -Vais participar numa guerra entre duas culturas meu jovem. E em pouco tempo terás que fazer uma grande decisão, entre a tua família e uma forte amizade, quem sabe mais que amizade… - O velho continuava o seu discurso conseguindo sempre prender a atenção de Katsu – Após isso alguém que é um conhecido teu, alguém muito forte e que partilha o teu sangue, irá finalmente revelar-se da escuridão. Nesse momento é que vais conhecer o teu outro “eu” e lutarás contra esta pessoa ou então vais juntar-te a ela.”

-Isso mesmo caro Katsu, lembra-te do que eu disse! - Gargalhava o homem na sala escura, fazendo o selo do Rato e abrindo a boca num estranho espasmo- Precisamos de alguém como tu, alguém forte, misterioso e sem passado!
Dos seus pulsos, uma estranha mistela negra começava a descer, entrando para dentro de uma pequena tijela. O selo do velho não se desfazia, permitindo que mais e mais daquela estranha substância roxa adentrasse violentamente, começando a remexer-se sozinha.
Mais uma gargalhada ecoa na sala negra onde o Yin, do símbolo de Yin Yang desenhado na parede à frente do Oráculo, começava agora a emitir uma aura roxa e bastante pesada.

As linhas desenhadas na cara de Katsu começam a emitir a mesma aura roxa. Porém, não sente que as tatuagens na sua cara se modificam, nem que as luvas nas suas mãos também transbordavam daquela essência negativa. O Imagawa à sua frente tirava agora as mãos dos seus ombros, sentindo como o ambiente se tornava pesado e vendo as novas tonalidades em torno do seu companheiro.
- Katsu-sama? - Questionou, afastando-se cautelosamente e sem conseguir tirar os olhos de cima dele.
- Vamos… - A voz calma de Katsu era agora substituída por uma muito mais forte e carregada. Nem dava para reconhecê-lo mais: a sua postura agressiva, a voz forte e o olhar frio. Totalmente a contrastar com o mercenário de há poucos minutos atrás - Acabar com esses Fukeru… De uma vez por todas…
Assim, virou costas a toda a gente, saindo apressadamente da tenda e soltando o ambiente pesado, nela concentrado. Ambos os Imagawa começam a respirar ofegantemente, como se tivessem a suster a respiração até aquele momento e só nessa altura a pudesse largar…
- Ele parecia…
- … O Nightmare…