À medida que se aproximava da origem dos pilares de fumaça, Daisuke pôde ter uma ideia de como era o tranquilo vilarejo antes do ataque. Do alto da duna ele viu que todos os casebres que eram feitos de madeira e tinham sido estrategicamente construídos por trás desta duna permanente para poder proteger sua posição de olhos invejosos de quem se aproximasse pelo mar - proteção esta que agora imaginava ter sido ineficaz. Seguindo a duna que faz uma espécie de arco nas costas do litoral, as casas perfiladas trilhavam uma pequena inclinação que descia até um humilde templo ainda intocado pelos piratas, cuja sede se estendia até um grande e longo imóvel onde se conseguia ver de longe as letras amareladas numa placa de cobre: Orfanato.
"Pelos deuses... Não. Onde estão as crianças?!" - Desesperou-se em pensamento, procurando de forma nervosa os arredores, mas não viu nenhuma delas na fila de sobreviventes que agora estavam amarrados à beira de um antigo coreto, esperando o que o destino lhes traria. Suspirando fundo, aliviado, o loiro deixou de admirar a arquitetura do local para voltar sua atenção ao que aconteceu ao restante dos moradores... Destruição e morte. Foi o que ele observou enquanto descia da duna e se aproximava com a carga de barris de rum. -
Chegou a bebida! - Comemorou um dos piratas ao vê-lo descer a encosta com dois grandes barris às costas, tomando todo cuidado para não escorregar nas finas areias brancas. Enquanto isso, na praça central do vilarejo, dezenas de piratas iam e vinham das residências arrombadas, buscando o que podiam carregar de ouro, prata ou qualquer coisa que achassem ser de valor, começando a deixar o local abarrotado de quinquilharias.
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Traga aqui garoto! Vamos! Os homens estão sedent..! - Dizia o pirata, mas interrompeu seu comando ao ser fuzilado pelo olhar ameaçador do loiro que ficava cada vez mais furioso pelo comportamento bárbaro dos homens. Ele não tinha nada contra os saques. Porém, o assassinato de inocentes o deixava enojado com a covardia flagrante deles. Teriam essa coragem toda contra um grupo de ninjas? Claro que não. Covardes. -
Ei, Saru! Vem ver isso! Que maravilha! - Esbaldava-se Lian, agarrando um punhado de pérolas antigas que eram guardadas numa simples caixa de música. Sem qualquer interesse naquilo, Hiroshi usou aquele chamado para se distanciar da turba que já abria os barris para iniciar as festividades. Tomando cuidado para não derrubar nenhum móvel empilhado, ele ziguezagueou pelas quinquilharias até se aproximar dos prisioneiros.
Desesperados, homens e mulheres choravam baixinho e se afastavam de sua mão à medida que o jovem se aproximava até que uma jovem mais corajosa cuspiu em seu rosto. Aquilo o fez sorrir. -
Coragem sem inteligência pode causar sua morte. - Aconselhou a moça que retornou aos braços de sua mãe. Limpando o rosto, ele voltou a prestar atenção em seu discípulo que já corria entre os objetos até alcançar a origem dos ruídos intercalados com gemidos de esforço. Também curioso, o loiro procurou se aproximar e percebeu que o ruído se tratava de alguns piratas que usavam uma grossa madeira - que servia de viga numa das residências circunvizinhas - como um aríete improvisado, avançando contra a porta principal do templo que resistia firmemente. Aquilo durou alguns longos segundos até que as dobradiças rangessem e a grande porta caísse para dentro do templo num eco ensurdecedor.
O grupo comemorou como se tivessem ganhado uma longa batalha e correram para dentro esperando encontrar grandes riquezas, porém o que encontraram os enfureceu. Na verdade, não existia nada além de alguns bancos de madeira enegrecido e uma imagem de Sun Wukong - o Rei Macaco - esculpida em rocha sem valor. Nada que se poderia aproveitar. -
Essa porcaria! Não tem nada aqui! Vamos queimar! - Gritou um deles ao sair em busca de alguma tocha para terminar o serviço, enquanto os outros zanzavam pelo templo até desistir de procurar e sair para continuar a busca em outro lugar. Ansioso, Lian acompanhou os piratas ambiciosos deixando Daisuke sozinho no local. Aproximando-se da estátua, o nukenin admirou o Rei Macaco que sorria sentado em uma grande almofada, segurando um Tetsubo.
"Até que é uma estátua bem feita." - Elogiou em pensamento quando ouviu um espirro de criança vindo do chão. Rapidamente voltando sua atenção ao ruído, ele ainda pôde ver um par de lindos olhos castanhos que fitavam o nukenin sem que ele percebesse. -
Um alçapão. - Sussurrou ao conseguir perceber o contorno na madeira do assoalho logo ao lado da estátua. Quase imperceptível. Agachando-se à beira da passagem, Daisuke apertou os olhos à procura da pessoa que o observava mas logo percebeu os pés de algumas crianças que se apertavam naquele cubículo. "As crianças do orfanato!" - Pensou. Nesse momento, o pirata vingativo adentra o tempo segurando um pequeno tonel de querosene numa mão e uma tocha acesa na outra. Sorrindo como uma criança à expectativa de uma traquinagem, ele não esperou e começou a espalhar o líquido inflamável pelo recinto. Logo o cheiro de querosene invadiu o lugar e novamente o par de olhos castanhos em súplica fitou os dele.
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Alguém por aí, Saru-kun? - Perguntou o pirata, desconfiado.
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Não. Não queime o local. Traz má-sorte. - Mentiu.
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Foda-se. Essa merda vai queimar. - Retrucou em gargalhada.
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Quer mesmo me enfrentar, cara? - Concluiu num tom ameaçador.
Ao ouvir as palavras o pirata parou e cedeu terreno, recuando alguns passos enquanto o jovem se aproximava dele até que o encurralou na parede do templo. O pirata tremeu e fechou os olhos quando Daisuke esticou o braço para buscar a tocha das mãos do bucaneiro. -
Vai, vai embora. - Expulsou o homem para então apagar o fogo e retornar à fresta. Agachando-se mais uma vez, os olhos castanhos saíram de seu campo de visão vindo logo um sussurro de agradecimento através da estreita passagem. -
Fiquem aqui. Só saiam quando estiverem certos de nossa partida. - Respondeu também num sussurro. Foi por pouco. Afinal, as crianças não tinham nada com essa covardia. Assim, levantando-se mais uma vez, o loiro se distanciou da estátua e levantou a grande porta para recostá-la à entrada e garantir que ninguém mais entrasse ali sem que fizesse um grande barulho.
Nesse momento um som agudo ecoou vindo do Yukikaze, seguido de mais um. Aquele som fez seu coração gelar. Um silvo significava que era hora de partir... Mas o segundo significava uma coisa: PROBLEMA. Gritos e correria ecoaram pelo vilarejo. Apressadamente, os piratas correram para os objetos apinhados na praça central, procurando as coisas que mais valor e pequeno porte. Enquanto isso, Lian e outro sujeito brigavam pela caixa de música que guardava as pérolas. -
Solta, seu cão sarnento! Ei, me soltaaaaa!! - Esbravejava o filho do mafioso, mas foi agarrado e puxado bruscamente na direção da saída. Colocado sob os ombros, Lian se debatia e reclamava por ter perdido a caixa, mas logo ficou agradecido quando as primeiras bolas de canhão atingiram as proximidades do Yukikaze. Daisuke olhou para o horizonte a procura da origem do ataque e pela primeira no dia se surpreendeu com o que vira: Um navio de patrulha.
CONTINUA...