Sakuragi
~ Rapariga com brinco de pétalas ~
Assim que colocou os seus pés na porta de entrada, sacudiu os seus cabelos claros para os arranjar e passou as mãos pela roupa, perguntando-se se estaria apresentável. Já não via os sobrinhos há umas semanas, desde que partira para uma das suas mais recentes missões como ANBU. Ter que estar na mesma equipa que a cunhada fora um pouco constrangedor. Sabia que Chiharu nutria um carinho muito forte pela família e, como seria de esperar, mesmo 8 anos depois de serem oficialmente irmãs, esta ainda pensava que ela lhe iria roubar o irmão mais novo para ir com ele para longe. Coisa que, obviamente, não fora nem seria capaz de fazer. Amava demasiado aquela família para se ir embora com o homem pelo qual se havia apaixonado.
Esticou a mão para alcançar a porta e abriu-a sorrateiramente, para tentar surpreender alguém. Rapidamente reparou na atmosfera intensa vinda do interior de casa e resolveu deixar-se de brincadeiras. Alguma coisa deveria ter acontecido. Algo que nem o sorriso de Ayame conseguiria alegrar. Ou talvez fosse com ela que tivesse acontecido… Aquele pensamento foi suficiente para despertar em si a preocupação.
Continuou a andar em direcção à sala e deu de caras com uma situação pouco normal. Ayame com uma expressão indiferente e dura, que havia perdido a sua expressividade. Kazuma, que servia de apoio à irmã, olhava todos com um ar descontente. Nadeshiko estava pálida e com um aspecto visivelmente fraco, no colo de Seishirou, que tentava dar-lhe a beber uma infusão que, pelo cheiro, não reconhecia. Yuriko parecia ser a única que passava despercebida ao assunto e brincava num canto com umas bonecas antigas feitas pela avó, Chou.
Da sua boca não saiu um som. Não sabia o que se passava, mas estava com receio de perguntar, como se a pergunta pudesse ser inapropriada. Estava tão absorvida a olhar para todos que nem deu por Yuriko a abraçar-lhe a cintura. Procurou esquecer-se daquele ambiente e concentrar-se apenas na sobrinha, que a abraçava com saudades.
- Como está a minha pequena sobrinha? – perguntou Hayane, baixando-se ao nível de Yuriko. A pequena colocou as suas mãos na cara da tia, fazendo-lhe carícias. A sua voz soou pura e fresca quando lhe respondeu com um sorriso torcido:
- Não sei.
E voltou-se para o resto da família, como se estivesse a tentar dizer que estava ansiosa com o ambiente.
Hayane voltou a erguer-se e, de mão dada a Yuriko, aproximou-se dos sofás. A criança não tardou a largar a sua mão para saltar para o sofá livre. Os adultos ali presentes invejavam a capacidade da menina de se distrair facilmente, especialmente em situações assim.
O olhar da recém-chegada passou por todos os presentes. Ao chegar a Kazuma, reparou que este falava através do olhar com o pai. Após um gesto com a cabeça, Kazuma entendeu que o pai queria privacidade e que também tinha algo para explicar a Ayame, embora considerasse que podia representar perigo no futuro.
- Ayame… - chamou o irmão mais velho mais docemente que o normal. Estava preocupado com ela. - Podes acompanhar-me? Há algo que tenho que te entregar.
Ela despertou do seu pensamento e a sua face ganhou mais cor. O sangue voltara a fluir normalmente no seu rosto anteriormente duro e, lentamente, a expressividade desenhava-se junto daqueles olhos da cor da natureza.
- Claro – afirmou ela, levantando-se. Só naquele preciso momento reparara na madrinha e correu para a abraçar.
Hayane afagou-lhe os cabelos, transmitindo-lhe ternura com aquele gesto. Viu que a afilhada a ia bombardear com questões (muito provavelmente sobre a missão) e, suavemente, colocou um dedo em cima da sua boca.
- O teu irmão não tem uma coisa para te dar? Vai lá com ele. Temos muito tempo para falar depois disso, está bem? – disse ela, com um leve sorriso no rosto.
Ayame concordou silenciosamente, afastou-se uns passos dela e, depois de lhe dar um beijo na cara, voltou-se para o irmão, à espera dele. Kazuma saiu pela porta da cozinha e ela seguiu-o. A última coisa que vira na sala foi Hayane a sentar-se no sofá, visivelmente rígida.
Pelo que parecia, dirigiam-se para a estufa. Estaria lá alguma coisa importante? A curiosidade dela fervia e, ao mesmo tempo, recolhia-se com o medo que implicaria. Mas, devido à confiança que tinha no irmão, sabia que não lhe fariam nada de mal.
Entraram na estufa, quente pelos raios de sol, e iam ainda a meio do caminho para a sala das kuchiyoses quando o pequeno Kousetsu se juntou a eles, saltitando à volta dos seus pés. Ayame parou para que ele saltasse para o seu colo e se enroscasse nos seus braços, continuando de seguida para junto do irmão.
Kazuma olhou para Haru antes de abrir o único armário da sala onde se encontravam, como que a pedir licença. A raposa entristeceu e assentiu com o focinho. Deixou cair a cabeça sobre as patas, querendo manter-se atenta ao que se iria passar.
- Ayame, aproxima-te, por favor – pediu ele. – Isto é pequeno e assim não consegues ver os pormenores.
A rapariga aproximou-se cautelosamente, com Kousetsu nos braços. O irmão tinha duas caixas pequenas na mão. Antes que pudesse perguntar o que aquilo era, ele explicou:
- Aqui dentro estão brincos. Cada um dos descendentes e participantes do torneio tem os brincos correspondentes à sua família e são obrigados a usá-los para identificação. É claro que ninguém te pode fazer mal mesmo que tenhas isto posto. A não ser que peçam formalmente por uma luta, nenhum atacaria fora do torneio.
Abrindo as caixas, mostrou os brincos dourados com uma flor de cerejeira cravada no centro destes. Esta flor era o símbolo da família Sakuragi, uma das 8 famílias da Kugeka.
O jounin pegou na caixa que apenas tinha um brinco e, relutantemente, colocou-o. A caixa que possuía dois brincos continuou na sua mão, à espera que Ayame pegasse neles.
Kousetsu pareceu compreender instintivamente e saltou para os ombros da rapariga enquanto ela colocava aqueles estranhos objectos dourados, que a pequena raposa nunca tinha visto antes. Um som semelhante a um latido vindo de Haru fê-lo voltar o focinho e saltou para o chão, indo para junto dela. A sua mãe parecia triste, sempre com um ar pensativo, enquanto olhava os dois humanos. Apenas se moveu quando ele se tentou acomodar junto do seu pescoço.
- Vê estes símbolos aqui – disse Kazuma à irmã, apontando para uma placa de metal no interior das caixas, debaixo de algum tecido.
Haviam 8 símbolos diferentes junto a uma legenda, que era facilmente interpretada como o nome das famílias. Ayame reconheceu de imediato o símbolo dos Sakuragi. No entanto, haviam outros 7 que não conhecia. Havia uma flor de lótus com a legenda “Renge”, um lírio cuja legenda dizia “Yurioka”, um crisântemo que representava a família Kikuchi, uma flor de ameixa para os Umehara, um girassol para os Himawari, uma rosa legendada por Ibara e, por fim, uma glicínia que simbolizava a família Fujishima.
- Já viste tudo? – perguntou ele.
- Sim. É curioso como todas as famílias têm nomes de flores – reparou ela, olhando mais uma vez para os símbolos e as suas legendas.
Assim que ela acabou, como não tinham mais nada para fazer ali e, muito provavelmente, iriam necessitar da ajuda de ambos devido ao estado da mãe, os dois irmãos dirigiram-se para casa.
***
Já não tinha mais nada para tratar das mudanças. O seu quarto estava finalmente em ordem e tudo o resto que lhe pertencia e que a avó não queria aproveitar para agora estava guardado dentro dos anexos da casa. Estava a descer as escadas interiores quando viu uma cabeleira longa a esvoaçar, vinda da estufa dos vizinhos, que logo lhe chamou a atenção. Pelo que conseguia ver através das janelas, tratava-se de Ayame. Ao aproximar-se da janela, pôde garantir que era ela. Aqueles olhos verdes e aquele cabelo eram bastante únicos. Quem a acompanhava deveria ser o seu irmão. Conseguia ver as parecenças de ambos, principalmente no cabelo e em alguns traços faciais.
Talvez ela gostasse de ir lá a casa para lanchar. Não perdia nada em a convidar. A avó ficaria contente em ver que ele se estava a adaptar bem à nova vila e que estava a fazer alguns amigos, por isso não teria problema algum.
Acabou de descer as escadas algo apressado e saiu em direcção à vedação do jardim. Um brilho junto da rapariga fê-lo estacar. Quando ela passou pela sombra de uma árvore, ele conseguiu vê-lo. O brinco de ouro com a flor de cerejeira. Não conseguia acreditar no que os seus olhos lhe mostravam. Os Sakuragi? Ali? Mas eles não eram os Midori?
Yuu desconhecia o sentimento que o invadiu. Não sabia se era raiva ou desilusão, perda ou vantagem. A única coisa que tinha a certeza é que não conseguiu controlar o que o invadia e, mantendo a mão dentro de um bolso, amachucou a pequena caixa que lá trazia desde Kumogakure.
***
Quando entraram novamente em casa, apenas Hayane e Yuriko se encontravam lá. A menina, o pequeno lírio da família, brincava descontraidamente no sofá enquanto a tia a observava. Ao reparar na presença deles, Hayane levantou-se rapidamente.
- A mãe e o pai? – perguntou Kazuma, ao não os ver na sala.
- A Nadeshiko estava a sentir-se mal com esta situação e resolveu ir deitar-se. O Seishirou foi com ela. Ela precisa de alguma atenção e cuidados que ele lhe pode providenciar – explicou Hayane, aproximando-se dos dois irmãos.
Kazuma bufou e disse, sem esperar uma resposta:
- Já te contaram…
- Claro, querido sobrinho – retorquiu ela, acentuando as duas últimas palavras. - Os vossos pais não são os únicos que se preocupam convosco.
Não obteve resposta por parte de ninguém, pois sabiam que era verdade.
- Bem, tenho que ir ter com o Ren ao hospital. Fazes-me companhia, Ayame? – pediu Hayane, tentando alegrar a atmosfera com uma mudança no seu tom de voz.
- Claro – respondeu a rapariga, mostrando finalmente o seu sorriso, embora não tão exuberante como costumava ser. No entanto, ninguém ficou indiferente. Fora o último ingrediente para o novo ambiente.
---
- Spoiler:
E cá estou eu (com um filler escrito esta tarde porque finalmente consegui arranjar maneira de articular as ideias que tinha)... Peço desculpa por ter demorado tanto com isto, mas o estágio anda a comer-me o tempo todo. Vou ter que arranjar maneira de me organizar melhor para poder escrever mais. ^^"
Qualquer coisa, digam. ^^
Já agora, sim, o título do filler é um grande fail de uma adaptação do nome do quadro "Rapariga com brinco de pérola".