-Perguntas? – Questionou-se Katsu fitando o Oráculo que estava à sua frente, este que não lhe retribuía o olhar, centrando-o no chá que bebericava – Não sei o que perguntar…
-De certeza? – Interrogou o velho parando de beber e pousando a chávena em cima da mesa delicadamente fitando por fim o Imagawa – Pensa bem jovem. Tenho a certeza que há ago que queiras saber!
-Quem sou eu? Katsu Imagawa não é o meu verdadeiro nome! – Confrontou o mercenário de rompante apanhando o Oráculo de surpresa devido a tanta frontalidade – Não sei quem sou, não sei o que quero fazer, não sei o que fiz! Eu quero saber mais sobre mim, como é que acordei naquela caverna com a Kimera, o porquê desta sensação de vazio nos meus olhos… Quero saber!
Senão fosse o velho a bater com a chávena de chá violentamente na superfície da mesa ao ponto do líquido contido nela transbordar até colidir com a superfície de madeira, Katsu poderia continuar a vomitar inúmeras questões e dúvidas até que se cansasse, perdesse a voz ou o Oráculo ficasse enojado dele.
-Meu rapaz, estás a avançar muito depressa. – Explicou o homem entrelaçando os dedos das mãos e apoiando os cotovelos em cima da mesa ignorando (pela primeira vez que o Imagawa o vira) o chá – Desculpa mas só poderei falar sobre isso num futuro próximo, onde estarás dependente do teu outro “eu”, onde salvarás muitas vidas ou as matarás…
-Então o que me pode dizer? – Perguntou o rapaz fitando o velho à sua frente com uma tenacidade crescente e uma voz gutural cada vez mais intensa.
-Vais participar numa guerra entre duas culturas meu jovem. E em pouco tempo terás que fazer uma grande decisão, entre a tua família e uma forte amizade, quem sabe mais que amizade… - O velho continuava o seu discurso conseguindo sempre prender a atenção de Katsu – Após isso alguém que é um conhecido teu, alguém muito forte e que partilha o teu sangue, irá finalmente revelar-se da escuridão. Nesse momento é que vais conhecer o teu outro “eu” e lutarás contra esta pessoa ou então vais juntar-te a ela.
-Como assim? – Questionou o rapaz começando a pensar se o velho à sua frente era um Oráculo ou um vidente.
-O teu coração está negro e branco Imagawa… - Esclareceu o velho momentaneamente ainda sem tocar no chá que tanto adorava bebericar – Neste exato momento um lado de ti apetece matar-me e pegar logo no dinheiro enquanto o outro está aqui sentado à minha frente, paciente e a ouvir um discurso de um ancião – O velho fitava Katsu que, apesar de relutante e espantado, não consegui negar as citações do Oráculo – Não te vou dizer mais nada – O Oráculo pegava na sua chávena, afastava a cadeira com um impulso do seu quadril e remexia nos bolsos atirando com uma sacola para o centro da mesa – Aí tens o pagamento mercenário, agora sugiro que voltes para o teu acampamento – O velho vira-lhe costas sem mais nem menos e encaminha-se para fora da taberna.
O Imagawa ainda não conseguira assimilar tudo e, quando o fizera, o seu alvo já estava quase a desaparecer. “ESPERE!” Gritou no meio de uma corrida desenfreada afastando a cadeira tão bruscamente que esta colidiu com o chão. Toda a gente olhou para o mercenário barulhento enquanto este pegava na sacola e corria na direção dele a gritar pelo nome, nunca recebendo uma resposta.
Katsu colocou o pé fora da taberna e logo uma enorme luminosidade entra-lhe pela máscara ofuscando-lhe os olhos. O seu braço interseta involuntariamente a luminosidade dando assim tempo para que os olhos se habituassem ao já alto Sol.
-Desapareceu… - Suspirou o jovem quando conseguiu abrir os olhos e circundar tudo à sua volta com as suas órbitas negras – Que merda, aposto que ele sabia muito mais… - O mercenário volta a suspirar, é nesse exato momento que ele mostra alguma importância à sacola de moedas que tinha na mão. Abanava com a mão conseguindo ouvir o tilintar das moedas dentro da mesma.
Concluindo que já não encontraria o velho e que o pagamento parecia estar todo dentro da sacola, Katsu só se vê com uma opção. Encontrar Kimera e voltar para casa. Sem saber onde a rapariga estava, este resumia-se a visitar todas as quatro tabernas da aldeia, sem contar aquela onde eles encontraram o ancião. Depois de um busca desenfreada perguntando a múltiplas pessoas se haviam avistado uma rapariga loira a andar sozinha, recebendo assim poucas respostas positivas acompanhadas de algumas indicações e muitas respostas negativas, é que este a encontra.
-Vamos voltar para casa boneca! – Ordenou o Nukenin vendo a sua companheira encostada a um poste não muito longe da saída da aldeia fumando um cigarro e a fitar o chão – Está tudo bem?
-Não, não está… - A rapariga fitou o Nukenin e olhando para a mão dele que portava a sacola que estes tanto ansiavam – Mas parece que já vou ficar, o velhote deu-te o dinheiro?
O mercenário consentiu com um ruído gutural antes de elevar o saco e abaná-lo até que Kimera ouvisse o chocalhar das moedas dentro dele. A rapariga pareceu gostar pois não conseguia esconder um sorriso, acabara agora mesmo o cigarro e a beata encontrava-se agora no chão a ser pisoteada por Katsu.
-E então o que tens? – Perguntou o rapaz retirando o pé por cima da beata, agora devidamente apagada, e atirando a sacola para as mãos de Kimera, esta que a guardava na sua bolsa de equipamento.
-Eu meio que me envolvi numa luta de taberna… - Comentou a rapariga afastando a calça da sua perna direita mostrando uma enorme nódoa negra por cima do joelho e ainda a cobrir a zona do fémur – E eu meio que parti a taberna quase toda, então eu… quer dizer nós… fomos meio que expulsos da vila…
-NANI? – Interrogou-se o mercenário de imediato fitando a rapariga à sua frente furiosamente, esta que voltava a puxar a calça para baixo para cobrir a ferida e coxeava na direção do seu amigo envolvendo-lhe os ombros com o braço, este que não entendia o que ela queria.
-E eu meio que não consigo andar, então tu, meu príncipe encantado, vais-me levar no colito até ao acampamento – A rapariga continuava a sorrir e o Imagawa não conseguiu dizer que não – Oh és tão fofito! – Ironizou Kimera apertando as bochechas de Katsu com força como se falasse com um bebé.
O Imagawa ainda suspirou e logo começou a sua caminhada trazendo consiga Kimera nos braços, esta que se agarrava ao pescoço do companheiro e encostava a cabeça no ombro direito do rapaz. De vez em quando, a meio da caminhada de regresso, mordia-lhe, beijava ou lambia-lhe o pescoço soltando depois risadas baixas mas provocadoras irritando gravemente o Nukenin que se atrapalhava quando ela fazia tal ações.
Dois dias depois…
As árvores passavam rapidamente pelo longo cenário e uma vasta área desprovida de quaisquer obstáculos se levantava. Um vasto acampamento coberto por uma muralha de terra em todo o seu redor que se afastava ao longo do terreno adquirindo quase um tamanho proporcional de uma vila era o centro das atenções. A partir do relevo onde Katsu se encontrava, este conseguia ver a movimentação no acampamento, pessoas a caminharem de um lado para outro, casas feitas de rochas a soltar para o ar fumo a partir das chaminés, e inúmeros sentinelas a cumprirem o seu trabalho caminhando na superfície das muralhas, atentos a tudo.
-Lar doce lar! – Festejou Katsu enchendo os seus pulmões de ar fresco soltando-o todo de uma vez numa rajada virtuosa e feliz. Kimera surgia ao seu lado imediatamente, o seu braço voltava a cobrir os ombros do Imagawa e a sua cara expressava um leve semblante de dor, mas também feliz – Consegues andar sozinha boneca?
-Acho que até ao portão consigo… Depois lá se vê fofito… - Comentou a rapariga adiantando-se na direção do acampamento com grande esforço visando alcança-lo antes que ficasse sem forças.
Os dois mercenários encaminham-se rapidamente para o centro da deslumbrante muralha onde dois guardas se encontravam a proteger a área. Ao longo de toda a muralha distinguia-se a superfície rochosa de tudo o resto, toda ela desprovida de qualquer tipo de decoração ou enfeites, limitava-se a ser rocha. O único que se distinguia em tanta nudez rochosa era o “portão”. Ao contrário do resto da muralha, este mantinha constantemente dois Shinobis de guarda e continha um símbolo gravado na rocha, uma kunai a cruzar-se com uma shuriken formando um simples brasão. Nos lados do portão notavam-se as ranhuras que o separavam do resto da muralha.
-Bom-dia viajantes… - Cumprimentou um dos guardas bastante alto e com um notório corpo atlético.
O seu cabelo era castanho e espigado combinando com a pele morena e os olhos igualmente castanhos. Usava uma curta camisola branca que não conseguia esconder o musculado dorso do guarda. Portava também umas calças negras que lhe fugiam até os tornozelos, sendo os seus pés cobertos por duas sandálias negras. Na sua mão direita ostentava uma imponente lança gigante, com a ponta da arma completamente suja e coberta de lama, não deixando mesmo assim de ser intimidadora.
-Bom-dia Takumi… - Cumprimentou Katsu estacando à frente do portão e remexendo nos seus bolsos retirando por fim dois papéis que entregava na mão do guarda, este que aceitava de bom grado.
-Muito bem… - Takumi pegava nos dois papéis e inspecionava-os, neles via-se uma identificação simples de Katsu e Kimera contendo os nomes, outros dados irrelevantes e as suas respetivas fotos faciais – Katsu e Kimera, bem-vindos a Imagawagakure! -
-Inventaste um novo nome para o Acampamento? – Perguntou o mercenário de negro não contendo uma risada leve recebendo os passaportes a mão de Takumi enquanto Kimera permanecia calada.
-É verdade, ainda lhe vou fazer uns ajustes – Riu-se também o guarda fitando de seguida Kimera, que estava irritamente calada e a apoiar-se nos ombros do seu companheiro – Que se passa resmungona, o Katsu comeu-te a língua? Seu malandro!
-Cala-te baka! Quero entrar logo! – Ripostou a rapariga loira recebendo um suspiro do sentinela, este que batia violentamente com a lança no chão.
O embate da ponta da lança fora violento e os presentes podiam sentir algumas vibrações no solo. Aos poucos, o portão começava a entrar no solo violentamente enquanto o cenário à sua volta tremia nervosamente. Katsu olhava para o processo, adorava a maneira como o líder do Acampamento protegia os seus familiares, como ele era cauteloso ao ponto de criar estes passaportes, como ele era um bom administrador. Kimera limitava-se a fitar zangada a descida do portão agoirando a uma identidade superior por lhe estar a dar tanto sofrimento na perna e por ainda a fazer esperar por um maldito portão que nunca mais se abria.
-Portem-se bem os dois! – Avisou Takumi vendo que o portão havia finalmente concedido passagem – Hoje vai haver uma festa na Praça, vamos comemorar a simpatia da Mãe Natureza. Seria educado se comparecessem! – Avisou o guarda antes de voltar a embater com a lança no chão recebendo mais sinais vibratórios do portão, que começava a tremer de novo e voltava a elevar-se para completar a muralha.
Agora dentro de “Imagawagakure”, o mercenário sentia-se feliz. Este local trazia-lhe bastante felicidade e boas memórias, era natural, espontâneo e divertido. Apesar de todos aqui serem Imagawas, exceto alguns mercadores, turistas e a Kimera, todos se davam bem tornando o Acampamento uma forte comunidade e unida. Sem esquecer das inúmeras festas que se decorriam à noite para festejar tudo o que acontecia de bom. Os Imagawa são conhecidos pela forte conexão com a Natureza e pelo enorme espirito festivo. Desde a sua nascença em Kusagakure até ao seu exílio, estes sempre se devotaram à Natureza e, por parte dela, sempre se conseguiram sustentar muito bem.
-É bom estar de volta! – Grunhiu o mercenário de negro esquecendo-se que a Fukeru ao seu lado, e ainda a agarrar-se aos ombros dele, queria despachar-se a ir para um hospital.