Finalmente tinha chegado o dia da entrega dos kitayates, finalmente tinha chegado o dia em que se tornara gennin. Desde pequena que sonhava com aquele dia e desde pequena que sonhava com o dia em que os irmãos a iriam ver a tornar-se gennin. Era o pequeno passo por que tanto ansiava para começar a longa viagem.
Houve muita comemoração, pois toda a família sabia o quão importante era aquela passagem para Riri. Ela detinha uma onda de energia tão grande que contagiava toda a gente que estivesse ao pé dela, mas ela sempre fora a assim, sempre souberam que ela iria longe com a sua energética personalidade, porque esse era um dos factores que a motivava a continuar. "Nunca desistir! Nunca parar! Continuar sempre! Acreditar sempre!"- Este era o lema da sua família e o lema que ela adoptara também. Desde os poucos anos de infância que tomou consciência do que era viver no seio de uma família orgulhosa da sua cultura e origem. Sempre lhe ensinaram que eram as pequenas coisas transmitidas de gerações em gerações, pertencentes aos seus antepassados, que faziam o que ela era naquele dia: humildade, confiança, espírito de equipa e força de vontade.
Ao final do dia, depois de toda a gente ter voltado para as suas tarefas habituais, Riri perguntou à sua família se se importavam que ela fosse dar um passeio até ao lago que havia perto da casa onde vivia. Precisava de alguns momentos a sós rodeada pelo sossego da água e pela imagem da bonita paisagem da sua terra natal reflectida nela para poder absorver definitivamente tudo o que acontecera naquele dia. Como a família já sabia que aquilo era o seu ritual desde à muito tempo, fez questão que ela fosse e que não se preocupasse com nada, que voltasse quando quisesse.
Caminhou lentamente pelo trilho gasto que levava ao lago. Estava distanciada da realidade a pensar no que tinha acontecido naquele dia, mas não o suficiente para não tomar atenção ao burburinho que vinha das árvores e aos risinhos que aconteciam quase em simultâneo, mas que provinham do chão. Sabia que eram barulhos propositados, pois não se esforçavam muito por os esconder. Ocasionalmente pisavam galhos com força, pontapeavam uma pedra para o meio das folhas e até chegaram a escorregar, mas isso deduziu ser um puro imprevisto, porque de seguida veio um “Autch!”e mais risinhos por parte de outra pessoa destinados a quem quer que tivesse caído. Soube imediatamente que eram os irmãos e por isso não pode deixar de querer entrar na brincadeira. Continuou a caminhar lentamente como se nunca tivesse ouvido nada e fosse suficientemente ingénua para pensar que alguém a seguia. De súbito, parou. Quis que os irmãos pensassem que se iria virar para trás e confirmar se alguém a seguia ou não, mas não foi isso que fez. Após ter parado, contou até cinco e virou-se de repente para a sua direita e estacou ai. Inclinou a cabeça para o chão e contou novamente até cinco. Depois, num movimento rápido, apanhou uma folha e voltou à estrada, sempre sem olhar uma única vez para trás. Sabia que tinha que resistir a essa tentação, mas não era fácil. Conseguiu resistir a esse impulso e retomou a caminhada. Quando faltavam mais ou menos 5 metros para chegar ao lago decidiu que era hora de pregar um susto aos irmãos, ou pelo menos tentar fazer-lhes isso. Desta vez não parou de repente. Limitou-se a utilizar um Shunshin, que praticara durante muito tempo para conseguir enganar os irmãos, mas ainda não estava suficientemente bom para surtir esse efeito, pelo menos completamente. Ela tentou ser o mais rápida possível, mas apenas ganhou o elemento ‘surpresa’ no primeiro momento em que apenas estava a caminhar lentamente pelo trilho com a folha na mão e de repente desaparecera da estrada ficando apenas no seu lugar a tal folha de árvore que tinha apanhado à uns momentos. Mal os irmãos se aperceberam utilizaram a mesma técnica para aparecer mesmo atrás dela enquanto ela pensava que lhes fazia exactamente o mesmo. Os irmãos tocaram-lhe nas costas quando a apanharam surpreendida, apesar de no seu íntimo, mesmo antes de formular o pensamento, saber que afinal tinham sido eles a apanharem-na.
- Eu sabia que eram vocês. – Disse Riri aos irmãos depois de uma pequena pausa para se rirem daquela pequena brincadeira.
- E nós sabíamos que tu sabias que éramos nós.
- Vá, digam lá o que querem.
- Queremos-te dizer que ficamos muito orgulhos hoje, ao ver-te receber o hitayate. – Foi Daiki que disse isto, não o queria dizer de forma demasiado sentimental, por isso esboçava um grande sorriso, apesar de apresentar os olhos muito brilhantes, mas não era só ele que estava assim, o Masaki estava como ele.
- Obrigada – disse ela de forma envergonhada. Apesar de querer que os irmãos se orgulhassem dela e o dissessem, nunca sabia bem como reagir quando lhe eram feitos elogios.
- Bom, acho que agora é o momento indicado para te darmos uma prenda. É uma prenda especial. – Desta vez foi Masaki que falou.
- Uma prenda especial?
- Sim.
- Encontrámos isto numa das nossas primeiras missões. – Daiki mostrou uma espécie de pedra polida, de cor azul clara, não muito comprida e ligeiramente pontiaguda. A pedra estava furada numa das extremidades e por ela passava um fio de cor preta. Riri pegou com cuidado no colar e meteu-o ao pescoço. Quando o fez sentiu um arrepio. – Não sabemos se dá mesmo sorte, mas até agora azar não nos trouxe. Gostávamos muito que ficasses com ele, pode ser que dê mesmo sorte!
- Obrigada! Prometo que vou andar sempre com ele! – Ela deu um abraço apertado aos irmãos, daqueles abraços que só a família sabe dar. Daiki e Masaki sabiam que tinha sido o presente indicado para a sua jovem irmã.
Os irmãos sabiam que era o momento de a deixarem sozinha, perdida nos seus pensamentos e por isso afastaram-se de volta ao usado trilho que os conduziria até casa novamente.
Riri sentou-se ao pé da água e ficou a olhar para o reflexo que as nuvens faziam nela. Aquele era o ‘seu’ lugar, era para ali que ia sempre que queria por as ideias em ordem ou descansar, desde pequena que ia para ali. A água transmitia-lhe muita calma e tranquilidade, uma calma e tranquilidade que não conseguia encontrar em mais nenhum sítio.
Tirou o talismã do pescoço e ficou a observá-lo. Achava-o bonito e enigmático. Não percebera a reacção do calafrio e achava que não tinha sido por acaso. Tinha a sensação que se passava qualquer coisa, mas achava a ideia absurda. “Será que és especial de outra forma que não a que eu te dou?”, pensava Riri. Deixou-se ficar mais um tempo ao pé do lago a pensar, simplesmente, em nada, apenas fitava a água. Pouco depois decidiu que era hora de voltar para casa e dirigiu-se ao velho trilho.