"O que estão olhando? Nunca viram um hipócrita?"Reconheço que me vesti um pouco mais depressa que o normal naquela manhã em que nevava e ventava muito. Era uma segunda-feira qualquer e eu prometi a mim mesma que neste dia treinaria pesado e por isso o meu café da manhã parecia mais um banquete, para deixar-me saudável o suficiente para um treino. Usava apenas um casaco fino, o que seria quase que um incentivo a mais para treinar, como que se quanto mais rápido eu terminasse o treino, mais rápido fugiria da neve.
Ao sair pela porta de casa, grandes pingos caíram em minha cabeça e braços, pareciam queimar de tão frios e atravessavam minha roupa sem muito esforço. Com menos de cinco minutos de caminhada o cabelo escorria no meu rosto, pesado. Meu laço já não se prendia com o penteado mal-feito desmanchado então o guardei, uma estampa de bolinhas negras no meu bolso. Agora eu só teria de me preocupar com as outras coisas, mas mais difíceis: treinar e aprender. Diferente da maioria, uso tênis, logo não há perigo deles escaparem de meus pés.
Depois dos dez minutos esfriando na corrida, chego ao campo de treinamento improvisado. Basicamente uma árvore desfolhada, gelo, gelo e um boneco de estatura média feito de madeira. "Por onde começar?", me pergunto. Analiso o que tenho a disposição e o que mais me salta aos olhos é a árvore seca. Tento me lembrar do que estava escrito naqueles velhos livros de ninjutsu da biblioteca. Prender-me à árvore usando puro chakra nos pés. Não parece ser difícil.
Primeiro de tudo, uso minha katana para cortar os longos cabelos que me caem sobre a face. Quanto mais curtos, menos atrapalham. Tiro também a blusa que por cima de minha camisa, jogando-a no chão. Então você poderia ter uma visão de mim: cabelos curtos e pretos, tatuagem de um verso no antebraço esquerdo, camiseta de um super-herói - Superman, se quiser saber - e os olhos castanhos agora pálidos, diferentes do tom assassino intenso que às vezes tomava. Por último e não menos importante: meu cabelo ainda está com cheiro da tinta preta que tive de passar para ficar assim. Uma garota descobrindo que subir em árvores não é tão fácil assim.
Concentrar chakra nas pontas dos pés é um tanto difícil, assim como tentar deixa-los quentes. Deve haver algum truque, é óbvio que há algum truque. Mais de uma vez caí de costas no chão. Tento agora fazer diferente: levarei a katana. Um. Dois. Três passos na madeira e antes de ser jogada contra o chão finco a lâmina contra a árvore e me apoio nela, dando impulso de continuar andando. Mais quatro passos desta vez e sou lançada contra o solo frio.
Levanto-me, olho pra mim mesma. O azul da camisa tornou-se marrom. Decido trocar de treino um pouco, envolver algo que não seja tão técnico. Começo a golpear o boneco de madeira como se ele tivesse xingado minha mãe. Meus braços e pernas começam a se cortar e no mesmo instante que o sangue saia, coagulava com o frio. Com os membros insensíveis, prossigo atacando até que vem o risco de que meus braços se quebrem. Caio no chão, exausta.
"Por que é tão difícil?" Falar consigo mesma, primeiro sinal de loucura.
Um minuto de descanso e me levanto, para correr em volta do campo, aquecer meu corpo que quase em estado de fusão. Cinco, seis voltas num amplo espaço que poderia ser uma quadra de futebol e meu corpo começa a exalar vapor, deixando um rastro por onde passo. Na décima volta, venho a voltar e atacar os bonecos, já com novo fôlego. Esta idiotice foi repetida cinco vezes antes de eu voltar a tentar subir a árvore. Com uma pouca reserva de energia física para transformar em chakra é mais fácil administra-la. Respiro fundo, parando de ofegar pela primeira vez em horas. Sem em mover por meio minuto, concentro o chakra na sola dos pés e corro contra a árvore, pulo, quando encosto-me à madeira, a energia me ioniza com ela, fazendo com que eu possa correr exatamente como no chão.
Em êxtase por ter concluído uma técnica, decido treinar minha habilidade com armas. Retiro a katana de minhas costas quando chego ao topo da árvore. Corto-lhe um galho do tamanho de meu braço e espero ele estar a dois metros do chão, para avançar contra ele e faze-lo em pequenos pedaços antes que se encoste ao gelo. Tal treinamento falho nas primeiras cinco vezes. Na sexta que fui conseguir destruir um galho de árvore antes de tocar o chão e neste momento todos os músculos do meu corpo gritavam por descanso imediato.
Volto pra casa em passos lentos e a primeira coisa que faço é me olhar no espelho. Não, não pareço nem um pouco majestosa. Foi depois de um banho que percebi: precisava dormir por cinco dias inteiros.