Agradecimento
~ Porque os amigos estão sempre lá ~
Suspirou e cruzou os portões da vila de pedra, rodeada de edifícios altos e frios. Compreendia porque é que os seus pais tinham saído da vila, ainda que isso tivesse levado à morte deles. Também não gostava do local. Konohagakure, por outro lado, tinha o calor que ele sempre procurara e fizera-o esquecer da amargura de ser expulso de casa dos avós, apesar da má disposição com que ficava sempre que via os vizinhos.
- “Especialmente aquela rapariga…” – pensou Yuu, vagueando pelas ruas de Kumogakure em direcção à grande casa dos Fujishima. – “Basta olhar para ela para ficar doente…”
A casa já se via ao longe. Era uma das casas mais abastadas da vila, com detalhes de um metal brilhante e paredes de pedra branca, com o jardim que era possível ter numa área tão árida. Tinha um grande portão de metal, com um guarda 24 horas por dia.
Yuu nunca compreendera a necessidade do guarda, mas não iria questionar os avós. Eles que fizessem o que queriam com o dinheiro deles, ainda que fosse uma má utilização do dinheiro dos contribuintes. Perguntou-se porque é que ninguém em Kumogakure se revoltava, mas rapidamente soube a resposta. Ninguém queria iniciar uma afronta contra uma família nobre, especialmente uma com tanto poder sobre a vila. Era uma declaração de morte certa.
Mostrou o brinco com a glicínia ao guarda e entrou na grande casa sem esperar ser recebido. Sabia que o avô estaria no escritório.
O mordomo apareceu num passo apressado e deu-lhe as boas-vindas com uma vénia, questionando ainda se havia alguma coisa que pudesse fazer. O jovem parou e reflectiu.
- Pode-me confirmar se o avô está em casa?
- Sim, senhor. O senhor Fujishima já retornou – respondeu o homem, respeitosamente. - Deseja que lhe sirva alguma coisa?
- Não preciso de nada, obrigado. Traga o que o avô quiser, como é habitual.
O mordomo anuiu e prosseguiu para a cozinha para avisar alguma empregada. Yuu dirigiu-se à porta à sua esquerda e bateu. Esperou por uma resposta para tirar o calçado e entrar pela porta deslizante.
- Yuu – disse secamente um senhor idoso atrás de uma grande secretária, coberta de papéis. O homem não lhe dirigiu o olhar, o que magoou o neto. - Que te traz por cá?
O rapaz sentou-se correctamente antes de continuar a falar para agradar ao avô. Joelhos juntos, postura correcta. Qualquer gesto poderia ser reparado por ele e ganharia pontos a seu favor. Ou assim esperava.
- Os Sakuragi receberam visitas recentemente. Pelos uniformes, seriam mandados pela família principal. Era uma convocatória – declarou ele. Acrescentou ainda em jeito de análise. - Parecem preocupados ou, pelo menos, com alguma pressa.
O senhor acariciou a sua barba aparada e pensativa. Yuu estava a portar-se bem. As suas visitas tinham-se revelado bastante úteis. Ter um espião que os seus inimigos nem desconfiavam era perfeito. E, segundo ele, a família principal parecia desejosa de ter os netos na villa. Sabia que o mais velho já tinha lutado, mas agora entraria também uma das netas, uma desconhecida. Teria também aquele sangue imundo a correr-lhe nas veias. Era um alvo a abater. E, para isso, tinha que ser estudada.
- Bom trabalho, meu filho. Vigia principalmente a rapariga. Ela é que é a novidade – retorquiu o senhor com uma centelha de orgulho na voz.
***
Apesar do sol brilhar em Konoha, desde a visita dos oficiais dos Sakuragi que a luz aparentava não entrar na casa dos Midori.
Nadeshiko tinha-se recomposto um pouco, mas continuava com medo. Kazuma provavelmente estaria forte o suficiente para se defender de qualquer um. Ayame era muito jovem e nunca estivera na presença de alguém que desejasse sangue. O sangue dela. Amava Seishirou e nunca se arrependera de ter fugido com ele. O seu único desejo era que simplesmente a deixassem seguir a vida dela com a sua família sem os envolverem nas guerras políticas. Que a deserdassem. Ela não queria nada dos seus pais.
A jovem kunoichi, que todos reconheciam como o raio de sol da casa, acabara por adquirir algum do medo da sua mãe. Tinha receio de não ser suficiente, de ser um fardo. Queria ser forte, independente, para não preocupar aqueles que amava. Até lhe custava sorrir ao ver a mãe com os olhos inchados de chorar durante a noite.
As visitas dos tios ajudavam a quebrar o ambiente pesado que se instalara em casa. Mirai e Hikaru também começaram a frequentar mais a casa, pois sabiam que a presença deles os fazia esquecer temporariamente da dor.
Naquele dia, Ayame acordara sem vontade de treinar. Sentia-se deprimida, algo incomum, e odiava forçar-se a fazer alguma coisa. Decidiu levantar-se e, pelo menos, ajudar em casa. Ainda sentia necessidade de ser útil a alguém. Foi à lavandaria e pegou no cesto da roupa suja para limpar todos os cestos da casa. Estava a descer as escadas com o cesto cheio, quase sem visibilidade, quando lho foi retirado.
- Oh… Hikaru… - balbuciou a kunoichi, surpreendida. Sentia-se um pouco envergonhada ao enfrentar o médico, pois deveria estar com ele a treinar e estava em casa. A sua justificação não era válida no seu ponto de vista.
- Eu dou-te uma ajuda. Não custa nada – disse ele, levando o cesto cheio para a lavandaria. Não fora capaz de a repreender depois de a olhar nos olhos. Neles pairava o medo, a incerteza. A falta de confiança nas suas capacidades. Ela não era capaz de entender que tinha uma grande vantagem acima dos seus adversários, a sua kekkei genkai. Tinha que trabalhar a confiança dela o quanto antes.
A rapariga apenas o seguiu em silêncio, sem saber o que dizer. Não tinha desculpa para a sua atitude.
O jounin conhecia os cantos à casa desde pequeno. Os Midori eram quase como família. Por isso rapidamente arrumou a tarefa.
- O Kazuma está? – perguntou ele enquanto fechava a porta da lavandaria.
Ela abanou a cabeça, juntando as mãos de forma nervosa.
Hikaru suspirou e puxou-a para si para lhe dar um abraço e parar com o tique nervoso:
- Não gosto quando fazes isso. Não pareces a Ayame que vi crescer. Obviamente temos aí alguma coisa a trabalhar, mas falamos disso mais tarde.
- Desculpa… - murmurou ela ainda nos braços do ruivo.
- Vá. Tu és melhor que isso – tentou animá-la e afastou-a um pouco para a olhar nos olhos. Adicionou como brincadeira: – Amanhã não tens perdão. Olha que venho cá e arrasto-te da cama se não apareces. E sabes bem que eu cumpro o que digo.
Ayame não resistiu a rir. Ele cumpria sempre as promessas, não havia dúvida. Já o conhecia há anos suficientes para saber isso. Era um traço que ela sempre admirara nele, ainda que às vezes levasse as coisas demasiado a sério. Mas, se havia pessoa a quem se podia chamar de amiga, Hikaru era o exemplo. E isso não haveria de mudar, mesmo enquanto sensei dela.
- Vou buscar chá para nós – ofereceu ela, correndo em direcção à cozinha.
- Não é preciso.
- É chá de erva-príncipe e baunilha – disse ela. – O teu favorito.
- Bem cheio, por favor.
Ouviu-se uma risada de Ayame na cozinha. Era óbvio que ele se estava a esforçar para a fazer rir e assim sair daquele estado depressivo tão incomum na luz que ela era. Hikaru estava sentado na sala quando ela se aproximou com dois copos de chá frio e os serviu.
- Bem, o Kazuma não está, mas estás tu. Depois podes contar-lhe – confessou ele depois de beber um grande gole de chá. – Se houvesse a possibilidade, gostava de vos acompanhar sempre que puder. Seja para ir ao torneio ou qualquer outro sítio. Não posso prometer que possa ir sempre, mas pronto. – Ele fez uma pequena pausa e continuou ao perceber o silêncio de Ayame: - Estás a perguntar-te porque hei-de fazer isso, não é? Porque o Kazuma é meu amigo, porque tu também o és. E isso está acima de qualquer contrato de ensino entre nós. Quero estar lá para vocês tal como vocês estiveram comigo todo este tempo.
- Eu… - balbuciou ela, claramente embaraçada com as palavras bonitas. Não esperava ouvi-las. – Eu… Só posso agradecer…
Hikaru acabou de beber o chá e sorriu:
- Não tens que agradecer, tolinha. No que puder ajudar, sabes que estou aqui. Agora tenho que voltar para o hospital – disse ele, olhando para o relógio. – Espero ver-te lá dentro de uma hora ou venho buscar-te a casa.
- Não era amanhã? – perguntou ela, num ar surpreendido e que tentava abafar o riso que dançava na sua voz.
- Para quê deixar para amanhã o que podes fazer hoje? – finalizou o jounin com um sorriso malicioso. O sensei implacável voltara a surgir.
- Spoiler:
E sim, está terrível, mas lá me forcei a escrever. A ver se faço alguma coisa desta personagem, já que tenho a história planeada e tenho -.-