Presságio infantil

Um grito estridente ecoava ao longo do deserto, acompanhando uma mancha negra que o atravessava a uma alta velocidade, mostrando um percurso aleatório e aparentemente sem fim. Atrás dessa mancha negra seguia-se uma amarela, que parecia ser uma longa faísca, movendo-se em sucessivas explosões de velocidade.
- Raiton – Oonami Tenka! – Ouviu-se a voz feminina. Uma grotesca camada de chakra atravessou a mancha amarela, controlando muita da eletricidade para formar uma súbita corrente que se conduziu pela areia do solo, mais rápida que ambas as nuvens. Quando chegou ao centro da nuvem negra, explodiu numa saraivada de pequenos mas destruidores relâmpagos, sucedendo-se o grito mais estridente que se ouvira – Apanhei-te!
A nuvem de eletricidade desfez-se ao mesmo tempo que a negra, e Roumi pousou sobre a areia suavemente, levantando uma pequena poeira que depressa se afastou com o vento do local. A criatura, que derivou da dissipação da nuvem, cheirou o ar, não se apercebendo da presença da humana imediatamente. Nesse momento, a mercenária de Kumo avaliava-a. Havia resistido àquela sua técnica tão poderosa...
- Sim... Três humanos... Maravilhoso! – A criatura virou-se para Roumi, fitando-a com as suas órbitas roxas, inumanas. Da sua boca amordaçada saía um inexplicável vapor, mas o mais estranho era a constante aura negra que brotava, sem esquecendo os seus braços que pareciam ser uma garra e uma besta, modificados para uma aparência mais sombria e aterradora – Venham... Precisamos de... Mais energia...
Três? Roumi focara-se tanto em perseguir a criatura que não se apercebera que, se calhar, outras pessoas também a perseguiam. Olhou para trás, permitindo-se a tal mesmo tendo um adversário poderoso a sua frente, para ver Arami a correr na sua direção, visivelmente cansado pela velocidade alta que mantinha sobre aquele Sol impiedoso. Este parou após estar relativamente perto, fitando Roumi.
- Ainda não acabamos o nosso assunto, mulher! – Gritou, tentando não parecer cansado para mostrar que ainda tinha vigor para muito mais, apesar da respiração ofegante e o suor na cara o traírem. Desembainhou a Kamitsuchi e reparou por fim na criatura negra, que também olhava para ele – Quem és tu?
- Somos algo... Muito mais antigo... E sábio... Que vós... Carne humana! – Apesar da sua estatura humana, nada na criatura era igual a tal. A sua voz era profunda e sinistra, a sua cara coberta pela longa cabeleira, que revelava apenas duas órbitas roxas e uma longa boca muito mal amordaçada. O Akatsuki já lutara com muita coisa, mas nunca vira nada parecido... – Humanos...
A criatura inspirou profundamente uma densa quantidade de ar. Sem entenderem o que se passava, os dois humanos, também adversários entre si, meteram as mãos as armas e preparam-se para o pior. Tão focada na luta, Roumi esquecera-se que a criatura ainda havia cheirado mais uma pessoa perto daquele local.
Um longo e destrutivo raio negro foi expirado da sua boca amordaçada, percorrendo o cenário rapidamente e ameaçando a vida dos humanos. Roumi conseguiu saltar e ainda foi a tempo de arremessar uma adaga na direção da criatura, ocupada a expelir aquele longo ataque, mas Arami sabia que não era assim tão rápido. Rodopiando a Kamitsuchi na sua mão, cravou-a no solo arenoso e dele ergueu duas paredes de terra como defesa. Todavia, para sua infelicidade, as paredes não se revelaram suficientes para tanta destruição concentrada num único ataque, que as atravessou como se fosse papel e atingindo o Nukkenin violentamente, causando uma explosão que projetou o seu corpo para trás. Sem se preocupar com o seu “companheiro” humano, Roumi arremessou mais um par de adagas, estas potenciadas com o seu Raiton. Findo o seu ataque, a criatura celebrou por ter atingido o humano com um estridente grito, mas depressa mudou a atenção para a que sobrevivera, e que agora a atacava. A sua garra cresceu consideravelmente de tamanho, excedendo a própria criatura, e num movimento livrou-se de todas as adagas arremessadas pela inimiga. Algumas explodiram intensamente em eletricidade, mas o manto negrou abafou-as sem qualquer consequência, voltando para o seu tamanho normal. Os olhos de Roumi arregalaram-se quando viram o monstro a cuspir para o ar duas velozes rajadas de essência negra, que não demorariam a separar o corpo da humana em dois. A mercenária teve tempo de realizar um selo, trocando de lugar com uma das adagas arremessadas por si. Surgiu assim algo afastada da criatura negra, que estava de costas para ela, e suspirou de alivio.
Finalmente, Arami acordou, o seu peito a bater constantemente e a sua cara ainda a suar. Ergueu o tronco e depressa sentiu nas costas a sua roupa queimada a perturbar-lhe. Levantou-se por completo, percebendo que todo o seu corpo ardia intensamente, mal o conseguindo mover. A sua pele de pedra, mais uma vez salvadora, desfez-se em pequenos calhaus que se perderam por entre a areia do solo, e o Akatsuki olhou para o seu peito. A roupa que o cobria desaparecera por completo e a pele que protegia os seus pulmões estava completamente queimada, mas não passara além disso. Aquele ataque fora devastador, atravessara três defesas do criminoso e mesmo assim fora capaz de destruir as roupas e quase o matar... Que monstro era aquele?
Olhou a sua volta e encontrou a sua espada, estendendo a mão e deixando que ela viesse ter com ele. Segurando firmemente na Kamitsuchi, a sua fiel companheira, ergueu o olhar e procurou os seus adversários. Não demorou muito para ouvir um estridente rugido. Num Sunshin, surgiu por cima da duna que o separava da criatura negra e da sua oponente, que se gladiavam freneticamente entre manifestações de energia negra e eletricidade.
- Não sei quais são os assuntos entre a Roumi e aquele maldito bicho... – Num prodigioso salto, atravessou a longa descida da duna e pousou violentamente sobre o solo arenoso que abafou a sua queda, a metros dos seus inimigos – Mas quando começo uma luta... – Rodopiou a sua Kamitsuchi e bateu com ela no solo, criando uma sucessão de sismos que desequilibrou os que lutavam entre si, prendendo-lhes a atenção – EU ACABO-A!

- Que porra estás a fazer, Arami? – Pensava Katsu enquanto mantinha a concentração no turbilhão de água a seus pés constante – Estás a estragar o plano todo, otário! - O que acontecera ao raio do seu companheiro? Por que havia ele fugido do templo, quando ainda nem sequer haviam completado a missão? A líder da organização dissera para que confiassem um no outro e que se dessem bem. Graças aos esforços do Imagawa, os dois desenvolveram uma relação saudável o suficiente para que ultrapassassem as suas divergências e trabalhassem com eficácia. Mas naquele momento, Katsu só tinha vontade de esganá-lo – Onde é que estás tu?
O seu olhar atento observava cada duna no local, a espera de atravessá-la e encontrar o seu maldito parceiro com explicações do que estava a acontecer. Contudo, tal nunca chegava a acontecer e Katsu perdera por completo o seu rasto. Ainda com muito chakra para usar o turbilhão de água por horas, decidiu que não se iria embora até encontrar um vestígio qualquer do Arami. Tão distraído que estava, não percebeu que a água que controlava como meio de locomoção revelava, de vez em quando, tons dourados e verdes.

- Sekima! Sekima! – Ecoava uma voz feminina, grossa, no longo corredor bem iluminado. Uma silhueta passou pelos diversos quadros, que retratavam inúmeras batalhas sangrentas e algumas conhecidas, por cómodas e plantas de variadas proporções – Sekima! – Não havia resposta aos seus chamamentos – Lá porque fico na mansão não é desculpa para andar a tomar conta de pirralhas! Malditos Imagawa...
Retornou aos seus chamamentos, continuando pelo corredor a fora, decidida a encontrar a criança noutro canto qualquer da enorme mansão.
Debaixo das escadas, que conduziam do rés-do-chão para o primeiro andar, onde Sasami a procurava, Sekima Imagawa ria infantilmente. Desde que o seu pai fora embora, há umas semanas atrás, que o ambiente naquela mansão se tornara aborrecido. Passava os dias com Sasami, era ela que lhe fazia a comida e ajudava em muitas outras coisas, contrariada obviamente, e a pequena passara a gostar muito dela, mas o seu pai carinhoso e brincalhão era insubstituível. Sentia saudades, pelo que começou a pensar nele. Nesse momento, sentiu um choque inexplicável no braço direito. Ao início sobressaltou-se, lançando um ligeiro gemido, ouvido pela Akatsuki que retomara a gritar o seu nome, cada vez mais perto, e olhou para o braço. Demorou alguns segundos até que o choque se repetisse, levando-a a soltar um gemido mais longo e alto.
- Que se passou, pirralha? – Gritou Sasami, finalmente ciente da posição criança, saltando por cima do corrimão e aterrando precisamente a frente da sua presa – Não tenho paciência para as tuas pirralhices! Anda, preciso de ti para uma coisa!
Mas a Imagawa nem ouvira a adulta. Não parava de olhar para o seu braço direito, que ocasionalmente tremia em choque, como se tivesse possuído. A sua mente, apesar de focada no estranho evento, ainda não varrera as imagens do seu pai e as saudades. Foi aí que ela chegara a uma conclusão, a algo que ela não sabia explicar...
- O pai! – Gritou subitamente, prendendo a atenção da mulher – O papi está em perigo!
A Akatsuki limitou-se a erguer a sobrancelha com um semblante de dúvida.
- És apenas uma pirralha, como é que vais saber? – Perguntou num tom jocoso, acocorando-se para fitar a criança assustada – O teu pai é um Akatsuki, pirralha, que está acompanhado por outro Akatsuki. Além disso, a missão deles nem era grande coisa, tenho a certeza que estão bem! Agora, vamos, preciso de ti! – Tentou agarrar no braço de Sekima, mas esta afastou-a, correndo para fora de debaixo das escadas e precipitando-se para a porta da mansão que conduzia para o exterior – EI! Onde é que vais?
- O papi está em perigo! – Berrava esta na sua voz infantil e doce – Ele está com dor, tenho de ajudar!
A Sasami esgotara a paciência, preparando-se para mandar o derradeiro grito que certamente colocaria a criança insolente no devido lugar. No entanto, a voz escapou-lhe quando percebeu o vulto que se esgueirara para a frente da porta e que agarrara Sekima pelos ombros, impedindo-a de sair. Esta não estrebuchou, limitando-se a tentar fitar o vulto.
- Gaina-sama! – Gritava a pequena, agarrando os pulsos da mulher a sua frente e apertando-os fortemente. A sua voz revelava no seu tom infantil algum desespero e súplica – O papi, o papi está em perigo! Temos de ajudar!
O grito que a pouco quisera lançar retornou a voz de Sasami, que tentaria mais uma vez impor respeito na criança. Todavia, uma voz serena e calma antecedeu-lhe.
- Tem calma, minha pequena – Pronunciou a voz de Gaina, as suas mãos retornando o aperto que Sekima lhe dava – É natural sentires isso – A mulher estendeu o braço direito e mostrou como a sua pele também tremia, numa intensidade igual a de Sekima – Aconteceu-lhe alguma coisa, eu já vou ajudá-lo.
- Obrigado, Gaina-sama! – Agradeceu a pequena, soltando o aperto e abraçando-se fortemente a cintura da mulher, esta que soltou uma leve risada e lhe afagou os cabelos – Obrigado, obrigado!
- SEKIMA! – Gritou Sasami, cada vez mais irritada com a irresponsabilidade da criança – Não abraces a líder! Perdoe-me líder, não consigo controlar esta coisa!
Uma risada doce e calma amainou-lhe a raiva.
- Acalma-te também, minha querida Sasami. Eu volto já, meus amores. – Despediu-se Gaina, apartando ligeiramente o frágil corpo da criança de si. Esta limpou uma lágrima que lhe escorreu pelo olho direito, que fez Gaina sorrir disfarçadamente enquanto unia um selo e deixava chakra fluir pelo corpo – Tensō no Jutsu!
Num pequeno raio branco, o vulto desapareceu do cenário, deixando para trás uma criança triste e preocupada e uma Akatsuki irritada.