A pressão do Torneio

Guiada pela criança que garantia conhecer o seu parceiro de equipa, Ayame ponderou se a sua decisão não tinha sido demasiado precipitada. Olhando para Sekima Imagawa, uma criança pequena de cabelos grisalhos e olhos torrados com uma aparência a rondar os oito anos, tentou não duvidar que alguém tão novo assim a estaria a enganar, pelo que se deixou guiar pela sua mão. Cruzou alguns corredores de um hotel medíocre (havia muito melhor em Cha no Kuni) até pararem à frente de uma porta. Quis bater antes de entrar, se não fosse Sekima a abrir a porta e puxar Ayame para dentro com um sorriso.
- Papi! Trouxe a tua amiga! - Anunciou no seu tom infantil, continuando a puxar a adolescente para a sala, na qual residia uma mesa quadrada com um cesto de maças em cima, arrastando uma cadeira para ela se sentar - Come uma maça, são muito boas! Fui eu que as apanhei!
Agarrando uma delas, a Midori pensou no que ouvira. Onde é que ela fora apanhar aquelas maças se estavam no centro da vila de Cha no Kuni, longe de qualquer pomar ou quinta com macieiras?
- Só espero que aquele senhor barrigudo não descubra que fui eu... - Suspirou a pequena com a maior das confortabilidades, nunca fechando o seu sorriso doce e imaturo. A Chunnin engasgou-se logo com o pequeno pedaço que trincara... Eram roubadas...
- Para de gritar, pequena... - Ouviu-se uma voz grossa vinda do corredor, surgindo um homem alto com o tronco musculado nu e uma toalha presa pela cintura a cobrir as pernas. Os seus olhos pretos como o carvão encontraram uma adolescente sentada na sua mesa a fitá-lo, extremamente corada - Trouxeste uma amiga?
A Midori gaguejou algumas palavras sem nexo, desviando a cara para evitar fitar por muito mais tempo. Embora envergonhada com a situação, sabia ter respeito pela privacidade dos outros.
- Não, papi! É ela, a Ayame Midori daquele papel estranho que recebeste! - Explicou-se a criança, reparando então, pela primeira vez, nos poucos trajes do seu pai - Veste alguma roupa, temos visitas!
O Akatsuki piscou um olho à sua filha, que colocara ambas as mãos sobre a anca para transparecer uma melhor imagem da sua irritação, encaminhando-se para se sentar à frente da convidada. Quando passou pela sua filha, afagou-lhe os cabelos com a mão livre, já que a outra estava ocupada a secar o longo cabelo, movendo-se de seguida para empurrar a cadeira de forma a sentar-se.
- Espero que a minha filha não te tenha perturbado muito. É chatinha mas lá no fundo é um amor de pessoa. - Desculpou-se Katsu, olhando de sobrolho para Sekima, que o tentava fitar com uns olhos adoráveis de fúria, mantendo-se atento ao comportamento da sua suposta parceira que evitava o seu olhar - Pareces tão nova para este tipo de coisa, achas que aguentas?
Descontente com as palavras, a Chunnin virou repentinamente a cara, fitando-o com uma seriedade que o Imagawa não julgava ser possível colocar numa cara tão bonita.
- Eu acho que entre nós os dois sou quem melhor sabe se estou ou não apta para o torneio! - Respondeu com alguma aspereza na voz, surpreendendo Sekima que até então apenas a julgara como um doce de pessoa. Como se tentasse dar mais emoção ao que dizia, levantou-se e bateu com ambas as mãos sobre a superfície da mesa - Se duvidas assim tanto mostro-te já aqui o que valho! Não suportei tudo o que suportei até agora, não treinei tanto para crescer o mais que podia para não ser um fardo para continuarem a duvidar de mim!
Algo surpreso pela súbita reação, Katsu suspirou, passando uma última vez a toalha pelo seu cabelo negro. Levantou-se da cadeira e virou as costas a ambas as raparigas, Ayame nesse momento a achar que talvez tivesse exagerado no que disse, retornando para o corredor do qual viera.
- Se queres assim tanto... Vou só mudar de roupa e já nos levas a um sítio bom para treinarmos. - Acabou por dizer antes de desaparecer, deixando uma Sekima algo nervosa com uma Ayame ainda corada por toda a situação.
Quando voltou para a sala, já completamente vestido, reparou nas duas às gargalhadas entre si, falando de assuntos banais e que pareciam incrivelmente engraçados para elas. A conversa era conduzida pela Midori que fazia imensas perguntas sobre a vida de Sekima, esta respondendo com bastante alegria e rindo-se à medida que ia contando as suas aventuras com o seu pai. Reparou que a criança estava sentada no colo da Chunnin, agarrada pelos seus braços num abraço carinhoso.
- Porra, só as deixei sozinhas por uns minutos e já andam aos abraços! - Pensou, surpreso pela velocidade em que as duas se aproximaram, caminhando para a frente da mesa até atrair a atenção delas - Bem, parece que só eu é que ainda não me apresentei! Chamo-me Katsu Imagawa, pai da pequena que tens aos braços, e líder da Akatsuki.
Ayame abriu a boca de espanto por alguns segundos. Líder da Akatsuki? Ninguém a tinha avisado sobre isso... Sabia que o seu parceiro era um Akatsuki, e demorou algum tempo a acostumar-se com a ideia, mas não sabia que era o líder... Respirou profundamente. Parecia simpático e até agora não causara nenhum problema, que ela soubesse, pelo que se calhar não lhe aconteceria nada de errado. Mas estar atenta não faria mal nenhum...
- Eu sou Ayame Midori, como já deves saber... - A voz saiu mais fraca do que estava à espera, mas no momento já não tinha volta a dar - Sempre é para ir treinar?
O Imagawa afirmou com um abanar de cabeça, não esperando qualquer outra palavra ao se dirigir para a porta. A Midori percebeu que a filha dele suspirou, embora não entendesse o porquê, empurrando a cadeira para trás para lhe dar espaço para ir para o chão. Seguiram o silencioso Katsu pelo prédio abaixo, distraindo-se uma à outra com o resto da sua conversa que fora interrompida. Quando chegaram lá fora, as suas risadas cessaram aquando a súbita volta do Imagawa.
- Muito bem, Ayame. Leva-nos para um sítio bom para que possas exibir-te um pouco... - Falou sem muita emoção, o seu olhar a evitar o das duas raparigas, perdendo-se em algo que certamente nem estava a prestar grande atenção.
Desconfortável com a distância que o seu parceiro estava a criar, a adolescente puxou a criança pelas costas e tomou a dianteira da caminhada. Lembrava-se que havia um campo de treino nas proximidades que não era muito usado pelos participantes dos eventos, decidindo-se a ir para esse. O Imagawa seguiu-as, pensativo, nunca intervindo na conversa animada delas.
Surpreendeu-se quando subitamente pararam. Ia tão distraído que quase chocou com Ayame quando esta parou à frente de uma vasta planície com algumas árvores. A planície era rodeada por uma larga rede, demasiado alta para que uma pessoa a pudesse escalar (até para Katsu), que a cobria perfeitamente, tendo a sua única falha transformada na entrada com uma placa de madeira à frente com as palavras "Campo de Treino" inscritas. Entraram calmamente e o olhar atento do Akatsuki notou dois homens, um pouco distantes, a trocarem entre si alguns golpes com kunai.
- Pensei que era suposto não ser muito usado. - Comentou, mesmo não se sentindo desconfortável com a presença daqueles homens. Não esperou pela resposta de Ayame, afastando-se dela com alguns passos e olhando para ela pacientemente - Mostra lá o que vales.
Quando o momento chegou, a Midori percebeu que estava um pouco mais nervosa do que estava à espera. Sekima recuou alguns passos para lhes dar espaço, sentando-se encostada à rede e agarrando algumas flores próximas a si para se distrair um pouco. Respirando profundamente para se concentrar, Ayame começou a reuniur algum chakra na relva à sua frente, preparando-se para mostrar o seu melhor Ninjutsu no intuito de impressionar o seu parceiro de equipa.
- Ei, o que estão a fazer! - Uma voz grossa interrompeu a sua concentração, fazendo-a parar o controlo de chakra para virar para o lado e ver que os dois homens, que outrora estavam a lutar entre si, se aproximaram deles com semblantes muito insatisfeitos - Nós estávamos aqui primeiro, não repararam?!
A Chunnin não gostou da agressividade dos dois homens, tanto na voz como nas faces, notando que ambos eram Jounnin de Kirigakure devido às suas bandanas e coletes de proteção azuis. Olhou para Katsu que parecia indiferente ante a hostilidade.
- Acho que há espaços para todos nós treinarmos. - Respondeu sucintamente, virando a cara para fitar Ayame - Agora dêem-nos espaço, temos umas coisas para fazer.
Num grunhido enraivecido, um dos homens arremessou violentamente uma kunai que rasou na testa de Katsu, muito próxima a atingi-lo mortalmente. Explodindo de raiva por dentro, a adolescente estava preparada para gritar com eles, mas a mão aberta do Imagawa conteve-a. Este virou-se para os Jounnin de Kiri, fitando-os friamente.
- Vocês estão a participar no Torneio de Todos os Ranks?
- Obviamente e é por isso que vos estamos a pedir tão gentilmente para saírem do nosso campo de treino - Respondeu um deles, sempre com demasiada agressividade, olhando para a testa do Akatsuki e notando a sua bandana - E parece que tens sorte que estamos em tréguas, senão já te tinha colocado na prisão!
- Nós temos tanto direito como vocês a treinarem aqui. Afastem-se... - Pediu o Imagawa, controlando-se para manter sempre um tom respeitável, mesmo que Ayame reparasse que o seu punho estava firmemente cerrado.
- Sabes que mais, Uysho? - Perguntou um dos homens para o seu parceiro, desembainhando uma katana das suas costas - Que tal treinarmos com este idiota? O seu olhar nojento está mesmo a pedi-las!
Uysho gargalhou, acenando com a cabeça cheio de emoção, arrumando a sua kunai no bolso e colocando ambas as mãos em forma de um selo.
- Vocês não querem fazer isso. Só quero desclassificar os meus adversários em combates oficiais... - Pediu ainda com o seu tom educado, notando que ao seu lado apareceu Sekima, agarrando na sua mão cerrada com carinho.
- Vamos lá, Nukenin! Mostra-nos se és assim tão bom ou precisas dessa criancinha para lutar por ti?!
Não havia volta a dar então Katsu desistiu de continuar a tentar. Agachou-se, murmurando algumas palavras no ouvido da sua filha, que ia acenando afirmativamente com a cabeça com entusiasmo, e voltou a erguer-se, fitando ambos os seus adversários com desinteresse. Uysho não pareceu gostar da reação, realizando alguns selos para expirar um potente jato de fogo. Num gesto de mão ascendente, Katsu criou um feixe de água demasiado resistente para ser destruído pelo Katon, transformando-o em uma cortina de vapor que cobriu temporariamente ambos os Nukenin. A criança surgiu num veloz salto, parando entre ambos os Jounnin que se surpreenderam com a velocidade dela.
- Desculpem! - Disse, antes que a sua perna se esticasse para acertar o estômago de Uysho, que se esgueirou em frente com falta de ar, e esticando a palma da mão direita contra o abdómen do outro Jounnin - Suiton: Suihachi! - Pronunciou, projetando um forte jato de água que atingiu o kirinin e o empurrou alguns metros atrás, fazendo-o grunhir com as dores no estômago.
Quando se preparou para retaliar na criança, Katsu surgiu atrás de si com um Shunshin, focalizando o seu chakra na água restante da técnica da sua filha para criar duas pequenas lâminas que se esticaram desde o abdómen do alvo até as suas pontas afiadas assentarem no pescoço do mesmo, fazendo-o parar imediatamente ao perceber a situação sem saída em que estava.
- Dogu! - Gritou Uysho, recuperando-se do chute que levara ao erguer-se e tentar correr na direção do seu parceiro de equipa em perigo, sendo novamente intercetado por Sekima - O que queres, criança de merda?!
- Não se dizem asneiras! - Admoestou Sekima, espalhando o seu chakra no ar atrás de Uysho para criar uma dezena de agulhas de água com o seu Sensatsu Suishō, cravando-as todas nas costas do Jounnin, que uivou de dor à medida que se estatelava no chão.
Afastada da luta que acabara tão rapidamente, uma Ayame boquiaberta espantava-se com o poder daqueles dois foragidos. Onde é que ela se fora meter agora...