A pequena fogueira crepitava no centro da sala de piso elevado, onde uma chaleira de bronze vertia um pouco de vapor d´água com o ruído suave de fervura. O vento gélido da madrugada atravessava o espaço onde existia uma janela lateral, enquanto um jovem pálido varria os cacos da vidraça tentando manter-se em silêncio para não incomodar Junchei. A mulher ainda não se recuperara do desmaio repentino e agora descansava num pequeno colchão junto à lareira. Enquanto isso, Kimura terminava de juntar o vidro quebrado, caminhando com passos suaves através da porta dos fundos, onde despejou todo lixo num pequeno balde ao lado dos degraus, quando percebeu uma pequena trilha de barro que levava até um pequeno galpão. - Deve haver alguma coisa lá para usar como reparo na janela. - Pensou o garoto, preocupado com o frio que aumentava consideravelmente desde que as nuvens de chuva foram embora. Não foi difícil encontrar o que queria. Carregando de volta uma folha fina de madeira, além de pregos e martelo, ele cambaleou com toda a carga de volta ao aposento onde o cheiro de chá de ervas indicava que a chaleira soaria há qualquer momento. Rapidamente o jovem fechou a janela e tomou um pano para proteger sua mão para servir o chá em duas xícaras que deixara numa bandeja de bambu.

- Percebi que estás acordada. - Disse o chuunin, tomando o líquido quente com seriedade.
- Matarei seu pai, e toda sua família. - Respondeu entre soluços, num gemido cansado.
- Mas por quê? O que está acontecendo?! - Kimura perdeu a paciência.

Nada daquilo fazia sentido. Porque seu pai mataria sua irmã? E porque Junchei tinha certeza do que acontecera? E o mais importante: Quem era ele. Estas dúvidas nortearam seus pensamentos desde que Katsume lhe entregou aquela foto. Lá, sua mãe parecia uma pessoa totalmente diferente. Muito diferente daquela pálida mulher com olhos de serpente. A mulher da foto tinha grandes olhos verdes e sorriso aberto e sem presas. Sem dúvida, Sirene não era do clã quando se casou com seu pai. Ela não havia passado pelo cruel ritual do qual todo jovem era iniciado assim que chegasse à adolescência. E de repente, uma tontura seguida de uma imensa dor de cabeça o fez derrubar a xícara e segurar a cabeça com as duas mãos. Memórias que antes considerava apenas pesadelos começaram a aflorar do fundo de sua mente, enquanto ouvia as palavras de sua irmã logo após a luta no torneio Gennin. "Apenas o siga." - Ela lhe disse, antes de sair. Sayako se referia ao seu pai que sairia naquela noite. Contudo, não se lembrava de nada naquela noite. Porque não seguira seu pai? Ou seguira e agora não se lembra... - Espere. - Sussurrou ainda com dores na cabeça. Kimura conseguia distinguir rostos conhecidos na escuridão de suas memórias, fatos que antes não estavam lá. Sentia profundamente que algo importante acontecera, mas ainda não se lembrava de tudo.

- Garoto. Você não sabe de nada. - Disse a mulher, levantando-se do colchão, com uma pesada expressão de tristeza. - Seu sangue é uma maldição. Sayako e eu éramos perdidamente apaixonadas. Só que não podíamos nos tocar sem correr riscos de me envenenar. Tentamos de tudo para conseguir atravessar este obstáculo, mas não adiantou. Estava disposta a morrer pelo seu beijo e um dia arrisquei e a beijei com todo o amor acumulado em meu coração. Quase morri. Foi então que Sayako se desesperou. Ela retornou a sua casa e encontrou esta foto entre pergaminhos antigos. - Completou.

Kimura ouvia aquilo tentando controlar sua ansiedade e tristeza. Aquela situação lembrava muito a sua com Katsume. Seu sangue era uma maldição. Por isso os membros de seu clã só podiam casar com outros membros. Mas então, como sua mãe conseguiu? Foi quando ouviu de Junchei que a foto era a chave. Sua mãe havia se transformado depois da adolescência, e que somente o patriarca da família - Segundo os pergaminhos. - poderia autorizar a utilização do hijutsu numa pessoa de fora do círculo fechado os Hebi. - Por isso seu pai matou seu avô. E por isso Sayako mataria seu pai. - Terminou Junchei. Logo, o quebra-cabeça começou a se formar. As peças que faltavam começavam a se encaixar e agora tudo parecia explicado. Sayako queria sua ajuda para eliminar seu pai. Por isso havia se aproximado dele e de sua namorada, Katsume. Por isso ela havia deixado a foto como salvaguarda do que poderia acontecer. Até que ele ouviu de Junchei que as últimas palavras de sua irmã foram que ela enviaria um bilhete para você encontrá-la fora da Vila, já que seu pai tinha olhos em todos os lugares. Novamente a cabeça do jovem doeu e ele conseguiu se lembrar da ocasião que seu pai saiu em disparada sem dizer para onde ia, no momento em que retornava das compras com sua mãe.

- E sabe por que ela queria sua ajuda? - Sussurrou a mulher, que agora tinha sua face coberta pelas sombras deixadas pela fogueira. - Você não se lembra de sua infância, não é? - Complementou, vendo a surpresa no rosto do garoto, que agora se inclinava para não deixar que suas lágrimas surgissem.


Há alguns quilômetros dali...

Sob a luz da lua avermelhada, na penumbra de uma densa floresta, duas silhuetas humanas caminhavam com dificuldade. Forçando passagem por altos arbustos donde os animais noturnos fugiam assustados. Parando em frente de uma pequena entrada de caverna, no sopé da cordilheira de montanhas, um deles se aproximou e após alguns selos com as mãos, ele tocou numa espécie de barreira translúcida que crepitou com faíscas até sumir por inteiro. - Vamos. - Sussurrou Himura ao seu lacaio. Logo os dois percorreram uma sinuosa cadeia de túneis até desembocar num grande laboratório, onde havia dois homens com pesados ponchos. Um deles olhava para uma vidraça escura, enquanto o outro sentava-se numa grande mesa.

- Seu garoto se tornou forte. Você nos deve grande agradecimento. - Dizia o estranho sentado.
- Nós o perdemos. Precisamos de sua ajuda novamente. - Retrucava Himura, jogando um gordo saco de moedas sobre a mesa.
- Sabemos disso. Sei também que as estrelas estão chegando à posição correta. Isso custará mais caro. - Disse.
- Aqui está. Sejam rápidos. Logo, o ritual poderá ser feito e gostaríamos que tudo ocorresse bem. - Pediu o Hebi, ao ver seu lacaio depositar outro saco à mesa.
- A organização está muito feliz por seu apoio, Sr. Himura. Capturaremos o menino logo. Sabemos onde ele está. - Resmungava outro, com seus olhos brilhantes.
- Ótimo. Entregue-o na ponte Hokairo. Lá estaremos prontos para o ritual. - Respondia Himura, ao virar as costas e sair.

Um pouco do mistério de seu pai e sua irmão foi finalmente revelado. Não sei se já pensava em agir assim antes, mas devo falar que ficou muito bom e que da m grande impacto na sua historia. Conseguindo aguçar bastante a curiosidade em ler os próximos fillers. O que será que espera para esse jovem garoto do clã Hebi?

Continua irmão