"Você bem que poderia trabalhar como meu amante." - Disse a feiosa com um sorriso no rosto, aproveitando-se da necessidade do jovem em pagar à primeira semana que se hospedou para terminar de curar seus ferimentos. Aquelas palavras fizeram Daisuke ter calafrios, apesar do clima tropical que o mar trazia à cidade de Utsubyo - ou Depressão - como era chamada. O local parecia ter cerca de dez mil habitantes, com suas casas feitas de alvenaria amarelada vinda do barro lamacento das minas da região e suas ruas de pedra batida. Para uma cidade "fora-do-mapa", ela parecia bem organizada, autossuficiente e um pouco deserta. A explicação disso era sua vida noturna. Restaurantes, bares, boates, cassinos e casas de baixo meretrício fervilhavam durante toda noite, deixando a cidade num torpor mundano praticamente todas as manhãs.
Segundo os poucos comerciantes que arriscavam seus negócios à pouca clientela durante a manhã, este "Buraco" foi fundado sobre um pequeno porto clandestino, constantemente visitado por piratas que saqueavam nos mares e vendiam suas posses aos contrabandistas. Estes, por sua vez, espalhavam as mercadorias por todo o continente a um preço bem acessível. Realmente uma próspera linha de produção. Daisuke estranhava porque Suna ainda não interveio nessa situação, mas de acordo com o tiozinho vendedor de churros, o lobby dos contrabandistas junto à funcionários do alto escalão do País do Vento impediam qualquer missão para este lado das praias. Esse apoio fora crucial para que a cidade crescesse de maneira tão rápida, que atraíram a atenção de vários comerciantes que não se importavam com a legalidade das mercadorias. Ouvindo isso, o loiro parou para pensar na fome que sentia, principalmente do cheiro do churros que pairava no ar enquanto o comerciante buscava conversa.
-
Você quer um churros? - Disse o tiozinho, tentando trazer o jovem de volta de seu transe voraz.
-
Estou sem dinheiro. Mas se o senhor quiser me emprestar... - Respondeu Daisuke, tentando conseguir o almoço.
-
Não vendo fiado. Lamento. - Concluiu o velho, levando o churros de volta ao carrinho.
O estômago do menino roncou mais uma vez, indicando que fazia horas que ele zanzava pela cidade à procura de um emprego. Embora se tratasse de uma cidade "aberta" a novos negociantes - como esperava - a desconfiança imperava em todos os que o loiro pedia emprego. Já tinha ido praticamente a quase todas as portas da área residencial. De estabelecimento após estabelecimento, ele tentava manter sua dignidade diante de tantos "nãos". Parecia que a sua sorte havia terminado. Dessa forma, o nukenin começou a desanimar. Preferindo se distanciar do aroma dos churros, o garoto começava a pensar carinhosamente na proposta que a mulher lhe fizera. Por mais que parecesse indecente e aterrador em ser escravo sexual, o fato de morar naquelas ruas perigosas era combustível suficiente para tentar fazer um esforço e ser o "serviçal" da moça.
-
A que ponto eu cheguei. - Suspirou, pensativo. -
Bem que eu poderia ter ido atrás daquele velho que me roubou. - Pensou alto, quase tomando a decisão. Foi quando olhou para o horizonte e viu a imensidão desértica que os separava. Um paredão imaginário se formou diante de seus olhos. Estava preso naquele buraco. Sem dinheiro e sem emprego. Sua vida ninja não começara muito bem. Então, sua única alternativa seria procurar emprego na área portuária, onde os piratas e marinheiros já começavam a limpar o convés das embarcações que partiriam à caça naquele fim de manhã. Feito de madeira bastante resistente, a área portuária avançava por cima da margem e se estendia até a profundeza suficiente para que os grandes navios pudessem ancorar em segurança. "Incrível" - Pensou assim que destampou na via principal, onde inúmeros barcos flutuavam em toda a extensão da pista de madeira.
-
Moço, preciso trabalhar. Tem vaga? - Perguntou com a voz trêmula.
-
Você gosta de trabalho pesado? - Respondeu o marinheiro, ainda de costas.
-
Claro que sim! - Falou com esperança no olhar. O homem se virou, mostrando seu corpo marcado com várias cicatrizes e um tapa-olho que cobria uma grande cicatriz que se estendia desde a testa até a mandíbula. "Nossa." - Pensou o rapaz, admirado pela rigidez do capitão. O homem parecia bruto e insensível com a palidez faminta do garoto e o olhou de cima à baixo procurando alguma desculpa para dispensá-lo. -
Fale com meu timoneiro. - Rugiu alto o bruto, apontando para um jovem magro que se esforçava em lavar o convés de uma grande náu. Ouvindo o grito do capitão, o magro o chamou com um movimento de mão e o mandou subir até lá. O estômago de Daisuke roncou novamente enquanto ele escalava até o convés através das cordas jogadas na lateral da embarcação. Assim que terminou a escalada, o magro se aproximou e o examinou da mesma forma que o capitão.
Fazendo uma careta desanimada, ele pegou um filete de carne seca da mochila que carregava e a estendeu para o rapaz. Os olhos do nukenin brilharam ao ver tamanho "banquete" que lhe havia apresentado. Pegando o filete com voracidade, em segundos ele engoliu aquilo quando o magro lhe passou um cantil com água potável. Tomando em grandes goles, Daisuke percebeu que o magro parecia se divertir com a sua agonia faminta, sorrindo com desprezo para ele. -
Vá lá ao porão e organize os barris. - Disse enquanto puxava o cantil da boca do loiro. Bastante agradecido, Daisuke desceu ao cômodo que era iluminado apenas pela fraca penumbra do dia e vislumbrou o que deveria fazer. Era uma espécie de grande dispensa, onde cerca de vinte barris estavam deitados e espalhados por todo o local. "Mãos à obra." - Pensou, sentindo-se revigorado depois da ligeira refeição, começando a levantar os barris para organizá-los.
Para dizer a verdade, ele demorou bastante para terminar aquele serviço. Laçando os barris nas tiras de couro nas laterais do grande cômodo, o loiro passava as mãos no rosto para retirar o suor que aquele ambiente fechado onde o calor o castigava. -
Teminou? - Perguntou o timoneiro com certa surpresa na voz. Respondendo afirmativamente o jovem escutou seu próximo trabalho que consistia em retirar alguns mariscos do casco do navio. Apesar de duro, o serviço seria mais refrescante, pelo menos. Foi o que pensou quando começou a descer o andaime na lateral da embarcação, onde retirou uma kunai e começou a raspar o casco com cuidado para não arranhá-lo, deixando cair os moluscos parasitas que diminuíam a velocidade de barco devido sua resistência.
-
Quando terminar, venha me ajudar a lavar o porão. - Comandou o magro, feliz por ter arrumado alguém para lhe dividir as tarefas pesadas.
CONTINUA